Jesus realizou muitos atos milagrosos enquanto ministrava seus ensinamentos. Isso tinha um propósito bem delineado, como tudo o mais que ele fazia. Os assim chamados milagres eram fenômenos que escapavam à compreensão das pessoas, o que naturalmente suscitava um interesse imediato por parte delas. Ao procurarem saber mais sobre esses acontecimentos elas acabavam então encontrando Jesus, ou seja, encontravam a Palavra, o caminho luminoso para sua salvação, que atuava como uma coluna de Luz em meio às trevas de uma terra sombria: “O povo que andava nas trevas viu uma grande Luz, uma Luz raiou para os que habitavam uma terra sombria como a da morte” (Is9:1). Enquanto Jesus esteve na Terra houve uma íntima ligação entre a divindade e a humanidade, a ponto de Paulo denominá-lo de “mediador único entre Deus e os homens” (1Tm2:5). Durante o anos terrenos de Jesus isso de fato foi assim; o mediador procurou nesse período transmitir aos homens a Vontade de seu Pai, numa linguagem a eles compreensível.
A transmissão da Palavra era o objetivo último da obra da Luz, porque somente por meio dela os seres humanos poderiam promover conscientemente as modificações necessárias em suas almas. Somente por meio dela os homens poderiam ser salvos. As sentenças de Jesus, o Portador da Palavra da Vida, entravam nos ouvintes como gotas de água límpida em solo ressequido. Era por eles absorvida e assimilada no íntimo, a tal ponto que ficava gravada para sempre em suas almas. Os milagres funcionavam como atalhos, trilhas secundárias que conduziam para essa finalidade principal de recebimento e acolhimento da Palavra Sagrada.
Os milagres que Jesus praticava são considerados ainda hoje como acontecimentos realizados fora das leis da natureza, procurando-se ver nisso justamente a prova do poder divino do Filho de Deus. Contudo, Jesus jamais faria qualquer coisa que não estivesse incondicionalmente submetida às leis naturais. Nem lhe seria possível uma tal arbitrariedade, visto que essas leis trazem em si a perfeição da Vontade de seu Pai, não admitindo o mínimo desvio no seu cumprimento. O fato de os milagres do Mestre parecerem incompreensíveis, apenas demonstra a distância que separa a atuação humana da divina. Poderíamos traçar um paralelo, ainda que rudimentar, em relação a povos subdesenvolvidos. Os nativos de Papua e Nova Guiné, por exemplo, acreditam que a milagrosa tecnologia ocidental provém do “mundo dos espíritos”. Eles não têm possibilidades de enxergar além dessa suposição. O mesmo se dá conosco em relação aos atos milagrosos de Jesus.
Os milagres eram testemunhos de que Jesus fora enviado ao mundo em missão pelo próprio Deus-Pai:
“Jesus de Nazaré foi um homem credenciado por Deus junto de vós, pelos milagres, prodígios e sinais que Deus realizou entre vós por meio dele, como bem o sabeis.”
(At2:22)
“Eu possuo um testemunho que é maior que o de João: são as obras que meu Pai me deu para fazer; eu as faço e são elas que prestam testemunho a meu respeito de que o Pai me enviou.”
(Jo5:36)
Nicodemos, interlocutor de Jesus, reconheceu isso claramente: “Rabi, sabemos que vieste como Mestre da parte de Deus, pois ninguém é capaz de fazer os sinais que tu fazes se Deus não está com ele” (Jo3:2).
Os milagres de Jesus não constituíam nenhuma exceção na atuação das leis da natureza. Nem poderia ser diferente. Se fosse possível a mínima exceção na efetivação das leis da Criação, então elas não poderiam ser consideradas perfeitas, e por conseguinte o próprio Criador também não o seria. No entanto, sabemos que tudo o que “descende do Pai das Luzes é dom perfeito, em Quem não pode existir variação ou sombra de mudança” (Tg1:17).
Assim, uma exceção qualquer fica totalmente descartada. Tampouco serve de argumento a alegação de que para Deus nada é impossível, pois bastaria dizer que “é impossível que Deus minta” (Hb6:18), para refutar essa idéia ingênua. Quando se diz que “para Deus não haverá impossíveis em todas as suas promessas” (Lc1:37), então fica estabelecido que a Luz sempre cumpre suas promessas, as quais se pautam incondicionalmente pelas leis da Criação, efetivando-se correspondentemente. Se realmente nada fosse impossível para Deus, no sentido restrito em que se imagina isso, então Ele também poderia criar um Ser mais perfeito do que Ele próprio, ou ainda agir com imperfeição, com injustiça, em suma, atuar de modo contrário às Suas próprias leis. Coisas totalmente impossíveis, pois Ele “não pode negar-se a Si mesmo” (2Tm2:13), assim como também “não pode perverter o direito e a plena Justiça” (Jó37:23). É um argumento pueril esse, totalmente contraditório e fruto da preguiça de pensar.
