Quando criança, às vezes era levada à missa por meus pais ou avós e ouvia frases do tipo: “Ele está no meio de nós!”; “O nosso coração está em Deus!”; dentre tantas outras que integram a liturgia católica. Com o tempo, fui crescendo e passei a ouvir outras frases, tais como: “Deus está dentro de cada um”; “Deus é uma Força Superior”; “Deus está em todos os lugares”; “Deus é uma energia”… Hoje mesmo recebi a mensagem eletrônica de um amigo, que destacava descobertas da física quântica e concluía que “Deus é puro amor, é uma energia…”, e que também somos feitos de energia, já que “somos a imagem e semelhança de Deus”.
No início, Deus era um ente abstrato, Pai de um homem que eu via pregado em uma imensa cruz no centro do altar, sem compreender como Ele poderia ter enviado seu próprio Filho àquele sacrifício horrível… Um Ser Superior que, diga-se de passagem, não se conhecia muito bem, com desígnios misteriosos, para o qual, por via das dúvidas, era melhor orar constantemente – talvez até fazer algumas promessas. O “plano básico”, tipo classe econômica, para ir para o Céu implicava comparecer todos os domingos à missa; já para conseguir um lugar na primeira classe era necessário participar de muitas novenas e atividades voluntárias na Igreja…
Mais tarde, observei como para muitas pessoas Deus não era a autoridade misteriosa da minha infância, e sim um ser diluído, quase uma substância, que se difundia como o ar, confundindo-se com outros seres. Sem inspirar medo ou culpa, consistia em uma entidade impessoal, às vezes o Bem Universal que perpassava tudo e todos, a cujo fluxo os seres humanos deveriam se ajustar para viver em paz. Tal concepção não raro caminhava para a ideia de um amor irrestrito e indolente, que permitiria e suportaria tudo, sem qualquer tipo de parâmetro ou limite.
Na infinidade de opções religiosas e filosóficas da atualidade, concepções semelhantes continuam sendo sustentadas, embora também sob títulos e cores diferentes. Sem falar nas correntes que consideram Deus como mero produto de fantasia, fruto da carência humana de buscar ordem e coerência para sua existência, que na verdade não possuiria sentido algum – além daquele criado pelos próprios homens a cada época…
Entretanto, diante da confusão que cada vez mais se dissemina na época presente, do caos e mesmo do desespero que tantos vivenciam, nos planos individual e coletivo, muitas pessoas sentem reavivar dentro de si o anseio pela Divindade… Lentamente ou então de forma abrupta, surge o grito interior por uma nova vida, mais plena de amor e sentido, de justiça e esperança. Nesse momento, o querer profundo do ser humano não é pela autoridade arbitrária para a qual rendem sacrifícios tantos fiéis, nem pela energia indefinida que se dissipa como fumaça, mas por uma imagem que não se pode definir, uma Luz que nos acolhe e encaminha para o verdadeiro Lar… Lá dentro, no fundo da alma, temos então a certeza de que há uma Realidade Maior, que nossos olhos carnais não podem ver, mas à qual gostaríamos tanto de pertencer…
Manter viva essa sabedoria, despertada do fundo de nossa alma em meio ao caos pós-moderno, é um passo decisivo para a “virada” na existência humana. Acreditar nessa certeza íntima, a despeito de tantas tribulações e argumentos que tentam nos desviar de nós mesmos no dia a dia, e buscar caminhar com o coração conectado a esse anseio – uma vontade urgente de reencontrar a estrada que conduz aos braços do Pai – impulsiona cada um a buscar um novo conceito de Deus. Um conceito que não se restrinja ao tamanho da mente humana – que parece mais limitada a cada dia, apesar da frenética escalada material – e às cansativas ponderações do raciocínio. Que possua a imensidão de um Manancial Inesgotável, onde nossas almas, há tanto sedentas, possam sorver da fonte da Verdadeira Vida…