OVOS QUEBRADOS
(28/04/2007)

A adolescente voltava da quitanda onde tinha ido comprar meia dúzia de ovos para a mãe completar a refeição e fazer a marmita do filho que havia conseguido um emprego para trabalhar das 14 às 22 horas, recebendo um salário de quatrocentos reais, mas gastando mais de quatro horas no transporte de ida e volta para casa.

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Distraída, a menina deixou cair o pacote e com tristeza ela percebeu que restavam apenas dois ovos inteiros, os outros haviam sido quebrados com a queda. Olhando para o chão ela viu as gemas e as claras misturadas com os pedaços das cascas e a sujeira da rua, e pensou na sua vida cheia de dificuldades que poderia ser despedaçada como os ovos. Há alguns meses estava procurando emprego e não achava nada. Queria estudar, mas como, se precisava urgentemente de um emprego para ajudar o orçamento da casa?

Ela se lembrou de sua colega, que sem achar um trabalho decente acabou aceitando uma proposta para trabalhar como massagista num Café, desses que oferecem entretenimento sexual para os homens, ela repudiava essa idéia, e continuava buscando um emprego.

Assim, milhões de jovens no mundo se encontram desorientados, com pouca esperança no futuro, sem saber o que fazer. No Brasil a situação é ainda mais complicada após mais de duas décadas de crescimento insignificante. Não há empregos, porém a maioria dos jovens não tem suficiente preparo para desempenhar as tarefas com eficiência. Ao completar seu milésimo gol em 1969, Pelé já demonstrava que o futuro das crianças era preocupante. O índice de desenvolvimento da educação básica, apontou a crítica situação em que se encontra o Brasil, a média é 3,8, numa escala que vai até 10. Foram acumuladas muitas deficiências ao longo dos anos, sendo necessários muitos anos para recuperarmos a qualidade do ensino.

O economista Márcio Pochmann constatou que o baixo crescimento nos últimos 25 anos e a mudança da estrutura de trabalho nos centros urbanos, levaram cerca de 11,3 milhões de brasileiros, número superior à população da cidade de São Paulo, à condição de desempregados ou agregados sociais.

Em artigo publicado em 1946 no Jornal de Debates, o físico socialista Mário Shemberg escrevia que o amplo desenvolvimento da indústria levaria ao dilema da superprodução resultante do enorme crescimento das forças produtivas. O mundo ocidental conseguiu ir domando essa questão através do planejamento da produção e do loteamento do mercado através de quotas de participação. Isso não impediu que o aperfeiçoamento dos métodos de produção em série fosse paulatinamente destruindo os empregos, sem que fossem buscadas soluções apropriadas para a ocupação da mão de obra e distribuição da renda.

No Brasil foi criado o auxílio bolsa família, que deve ser aperfeiçoado para que não se torne apenas um incentivo à indolência. A “enxadinha eletrônica”, o cartão eletrônico que libera dinheiro automaticamente dos caixas dos bancos, sem a necessidade de contrapartida de algum trabalho, justamente o contrário do que queriam os nordestinos do tempo de Luiz Gonzaga, o rei do baião, que cantava em versos a tristeza do povo vitimado pela seca, de receber esmolas do governo, quando o que eles queriam era a oportunidade de trabalho.

Mas voltando à questão da superprodução, o problema foi sendo habilmente contornado, se a renda da população ia caindo, então iam surgindo produtos de menor custo para acompanhar a queda. Contudo, surge no horizonte uma nova variável: China e Índia, com seu enorme contingente de mão de obra barata e especializada estão entrando na economia pra valer afetando drasticamente o mercado de trabalho.

A luta pelos mercados vai se agravando vertiginosamente no mundo e no Brasil, onde os gastos com educação e saúde somados, mal chegam a 50 por cento do que é dispendido com juros. O futuro das novas gerações é preocupante. Algo deve ser feito para que os jovens não fiquem perambulando pelas ruas ao invés de permanecerem mais tempo nas escolas para adquirir melhor preparo para a vida. Cabe aos líderes mundiais e aos cidadãos em geral examinar a vida com toda a seriedade, estabelecendo as verdadeiras prioridades, estabelecendo novos paradigmas de produção e consumo para atenuar as sombras escuras que pairam sobre o futuro da humanidade. Os seres humanos dispõem de capacitações para encontrar soluções duradouras, sendo indispensável que desenvolvam a adequada sintonização.