A preguiça inventa dificuldades onde não existe. Alguém já disse que 1% das pessoas pensam, 4% pensam que pensam, e 95% prefeririam morrer a ter de pensar… Se há uma coisa que não pode ser negada por qualquer pesquisador sincero, é que nos trechos não adulterados da Bíblia a preguiça é condenada com muita severidade. Vemos lá que “o preguiçoso se mostra almejante, mas a sua alma não tem nada” (Pv13:4), pois ele é como “vinagre para os dentes e fumaça para os olhos” (Pv10:26). Há mais dezessete provérbios condenando a preguiça. Nesse aspecto a Bíblia, se não é inspirada, é seguramente muito inspiradora.
Jesus atuava, sim, mediante força divina, o que lhe permitia acelerar os efeitos terrenalmente visíveis das leis universais. É nesse contexto que se insere também sua declaração de que “o impossível aos homens é possível a Deus” (Lc18:27).
Ele podia, pois, acelerar a atuação das leis da Criação, emanadas da Vontade de seu Pai. Quando, por exemplo, tocou a mão de um leproso, este “imediatamente ficou limpo da sua lepra” (Mt8:3). O mesmo se deu na cura da mulher encurvada: “Ele impôs as mãos sobre ela, que imediatamente se endireitou e começou a louvar a Deus” (Lc13:13). Também quando ordenou a um paralítico que se levantasse, este “no mesmo instante, tomando o leito, retirou-se à vista de todos” (Mc2:12). Do mesmo modo, ao tocar os olhos dos dois cegos que imploravam compaixão, eles “imediatamente recuperaram a vista” (Mt20:34), e quando determinou que o servo paralisado do centurião fosse curado, “naquela mesma hora o criado ficou curado” (Mt8:13).
A força divina de Jesus era capaz de curar com rapidez cegos, leprosos e paralíticos, porque forçava a movimentação dos órgãos e membros inativados pela doença. Mas Jesus nunca fez, por exemplo, uma pessoa sem olhos enxergar, ou uma sem pernas andar, porque tais coisas são impossíveis segundo as leis naturais. Os membros ou órgãos defeituosos tinham que estar lá para que Jesus pudesse curá-los, o que se dava com extrema rapidez. Marcos conta que quando Jesus curou um surdo-mudo, “imediatamente abriram-se-lhe os ouvidos, e a língua se desprendeu e falava corretamente” (Mc7:35). Os ouvidos e a língua, órgãos já existentes no surdo-mudo, foram rapidamente curados pela intervenção de Jesus.
Jesus, a “Palavra que se fez carne e veio morar entre nós” (Jo1:14), jamais poderia agir de modo contrário às leis perfeitas engastadas na Criação por seu Pai. Quem via Jesus, a Palavra de Deus que peregrinou pela Terra, via nele o Pai: “Quem me vê, vê o Pai” (Jo14:9). Tudo quanto essas leis vedam, era-lhe inteiramente impossível fazer. Desse modo, também não poderia descer simplesmente da cruz quando foi nela pregado, sob as vociferações: Desce da cruz! (cf. Mt27:40) (1). As leis férreas da Criação vigentes na matéria não permitem uma tal arbitrariedade. Quem pensa de modo diferente apenas mostra total desconhecimento da inflexibilidade absoluta dessas leis. Pior: duvida intimamente da perfeição delas, achando que em casos especiais elas podem ser contornadas ou melhoradas, e por conseguinte duvida também da perfeição do próprio Criador. Paulo diz muito acertadamente que “Deus enviou Seu Filho, nascido de mulher e sujeito à Lei” (Gl4:4). Quem ingressa na Criação fica inexoravelmente sujeito à Lei da Vontade divina, que jamais se altera. Jesus tinha um corpo terreno normal, com todas as limitações inerentes a isso; ele também sentia fome, sede, cansaço e sono como qualquer pessoa (cf. Mt21:18; Jo4:7,6; Lc8:23).
Por outro lado, o conhecimento de sua atuação, e o saber de que essas leis jamais admitem exceções, constituem um farol seguro para se separar a realidade da fantasia, a verdade da mentira, nos episódios relacionados aos milagres praticados pelo Mestre.
