Por muito tempo, o assunto não foi tratado com a devida seriedade no âmbito da sociedade brasileira, tornando-se alvo de deboches, reações extremadas ou constrangidas reticências. Sutilmente, porém, foi entrando nos lares com enfoque diferente, tendo como porta-vozes artistas, intelectuais e autores de filmes e telenovelas. Ao ponto de, na atualidade, ganhar expressão política de luta por direitos, voltada não apenas à legitimação social de uma opção de vida, mas à consagração de uma concepção da natureza humana e do sentido de sua existência.
O tema da diversidade sexual raramente é abordado com a necessária profundidade nas discussões contemporâneas. Alguns buscam no código genético ou no funcionamento cerebral explicações para a variabilidade de preferências afetivo-sexuais dos seres humanos, especialmente quando se trata de aparentes desvios na destinação biológica da sexualidade. Outros atribuem a fatores de ordem social, como as influências recebidas (ou não recebidas) ao longo do desenvolvimento infantil, o fato de homens e mulheres identificarem-se ou não com pessoas do mesmo sexo, passando a adotar padrões de conduta mais ou menos adequados aos estereótipos sexuais vigentes em determinada cultura. Sem falar nas reações de conotação moralista, que consideram os desviantes da sexualidade considerada normal como merecedores dos piores castigos, por seus comportamentos tidos a priori como imorais.
Atualmente, vem ganhando força uma leitura de mundo que caminha para um total relativismo na compreensão do que é o ser humano e da finalidade de sua existência. Segundo essa visão, independentemente dos fatores que levariam as pessoas a adotarem uma ou outra conduta, seja no campo sexual ou em qualquer outro, a verdadeira bandeira a ser defendida é esta: tudo vale, não há nada fixo ou pré-definido quando se trata da humanidade, os valores mudam com o tempo, não podem ser estabelecidos parâmetros universais, qualquer escolha pode ser feita e refeita sem maiores consequências, deve-se respeitar irrestritamente as diferenças, em um mundo em que o supremo valor se torna o prazer e a realização individual ilimitados.
Mas, afinal, qual é o problema dessa bandeira colorida e reluzente? Não é lícito que as pessoas persigam satisfação e felicidade? Não possui o ser humano livre-arbítrio, para decidir livremente que tipo de vida deseja para si? É preciso avançar nessa discussão.
A questão de fundo, chave para todas as respostas, é justamente esta: “o que é o ser humano?”. Tanto as concepções que atribuem a origem das condutas humanas a aspectos biológicos, quanto as que atribuem às influências sociais recebidas, ou ainda a uma conjugação de ambos os fatores, fundamentam-se em uma visão materialista do Homem. Assim, o ser humano poderia ser resumido ao seu corpo físico, que possui também um cérebro que responde aos estímulos ambientais, cuja influência iria aos poucos configurando a forma particular de ser de cada pessoa. Na vida em sociedade, cada um buscaria suprir suas necessidades e desejos, que encontrariam seu fundamento e satisfação na materialidade. A organização social seria uma estrutura arbitrária criada com esse fim principal, modificando-se basicamente de acordo com o nível de desenvolvimento (material, tecnológico, racional…) alcançado pela humanidade a cada época. Os anseios por valores e experiências transcendentes, que vez por outra atravessam os seres humanos, não passariam de fantasias produzidas por seu intelecto, ilusões criadas para preencher um vazio existencial que seria inevitável e mesmo constitutivo da espécie humana.
Pode-se constatar que essa visão do ser humano termina no deserto, no completo abandono e desolação, na matéria fria e inerte. Não é de se admirar que muitos dos adeptos dessa forma de pensamento procurem euforia e entorpecimento em experiências materiais de várias modalidades, visando aplacar o vazio existencial que eles próprios escolheram.
Muitas pessoas mergulharam tão fundo nessa espécie de limitação, que perderam a capacidade de reconhecer sua verdadeira essência. E com isso perderam o encanto e a alegria de viver, a esperança em dias melhores, o desejo de atuar construtivamente em seu ambiente. Chegamos ao tempo em que o que importa é o “eu”, em detrimento do “nós”. E esse “eu” tornou-se um mero joguete da mídia e da manipulação social, sem coragem para expressar e assumir o autêntico ponto de vista que reside em seu íntimo. O problema da bandeira relativista é que ela oculta, sob um falso discurso libertário, a total aniquilação de valores propriamente humanos e o explícito descompromisso com a coletividade. Pois, em um mundo em que “tudo vale”, nada tem efetivo valor, e a afronta a valores fundamentais acaba sendo imposta à sociedade, atônita e silenciosa, sob a máscara da “tolerância” sem limites, corroendo a visão de mundo e a perspectiva de futuro coletivas.
A solução para os inúmeros conflitos da sociedade contemporânea, incluindo o enigma das diversas configurações sexuais – que hoje parecem vir à luz do dia com toda a energia –, somente pode ser encontrada no conhecimento profundo da natureza humana. Em última análise, tal conhecimento implica considerar que o ser humano possui, sim, dimensões biológicas e sociais, mas que a própria configuração dessas dimensões engendra-se também pela atuação de outros elementos, de ordem imaterial. Em outras palavras, o sentido profundo da existência humana transcende os aspectos meramente materiais, abrangendo uma dimensão espiritual.
Ao reconhecer sua essência espiritual, sede do verdadeiro eu, o ser humano poderá buscar novas compreensões acerca de si mesmo e das inúmeras questões que perpassam a existência humana, incluindo o papel da feminilidade e da masculinidade no Universo. Ao se aprofundar nesse novo conhecimento, adquirirá clareza a respeito do significado profundo de ser homem ou mulher, assim como das causas dos sofrimentos e confusões tão comuns em nossos dias, ultrapassando visões estritamente materialistas. E vislumbrará, finalmente, que a autêntica liberdade só poderá ser alcançada pela sábia integração às Leis Universais, que regem a Criação através de todos os tempos.
Nessa época de acentuadas convulsões sociais, cada pessoa que se preza sua vida interior, sua integridade e seu futuro, deve estar atenta às bandeiras desfraldadas com veemência, sob altissonantes palavras de ordem. Mais do que as palavras, deve observar as atitudes de seus emissores, suas expressões não verbais, percebendo as reações que tais elementos despertam em seu íntimo. Então, mesmo que não consiga explicar racionalmente, mesmo que sua percepção seja considerada como “politicamente incorreta”, terá vislumbrado as reais intenções por trás de determinada bandeira, reconhecendo se ela de fato sinaliza o caminho que conduzirá a humanidade à tão almejada felicidade.