ESTADO OU MERCADO?
(25/05/2001)

Estado ou mercado? A quem cabe cuidar dos problemas humanos?

No caso do problema da energia elétrica que não será suficiente para atender ao consumo normal, atuando como fator limitante do crescimento econômico, todos deverão participar de um rígido programa de racionamento e redução do consumo. Se todos assimilaram o problema e se dispõem a reduzir o consumo, por que então a decisão de aumentar brutalmente as tarifas?

Essa é de fato uma hábil decisão com várias implicações. Aceitemos pacificamente o fato de que o cidadão brasileiro não recebeu boa escolaridade, principalmente quanto a respeitar as normas, seja no trânsito, no trabalho, na vida particular. A indisciplina e o desejo de ser mais esperto estão sempre presentes, enquanto os que respeitam são considerados trouxas. Assim, a indisciplina será punida com o tarifaço.

Economicamente falando, o tarifaço reduzirá a renda dos consumidores que deixarão de consumir outras mercadorias. Isso se reflete na demanda, reduzindo a procura das mercadorias que a indústria forçadamente produzirá a menos pela falta de energia. Equação montada: menor demanda, diante de menor oferta, deverá manter estável o nível de preços, os quais receberão pressões caso não seja reduzido o poder aquisitivo da população.

Outra: se o clima for favorável, com chuvas abundantes repondo o nível dos reservatórios, será uma grande cartada voltar ao normal. Retirar o "bode" como manda a velha prática política de capitalizar eventos para criar imagem e cenários positivos.

Contudo, isso não deixa de ser interferência do Estado numa fase em que se propugna pela retração do Estado. Todavia, essa questão da retração do Estado merece um foco especial. O Estado sempre tende a criar uma burocracia pesadona, que rapidamente passa a definir objetivos próprios, distanciados dos objetivos de servir à população, surgindo o clientelismo e outros vícios danosos em benefício de uma minoria privilegiada às custas de toda a população. O grande drama é que ao se retrair o Estado, as populações acabam ficando mais abandonadas do que já estavam.

A interferência Estatal acabou se revelando desastrosa, principalmente porque os Estados se encheram de dívidas que oneram os cofres públicos com pesados encargos, sem que as populações recebam contrapartida pelos sacrifícios a que são submetidas nos austeros programas de contenção de gastos para a geração de superávits.

A presença de um Estado inchado se revelou nociva. Por outro lado, a globalização ainda não trouxe os prometidos frutos de paz e prosperidade, o que será muito difícil de ser alcançado enquanto persistirem as desiguais condições de salários, juros, tributárias, cambiais e ambientais. Falar em ampla abertura comercial nessas condições é entregar a guarda do galinheiro aos lobos do oportunismo.

Por exemplo, a taxa de câmbio exerce poderosa influência sobre os preços. Durante a crise da dívida o câmbio era manipulado no sentido de favorecer as exportações para gerar divisas necessárias aos resgates. Com a âncora cambial a situação foi invertida favorecendo as importações, as viagens ao exterior, promovendo um novo ciclo de endividamento. Quanto aos salários, as indústrias se transferem para regiões com mão de obra farta e barata, onde as preocupações com o meio ambiente são mínimas. Mas se estamos falando em globalização, o certo seria pensarmos que só temos este Planeta para viver, portanto as atenções deveriam estar voltadas prioritariamente para a boa qualidade de vida, e não exclusivamente para os ganhos imediatistas.

Trata-se de uma situação extremamente complexa em que os interesses maiores se voltam para os ganhos dos investidores, enquanto a miséria humana se espalha pelo Planeta. Há muito por fazer e muitos estão desocupados, sem que se consiga encontrar uma solução, pois nem o Estado nem o mercado se habilitam para interferir satisfatoriamente. Será que teremos que chegar ao limite do insustentável social-econômico e ambiental para que as atenções se voltem novamente para um comportamento humanamente aceitável?