A ressurreição de Lázaro (cf. Jo11:1-44) e do filho da viúva da cidade de Naim, ao sul da Galiléia (cf. Lc7:11-15), também não foram, conforme se imagina, fenômenos ocorridos fora dessas leis da Criação. Jesus pôde trazer essas almas de volta aos respectivos corpos porque ainda estavam ligadas a estes por um fio ou cordão, conforme acontece durante algum tempo com todos os desenlaces terrenos. Ele as chamou durante esse período de ligação, portanto “antes que se rompesse o cordão de prata” (Ecl12:6). Depois que ocorre o rompimento desse cordão não é mais possível um ressuscitar: “o pó [corpo] retorna à terra, de onde era, e o espírito volta para Deus, que o deu” (Ecl12:7,8). Após concluído um ciclo de encarnações o espírito volta para o “reino de Deus”, de onde partira outrora como semente espiritual.
Durante o período de ligação desse cordão, que varia de pessoa para pessoa, a alma permanece conectada ao corpo terreno após a morte. Depois que essa ligação se rompe é impossível, portanto, um retorno à vida terrena naquele mesmo corpo. Nos dois casos mencionados essa ligação ainda subsistia, e Jesus, fazendo uso da força divina que estava nele, chamou de volta aquelas almas para seus corpos terrenos. Essa mesma força permitiu a reativação dos órgãos até então paralisados, levando-os a um perfeito funcionamento. O mesmo aconteceu na ressurreição da filha de Jairo, o chefe da sinagoga. Ao chamado do Mestre, a alma da menina voltou ao corpo e ela continuou a viver: “Ele, porém, tomando-lhe a mão, chamou-a dizendo: criança, levanta-te! O espírito dela voltou e, no mesmo instante, ela ficou de pé” (Lc8:55). O espírito pôde voltar porque ainda estava ligado ao corpo, através do cordão que o une à alma. Foi o que aconteceu também com o filho daquela viúva que hospedou Elias, que morreu logo depois de grave doença, e a quem o profeta teria conseguido fazer voltar à vida depois de uma súplica ao Senhor: ‘O Senhor ouviu a voz de Elias: a alma do menino lhe voltou e ele recuperou a vida” (1Rs17:22). Os antigos judeus sabiam que a alma do falecido permanecia algum tempo ao lado do corpo, mas achavam que isso seguia um padrão fixo de três dias para todo mundo, de modo que no quarto dia não poderia haver mais nenhuma esperança de um falecido retornar à vida. Por isso, a ressurreição de Lázaro causou assombro tanto maior, visto que estava sepultado já há quatro dias (cf. Jo11:17) quando Jesus o chamou de volta à vida.
O episódio em que Jesus acalma a tempestade (cf. Mt8:23-27; Mc4:37-41; Lc8:22-25) também é verossímil, porque todos os fenômenos climáticos são desencadeados por seres incumbidos disso, os enteais ou seres da natureza, que tal como os seres humanos são também criaturas criadas pelo mesmo Deus, e portanto sujeitas à Sua Vontade. Proveniente do divino-inenteal, Jesus tinha, naturalmente, autoridade sobre eles. São esses seres que, cumprindo as ordens primordiais do Senhor, provocam continuamente as alterações climáticas: “[Ele] manda à Terra Sua mensagem, Sua Palavra corre veloz. Faz cair neve como lã, espalha a geada como cinza. Lança como migalhas o granizo (…). Envia uma ordem e se derretem, sopra o vento e correm as águas. (…) Louvai o Senhor na Terra, cetáceos e todos os abismos, raio e granizo, neve e neblina, vento tempestuoso que cumpre suas ordens” (Sl147:15-18;148:7,8).
Quando o raciocínio ainda não havia estabelecido seu reinado tirânico sobre a Terra, os seres humanos podiam ver esses prestimosos entes e se comunicar com eles, os quais muito colaboraram nos períodos iniciais do desenvolvimento humano. Mas depois que a sua vontade se voltou exclusivamente para a matéria grosseira, surgiu um abismo entre essas duas espécies da Criação, como decorrência natural da lei da adaptação, e a interação com os enteais se extinguiu. Os seres humanos ficaram então totalmente adaptados a matéria grosseira, nada mais podendo perceber da matéria mediana e da fina.
Sobre essa atuação dos enteais associada aos elementos da natureza, diz Davi nos salmos: “Fazes a teus anjos ventos, e a teus ministros labaredas de fogo” (Sl104:4). No livro apócrifo de Jubileus, que é quase uma cópia do Gênesis, está dito que no primeiro dia da Criação o Senhor criou anjos do espírito do fogo, dos ventos, das nuvens, da neve, das vozes do trovão e do relâmpago, do frio e do calor. São os enteais que provocam efeitos meteorológicos segundo as leis estabelecidas pelo Criador para a matéria grosseira, portanto em conformidade com Suas ordens: “Ele ordenou às nuvens do céu e abriu as portas do céu; (…) fez soprar no céu o vento leste e com seu poder trouxe o vento sul” (Sl78:23,26).
