DINHEIRO MORIBUNDO
(10/07/2011)

O dinheiro se tornou mundialmente dominante, mas as ameaças à paz e ao progresso estável permanecem.

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A história monetária mostra que as moedas surgem e se desenvolvem atingindo seu apogeu, para depois caminharem inevitavelmente para seu enfraquecimento e morte. Quando em 1997 Jack Weatherford, escreveu AHistória do Dinheiro, o euro ainda não era conhecido, pois passou a existir como moeda escritural a partir de 1 de Janeiro de 1999 e na forma de notas e moedas só em 1 de janeiro de 2002. Segundo o relato de Weatherford, “as moedas de várias nações mais fracas adoeceram e morreram inchadas pela inflação… O dólar, o yene, o marco e as demais moedas nacionais estariam morrendo, e o sistema monetário global infectado por um vírus mortal enfraquecedor… Apesar das intervenções, nenhum governo parece ser capaz de controlar sua própria moeda”.

E qual seria esse vírus mortal? Como manter a estabilidade das moedas? No Brasil tivemos um bom exemplo dessa doença exterminadora. Miriam Leitão descreveu a luta do Brasil para impedir o continuado desmanche da moeda brasileira que em 30 anos 1964/94, desvalorizou-se em 1 quatrilhão e 302 trilhões. Com certeza a desvalorização maior se deu nos anos 80, quando o Brasil depreciava a sua moeda para aumentar as exportações na busca de dólares para atender aos resgates da dívida externa, coisa que a Grécia, atrelada ao euro está impossibilitada de fazer. Agora, com a enxurrada de dólares, o real está acuado pela valorização. Será que o Real está realmente salvo?

Riqueza é riqueza. Dinheiro é dinheiro. A riqueza provém da utilização dos recursos oferecidos pela natureza. Logicamente eles têm um limite. O dinheiro, atualmente é feito de papel e tinta com a impressão dos números. Imprimir dinheiro e ativos financeiros não significa criar riqueza real que depende do trabalho de transformação dos recursos naturais. O dinheiro pode ser ampliado ao bel prazer dos detentores dessa possibilidade, já os efeitos escapam ao controle. As bolhas são infladas, criando sensação de riqueza, para mais tarde lançar os incautos na miséria.

Num passado não muito distante somente circulavam moedas metálicas, de ouro ou prata, as quais se mostravam insuficientes para o incremento das relações de troca. John Law (matemático escocês 1671-1729) desenvolveu a teoria de que a oferta de moeda não deve ser determinada pelas importações de ouro ou pelo saldo da balança comercial, mas de maneira endógena pelas "necessidades de troca". Sem dinheiro em circulação, a atividade econômica se restringia às necessidades de subsistência, e os reis usavam as riquezas para se guerrearem mutuamente, dando aos financistas possibilidades para ampliar seus rentáveis negócios de empréstimos.

Segundo o escritor Claude Cueni, em A Grande Jogada, o meio circulante na França foi inundado com papel-moeda emitido pela irresponsabilidade do regente, o Duque d’Orleans, que reduziu o dinheiro a pó, criando na época, uma tragédia para John Law e todo o povo francês.

O montante de dinheiro pode ser ampliado indefinidamente pelas emissões desordenadas, pela ampliação do crédito e também pelo efeito cumulativo contábil. Os juros compostos promovem um crescimento exponencial do dinheiro virtual estocado nas memórias dos computadores.

Como fugir dessa contingência? Uma forma é através do endividamento dos Estados Soberanos, que absorvem os excedentes financeiros com sua vocação para produzir déficits, com desperdícios e obras superfaturadas. Outra vem através das bolhas especulativas, que estouram de forma imprevista para a grande maioria, como a de 2008, reduzindo vultosos ativos financeiros a pó.

Sobre o destino da Grécia, Gilles Lapouge, abordando as dificuldades da zona do euro escreveu que, como sua integrante, ela está impedida de desvalorizar a moeda, que seria o recurso natural para se desafogar. O país, assim, vê-se obrigado a se livrar dos problemas com uma moeda que, segundo os institutos internacionais mais sérios (como o FMI) é 30% a 40% supervalorizada em relação à economia grega. Além disso, ele mencionou as agruras do dólar: “Não devemos jurar que a enfermidade não pode sair da Europa. Alguns pensam que mesmo os Estados Unidos estão vulneráveis. Em 12 de agosto, o teto da dívida pública autorizado pela lei, de US$ 14,3 trilhões, será atingido. Até essa data será absolutamente necessário que o Congresso vote uma nova lei para aumentar esse limite. Senão, o Tesouro americano estará tecnicamente insolvente”.

Enfim, estamos diante de um delicado estágio do sistema monetário global, agora complicado por dívidas e maciças emissões de dólares e, uma nova variável, a moeda chinesa, que acompanha as desvalorizações do dólar, fortalecendo a competitividade dos produtos feitos na China e ampliando suas reservas. Como reagirá o euro?

O dinheiro se tornou mundialmente dominante, mas as ameaças à paz e ao progresso estável permanecem. Enquanto muitos países se encontram na posição de devedores em relação desproporcional ao PIB, a China dispõe de reservas extraordinárias. Os Estados Unidos excessivamente endividados inundam os mercados financeiros. Há um descontrole nas emissões monetárias. Com o afrouxamento americano, e as limitações naturais, as commodities estão sofrendo aumento de preços. A especulação continua desenfreada com um volume de papeis financeiros, várias vezes superiores ao PIB mundial. Não é fácil regulamentar e inibir a desenfreada especulação financeira, mas sem isso novas crises poderão surgir a qualquer momento. A inflação precisa ser inibida sem causar danos às populações em condições de fragilidade. O desemprego está acima das médias normais. Os gastos públicos precisam ser orientados para o atendimento de necessidades reais, sem desperdício ou desvios.

Tudo indica que estamos adentrando em um novo período de transição. O que nos reserva o futuro da economia e do sistema monetário global?