FÉ E CONVICÇÃO
(21/01/2002)

Alguma coisa está fora de lugar. Não é natural que tantos acontecimentos desagradáveis tenham ocorrido em tão curto espaço de tempo no início deste ano. Nem vamos detalhar porque tudo já foi apresentado exaustivamente pela mídia impressa e eletrônica. Se a morte do seqüestrador da filha de Silvio Santos é problema que envolve a segurança pública, o drama de Cássia Eller mereceria um resguardo sem tanto alarde por se tratar fundamentalmente de uma tragédia pessoal e familiar. Mas, a ocorrência de tantos eventos em tão pouco tempo, deveria chamar as atenções gerais para uma reflexão mais aprofundada sobre o que está se passando com a sociedade humana.

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Para qualquer região do mundo que olharmos, veremos tragédias, violência e conflitos. Onde está a verdadeira paz? E que dizer do estarrecedor seqüestro e assassinato do Prefeito de Santo André? De fato estamos diante de uma crise de fé e de comportamento.

A ciência, impulsionada pela busca de lucros alcançou um grande avanço na direção materialista, enquanto a fé permaneceu estagnada ao longo dos séculos. Separando-se a fé do restante das atividades humanas, parece que se tratam de dois mundos distintos, em que um nada tem a ver com o outro. Assim, tanto a fé como a ciência se distanciaram da espiritualidade. Com o avanço da moral do dinheiro, acabou a moral em todos os níveis, mas a fé no dinheiro como a motivação principal de vida, se generalizou entre os seres humanos.

Agora o sistema monetário internacional se tem mantido em permanente estado de crise pela ausência de parâmetros coerentes no valor de troca das moedas, o que se agrava com a ação dos especuladores. O ciclo das âncoras cambiais valorizadas, artifício usado para combater a inflação sem aumento da produção com ampla abertura das importações, foi tardiamente encerrado pela Argentina. Como todo artifício, os efeitos negativos logo se foram tornando visíveis de forma dramática, como o aumento da dívida e da taxa de juros, liquidação dos ativos, estagnação econômica, aumento do desemprego, desgaste social. O Brasil também esteve próximo a isso. Esperemos que a tragédia argentina inspire o novo governo neste ano de eleição, para recolocar o País na direção do real progresso.

A educação escolar tão somente não tem sido suficiente para contribuir para um comportamento humanamente responsável. As normas disciplinares e de procedimentos não têm sido suficientes para assegurar o respeito mútuo entre os seres humanos, que usam do poder da força para atingir aos seus objetivos, sem preocupações com a responsabilidade pelos seus atos.

Em todos os setores há uma certa paralisia. Parece que os agentes estão acorrentados e ninguém consegue promover uma positiva mudança de rumo. É como se não conseguíssemos atuar sobre o presente que, como conseqüência do passado, impossibilita modificações para o futuro próximo, que assim tende a piorar. Até quando prosseguiremos dessa forma? Muitos Estados estão caminhando para a desestruturação.

A fé se transformou em crença e não foi suficiente para deter a decadência. O Estado secularizado, isto é, separado da religião, não teve suficiente amplitude para manter a estabilidade econômica e social. Isso deveria dar o que pensar aos filósofos, pois estamos diante de uma situação verdadeiramente crítica, para a qual ninguém consegue oferecer razoáveis esclarecimentos, ou alternativas para contornar e sair dessa crise que invade a convivência humana, trazendo efeitos danosos e imprevisíveis para o futuro. Os “senhores dos anéis” inebriaram-se com o poder e, para mantê-lo, deixaram tudo o mais para plano secundário.

Prosseguindo por trilhas diferentes, Estados e religiões foram engendrando as teorias mais adequadas aos próprios interesses. Os fiéis passaram a se confundir ainda mais, ao invés do pão espiritual que fortalece o espírito, acabaram recebendo pedras que de nada serviam. Os fiéis deixaram que os Estados e religiões seguissem os seus caminhos, desinteressando-se de ambos, permanecendo estagnados em sua crença como religiosos não praticantes.A população cresceu ampliando-se a pobreza. As necessidades básicas vão deixando de ser atendidas. O despreparo aumenta. A televisão e a indústria do entretenimento vão baixando o nível. A criminalidade aumenta em quantidade e crueldade. O meio ambiente se deteriora.

O atentado terrorista de 11 de setembro acabou dando mais amplitude a essa idéia de caos, de que o mundo vive sem respeito à ordem e à lei, fato que se tornou mais perceptível nos países mais pobres, com crescente aumento da criminalidade. A fé não segura, o Estado secularizado não segura. O que então poderá deter essa contínua decadência?

Mas os seres humanos, com raras exceções não aprofundam mais as suas análises, permanecendo sempre na superfície das questões. A fé não segura mais porque o ensinamento religioso distanciou-se da realidade natural e espiritual da vida. O Estado secularizado não segura porque, os seres humanos, distanciados da realidade espiritual agem antinaturalmente, e embora não queiram mais reconhecer, são responsáveis pelos seus atos e terão que arcar com as conseqüências dos mesmos, boas ou más, conforme estipulado nas leis da Criação que encerram Amor e Justiça procedentes do Criador, pouco importando em que religião os seres humanos tiveram a sua formação, inclusive se não tiver sido em nenhuma, pois as leis da Criação são incontornáveis. Urge reconhecê-las e estudá-las, para que a convicção preencha o vácuo deixado pela fé, pois ao contrário da crença, a convicção exige objetividade e análises irrestritas. Os seres humanos deveriam buscar convicção, para compor um Estado voltado efetivamente para a evolução humana e a paz.