A Bíblia também diz no Gênesis que “naquele tempo havia gigantes na Terra” (Gn6:4), indicando assim que uma classe especial de enteais, os gigantes, eram normalmente visíveis e reconhecíveis pelos seres humanos naquelas eras longínquas. Sobre o tamanho desses gigantes, em comparação com os seres humanos, é digno de nota o relato dos homens enviados por Moisés a espiar a terra de Canaã: “Lá vimos até gigantes, os descendentes de Enac, da raça dos gigantes. Comparados com eles parecíamos gafanhotos, e era assim que eles nos viam” (Nm13:33) (2). Fílon de Alexandria, filósofo do século I da nossa era, afirmava que esses gigantes não eram nenhum mito. A comprovação estritamente bíblica de que esses gigantes não eram seres humanos é dada por esses próprios textos citados, pois o dilúvio universal que tudo submergiu e toda vida extinguiu ocorreu entre essas duas citações, e não há registro de nenhuma estadia dos gigantes na arca de Noé. Pela cronologia bíblica, os animais da arca, a família de Noé e os citados gigantes sobreviveram ao dilúvio. Como os gigantes são mencionados antes e depois do dilúvio e não estavam na arca, então não eram animais nem seres humanos.
O livro deuterocanônico de Judite fala igualmente de “gigantes enormes” e “filhos de Titãs” (cf. Jt16:6). Esses Titãs são os que a Bíblia chama de “heróis renomados dos tempos antigos” (Gn6:4), contudo nunca se uniram a mulheres terrenas e nem tiveram filhos com elas, como a Bíblia afirma nesse mesmo versículo. Essas estórias fantásticas de deuses se amancebando com mulheres humanas são meras deturpações, como é a lenda de que Hércules seria filho de Zeus com uma mulher terrena, Alcmena.
Ainda no Gênesis, vemos que o Criador colocou querubins brandindo uma espada de fogo, como guardiões da árvore da vida (cf. Gn3:24). Esses querubins foram criados antes dos seres humanos, estando submetidos incondicionalmente à Vontade do Onipotente. Essa imagem representa os enteais primordialmente criados, “sobre os quais o Senhor está sentado” (cf. Sl99:1). Foi a eles também que a serpente se referiu em sua conversa com Adão e Eva, quando quis seduzi-los com a promessa de que se comessem do fruto proibido “se tornariam como deuses” (cf. Gn3:5). Deuses que já existiam antes do surgimento do casal humano.
Antigos relatos egípcios sobre a origem do mundo apresentam vários paralelos com a história da Criação descrita no Gênesis, invariavelmente fazendo referência à existência dos enteais. Essas narrativas descrevem não apenas a criação do mundo, mas também de numerosos deuses que personificam a natureza. Narra-se aí, por exemplo, que os deuses certa vez purificaram a Terra por meio de um grande dilúvio, depois que o homem pecara pelo seu livre-arbítrio… O Épico de Atrakhasis diz que em certa época a humanidade começou a fazer tanto barulho, que os deuses enviaram um dilúvio para silenciar de vez os perturbadores seres humanos... O mais conhecido relato extrabíblico do dilúvio, o Épico de Gilgamesh, no qual o relato do Gênesis se baseou, também fala que isso aconteceu pela atuação dos deuses. Lemos ali que “o deus do mundo subterrâneo rompe os esteios da barragem e o deus guerreiro lidera a enchente das águas.”
Um épico mesopotâmico chamado Enuma Elish, gravado em tábuas datadas de 2500 a.C., o qual traz muitas semelhanças com o registro bíblico da Criação, acrescenta o relato de um conflito cósmico ocorrido entre as divindades celestes. A Bíblia também alude à ocorrência de uma “batalha no céu”, em que o “dragão lutou com seus anjos” (cf. Ap12:7), os quais “foram presos em cadeias eternas, debaixo das trevas” (cf. Jd6). O dragão com seu anjos representam Lúcifer e seus servos, que realmente lutaram com os enteais há muito tempo, numa região de transição entre a matéria fina e os mundos dos círculos dos enteais. A escritora Roselis von Sass dá detalhes dessa luta titânica em sua obra O Livro do Juízo Final, nos tópicos “A luta contra os invasores” e “Os campos phlegraicos”.
Os enteais constituem os conhecidos “exércitos celestes” do Senhor, desde o início dos tempos. Quando a Criação foi concluída, o Gênesis diz que “o céu, a Terra e todos os seus elementos foram terminados” (Gn2:1). No original hebraico, a palavra “elementos” é literalmente exércitos, indicando as legiões de seres da entealidade que povoam a imensa obra da Criação. O Filho do Homem, a Vontade de Deus, é comumente designado nos livros bíblicos de Senhor dos Exércitos. No Apocalipse está dito que “os exércitos do céu o seguiam [o Filho do Homem] em cavalos brancos” (Ap19:14).
No Saltério, esses enteais são igualmente chamados de exército dos céus, os quais também foram criados pelo sopro da boca do Senhor: “Pela Sua Palavra, o Senhor fez os céus, e todo o exército deles, com o sopro de Sua boca” (Sl33:6). Os enteais são criaturas tal como os seres humanos, seres originados da mesma Palavra criadora de Deus, porém são de uma espécie diferente. De qualquer forma, já fora estabelecido que toda a Criação deveria servir unicamente ao seu Criador: “Sirva a Ti toda a Criação, porque disseste e os seres existiram” (Jt16:14). Os povos enteais sempre cumpriram essa determinação, mas os povos humanos não.
O rei Davi, que chamava os enteais de “ministros do Senhor”, afirmava que todos eles cumpriam a Vontade de Deus: “Bendizei o Senhor, vós todos os seus exércitos, vós, Seus ministros, que cumpris Sua Vontade” (Sl103:21). Por sua vez, o rei Salomão assegura que, tal como seu pai Davi, o Senhor também lhe havia dado o conhecimento a respeito dos seres da natureza: “Ele me deu um conhecimento infalível dos seres para entender a estrutura do mundo, a atividade dos elementos” (Sb7:17).
Sobre Salomão, o Corão, livro sagrado dos mulçumanos, diz na 34ª surata – Sabá: “E djins trabalhavam para ele com a permissão de seu Senhor.” A 72ª surata do Corão tem o título de “Os djins” e fala justamente desses seres. Em épocas remotas, os enteais eram conhecidos pelo nome de “dschins” ou “dschedjins”. Roselis von Sass narra vários episódios envolvendo dschedjins em seu instigante livro A Grande Pirâmide Revela Seu Segredo.
Um outro tipo de enteais, também muito conhecido na Antiguidade, são os que cuidam das crianças boas até o despertar do espírito. Reminiscências desse saber perdido sobrevivem nos quadros e temas que mostram anjos da guarda junto ao berço dos bebês (muito comuns no século XVII), assim como também neste salmo: “Ele ordenou aos seus anjos que te guardem em teus caminhos todos. Eles te levarão em suas mãos, para que teus pés não tropecem numa pedra” (Sl91:11,12). No século V a.C., Platão já falava da existência desses anjos da guarda, e muito tempo depois, no século IV d.C., o famoso São Jerônimo afirmava que esses anjos eram dados aos seres humanos quando de seu nascimento. Esses enteais não são anjos, mas sim guardiões das crianças boas durante alguns anos. Para cada faixa de idade há um enteal específico, tanto para meninas como para meninos. (3)
Nos antigos escritos apocalípticos judaicos, observa-se que cada nação tinha uma espécie de patrono angélico, que vigiava sobre ela e a representava. Isso também é reminiscência de um saber perdido sobre os enteais, pois cada país tinha, de fato, um regente enteálico responsável por sua proteção. O regente protetor do Brasil chamava-se Tupan-an, e os habitantes de nossa terra naquelas eras longínquas chamavam-na de “o país de Tupan-an”. (4)
Que os judeus tinham exato conhecimento sobre os enteais, testemunha um ramo que se apóia num livro hebraico chamado Zohar (Livro do Esplendor), do século XIII. Assevera esse grupo que os elementos fogo, ar, terra e água são habitados por seres especialmente incumbidos disso, denominados “elementais” segundo eles, assim designados: os que habitam o fogo se chamam salamandras; os que habitam o ar são os silfos; os que habitam a água são ditos ninfas ou ondinas; os que habitam a terra se chamam gnomos ou pigmeus. É realmente uma alegria inesperada constatar que o conhecimento a respeito dos enteais, ainda que precário, conseguiu sobreviver aqui e ali até os dias de hoje.
O também hebreu Livro de Enoch, que se acredita ter sido escrito no século II a.C. e que chegou a fazer parte do cânon bíblico, traz um trecho referente aos enteais (igualmente chamados ali de anjos) na parte denominada Visão de Enoch: “Então vi sete coros de anjos luminosos e magníficos, com rostos resplandecentes como o Sol. Eles não se distinguem nem pela face, nem pela grandeza, nem pelo modo de se vestir. Cuidam da ordem do mundo e do curso das estrelas, do Sol e da Lua. Os anjos, esses magníficos anjos, harmonizam toda a vida celeste; cuidam dos mandamentos, das doutrinas, da harmonia, do canto e de todos os louvores. Alguns desses anjos têm poder sobre o tempo e sobre os anos, outros sobre os rios e sobre os mares, outros sobre os frutos… outros, enfim, cuidam da vida de todos os homens, e a descrevem diante da face do Senhor.”
A atuação dos enteais é de fato muito ampla, literalmente essencial para a vida humana. Vivemos no mundo deles. Sem a sua atuação não existiriam alimentos, água e nem ar. Não existiria nem mesmo o nosso planeta. Tudo quanto nos é visível e palpável aqui na Terra já foi moldado por eles antes na matéria mais fina. Assim, tudo o que vemos provém realmente de modelos que não podemos ver: “Sabemos que o mundo foi organizado pela Palavra de Deus, de modo que o que se vê provém de coisas não visíveis” (Hb11:3). Em sua obra Timeu, Platão diz que cada uma das criações cósmicas do Artesão é uma cópia de um modelo perfeito previamente existente no mundo espiritual. O que acontece aí é que os enteais, servos leais do Onipotente, moldam primeiramente no mundo não visível mais próximo de nós (matéria grosseira mediana e não mundo espiritual) tudo aquilo que depois se tornará reconhecível aos seres humanos na Terra de matéria grosseira. O autor de Eclesiástico já dizia que “só vemos um pequeno número de Suas obras” (Eclo43:36). E desse tipo de entes há um tal número que nem se pode imaginar: “Suas legiões, alguém pode contá-las? Eles fazem parte do exército do céu que não pode ser enumerado” (Jr33:22). Parte desse exército inumerável também se encontra a serviço do Filho do Homem, conforme descreve Daniel: “Mil milhares o serviam; dez mil miríades estavam diante dele” (Dn7:10).
Os povos antigos, particularmente os romanos, germanos e gregos tinham exato conhecimento dos seres da natureza e de sua atuação. Sobre isso, é bastante revelador esse trecho da obra Memoráveis, do filósofo grego Xenofonte (430? – 355 a.C.), exaltando a providência e benevolência dos deuses, como os gregos denominavam os grandes enteais: “Sendo nós necessitados de alimento e devendo produzi-lo da terra, eles [os deuses] nos dão para isso as estações convenientes, que nos fornecem muitas coisas que servem às nossas necessidades, mas também daquelas que servem à nossa alegria.”
Os gregos sabiam até da existência dos enteais de dupla forma. Ainda hoje se fala que nas planícies gregas da Tessália viviam centauros, seres metade homem e metade cavalo… As mais antigas representações de centauros foram encontradas não muito longe dessa região, em escavações na cidade cipriota de Fumagusta. Um resquício bíblico muito tênue e deturpado desse gênero de enteal aparece no Livro de Isaías, com a menção aos sátiros (cf. Is13:21; 34:12,14), tidos hoje como seres mitológicos pagãos, habitantes das floretas, com chifres e pernas de bode. O termo hebraico original é sa’ir, que significa literalmente “peludos” ou “hirsutos”. Na Septuaginta grega a palavra foi traduzida como “coisas sem sentido”, e na Vulgata latina como “demônios”... Em algumas Bíblias atuais esses seres são designados de “cabritos selvagens”, “demônios caprinos” e “ono-centauros”.
Os povos mais antigos tinham um conhecimento muito preciso dos enteais e de seus grandes regentes. Sabiam que estes últimos habitavam um mundo superior, uma espécie de castelo com as dimensões de nosso planeta, conhecido pelos gregos como Olimpo e pelos germanos como Asgard ou Valhala. Esses regentes, portanto, realmente não tinham morada entre os homens, conforme os caldeus informaram com acerto o rei Nabucodonosor, que os havia intimado a interpretar um sonho que tivera: “A questão posta pelo rei é difícil, e ninguém poderá dar ao rei a solução, exceto os deuses, que não têm morada entre os mortais” (Dn2:11). (5)
Os chamados deuses sempre foram fonte de admiração para os seres humanos, desde o princípio. Era na presença dos admirados deuses que o sábio rei Davi queria louvar o Senhor: “Eu te louvarei, Senhor, de todo o meu coração; na presença dos deuses a ti cantarei louvores” (Sl138:1); e ainda os exortou a honrar o mesmo Senhor: “Dai ao Senhor, vós deuses, dai ao Senhor glória e força” (Sl29:1). Os outros salmistas também sabiam que nenhum dos deuses se Lhe podiam comparar: “Ninguém é como Tu entre os deuses, Senhor!” (Sl86:8); “Quem, nos céus, poderá comparar-se ao Senhor? Quem, entre os deuses, se Lhe poderá igualar?” (Sl89:9); “Sim, eu o sei: o Senhor é grande; nosso Senhor ultrapassa todos os deuses” (Sl135:5); “Louvai o Deus dos deuses” (Sl136:2). Moisés e os antigos hebreus também sabiam que nenhum desses deuses poderiam comparar-se ao Senhor do Universo: “Quem entre os deuses é como Tu, Senhor?” (Ex15:11). Até o cruel rei Nabucodonosor sabia que o Criador era o Deus dos deuses: “Vosso Deus é o Deus dos deuses, e o Senhor dos reis” (Dn2:47). Quanto a isso, o rei estava mesmo certo, pois de fato “o Senhor é maior que todos os deuses” (Ex18:11); o Todo-Poderoso Criador será sempre “Deus dos deuses e Senhor dos senhores” (Dt10:17).
O apóstolo Paulo também não desconhecia a existência dos enteais, pois na sua descrição aos Colossences sobre a criação de todas as coisas, afirma que foram criados “no céu e na Terra seres visíveis e invisíveis” (cf. Cl1:16). Sabemos que Paulo não apenas escreveu cartas aos Coríntios gregos, mas que esteve pessoalmente na cidade portuária deles, Corinto, capital da província romana de Acaia, onde fundou uma colônia cristã por ocasião de uma de suas viagens missionárias (cf. At18). Durante sua estada ali o apóstolo deve ter se inteirado da profunda devoção dos gregos aos grandes enteais, pois na entrada principal da cidade havia um templo de Apolo, cujas ruínas ainda subsistem, e ao lado da muralha exista um templo de Asklepios, o deus da cura. Na cidade de Pérgamo, antiga capital de um Estado helênico, também existia um templo em honra a Asklepios. Outra prova de que Paulo sabia muito bem da existência dos enteais foi a sua citação, diante dos gregos no Areópago, de uma frase do grandioso hino a Zeus do poeta estóico Aratus de Soli, do século III a.C.: “Também nós somos a sua linhagem” (At17:28).
A devoção dos gregos e outros povos antigos aos enteais era legítima, porque viva. Eles ainda podiam ver os enteais e por isso sabiam da existência deles. No primeiro volume deste livro vimos que havia uma antiga tradição grega segundo a qual “as primeiras pessoas, na idade áurea, viviam livres do mal e das aflições, desfrutando a comunhão com os deuses.” O poeta épico grego Homero assim se referiu à grande enteal feminina Gäa (Gaia), responsável pelo planeta Terra:
“É a terra que cantarei, Mãe Universal de sólido pisar, antepassada venerável que alimenta em seu solo tudo que existe... É a ti que corresponde dar vida aos mortais, assim como tirá-la... Ditoso é aquele a quem honras com tua benevolência! Para ele, os campos da vida estão carregados de colheitas; nos campos, seus rebanhos prosperam e sua casa se enche de riquezas.”
Sabendo desse amor dos gregos pelos enteais, Paulo apenas cuidou de evidenciar a diferença entre os deuses por eles amados e o Deus único: “Se bem que existam aqueles que são chamados deuses, quer no céu, quer na Terra – e há, de fato, muitos deuses e muitos senhores – para nós, contudo, existe um só Deus, o Pai, de Quem tudo procede” (1Co8:5,6). Em sua carta aos Gálatas, Paulo explica acertadamente que os seres da natureza não são propriamente deuses, conforme se imaginava: “Outrora, quando não conhecíeis a Deus, servistes a seres que na realidade não são deuses” (Gl4:8).
Durante muito tempo, no antigo Israel, acreditou-se na existência e no poder dos deuses estrangeiros. Por isso, muitas outras passagens bíblicas poderiam trazer informações reveladoras sobre os enteais, se não tivessem sido submetidas a intensa censura. Conforme esclarece Roselis von Sass em O Livro do Juízo Final, “os perscrutadores da religião cristã, ao comporem os textos da Bíblia, excluíram todas as indicações referentes aos conscientes entes da natureza… ‘pois somente os pagãos acreditariam nessas coisas’…”. Podemos ter uma vaga idéia do que perdemos ao contemplarmos esse trecho extraordinário de um diálogo entre dois amigos, registrado num documento dos tempos bíblicos conhecido hoje como Teodicidade Babilônica:
“A menos que você busque a Vontade de Deus, que esperança você pode ter? Quem serve a Deus com fidelidade nunca tem falta de comida, mesmo quando é difícil consegui-la. Portanto, busque o respirar calmante dos deuses e as perdas desse ano logo serão restauradas. (…) A mente dos deuses é como o centro dos céus, muito afastado de nós. É difícil obter seu conhecimento, vai além da compreensão humana.”
Durante o longo tempo de sedimentação do cânon bíblico, algumas poucas, pouquíssimas pessoas mais esclarecidas, ainda procuraram manter aceso o saber sobre os enteais entre os seres humanos, como por exemplo o médico, filósofo, naturalista, profeta e pregador bíblico Paracelso (1493 – 1541). Paracelso, um suíço que quando jovem estudou numa escola beneditina, acreditava que “o homem está cercado por uma multidão de seres misteriosos e leves, no mais das vezes invisíveis, que cruzam incessantemente a rota de sua vida”. De Paracelso são também essas palavras: “Deus povoou os quatro elementos com criaturas vivas. Criou as ninfas, as náiades, as melusinas, as sereias para povoar as águas; os gnomos, os silfos, os espíritos das montanhas e os anões para habitar as profundezas da terra, as salamandras que vivem no fogo. Tudo provém de Deus. Todos os corpos são animados por um espírito astral do qual dependem sua forma, sua figura e sua cor.” Esse elucidativo testemunho de Paracelso é algo muito raro mesmo, ainda mais por ter surgido na tenebrosa Idade Média.
Os historiadores de hoje ficam perplexos ao constatar que os deuses venerados nas inúmeras culturas de tempos antigos eram, na verdade, sempre os mesmos. Ficam intrigados com esse fato e supõem ter existido uma fonte religiosa comum, de onde teriam derivado todas as crenças em divindades, sem considerar a hipótese de que os grandes enteais eram, de fato, vistos por todos aqueles povos antigos, situados tão distantes uns dos outros, no tempo e no espaço, e que por conseguinte as descrições que faziam deles tinham necessariamente de ser semelhantes entre si. O pesquisador J. Garnier escreveu: “Não apenas os egípcios, os caldeus, os fenícios, os gregos e os romanos, mas também os hindus, os budistas chineses e tibetanos, os godos, os anglo-saxões, os druidas, os mexicanos, os peruanos, os aborígenes e até mesmo os selvagens dos mares do sul, devem todos ter derivado suas idéias religiosas de uma fonte comum e de um centro comum. Em toda parte deparamo-nos com as mais surpreendentes coincidências nos rituais, nas cerimônias, nos costumes, nas tradições, e nos nomes e nas relações de seus respectivos deuses e deusas.”
O fato, porém, é que na época em que Jesus chegou à Terra o conhecimento a respeito dos seres da natureza já estava praticamente extinto na humanidade, sobrevivendo apenas em alguns grupos ainda mais estreitamente ligados à natureza, designados pejorativamente de “pagãos” e “gentios” pelo povo eleito do Antigo Testamento. A indicação mais clara de que, há dois mil anos, a humanidade já se encontrava completamente apartada da natureza e de suas leis, é a insistência em sacrifícios e holocaustos de animais, que tisnam várias partes do Antigo Testamento. Esses crimes abomináveis contra a natureza, que horrorizavam os enteais, eram tidos naquela época como agradáveis ao Todo-Poderoso Criador…
Posteriormente, quando da expansão do Cristianismo no Ocidente, o total desconhecimento dos primeiros evangelizadores europeus sobre os enteais os levaram a cometer verdadeiros crimes contra os poucos povos ainda ligados à natureza, a pretexto de salvar suas almas. O missionário beneditino Bonifácio (675 – 754), por exemplo, provocou verdadeira devastação em terras germânicas durante sua missão evangelizadora de levar a “verdadeira fé” aos pagãos. Por volta do ano 730, esse Bonifácio – posteriormente elevado a santo – simplesmente pôs abaixo o imponente Carvalho Sagrado ou Carvalho de Thor dos saxões da região de Geismar, tendo o cuidado de utilizar a madeira sagrada para construir, no mesmo local, um oratório a São Pedro. Logo em seguida, este que viria a ser o “Apóstolo da Germânia” escreveu para a Inglaterra pedindo mais “esplêndidas cópias da Bíblia, escritas em letras de ouro, para que a referência às Sagradas Escrituras seja impressa nas mentes carnais dos gentios.” O leitor pode bem imaginar como esses gentios encararam sua conversão forçada… O historiador Peter Brown diz que “num percurso de 30 anos, Bonifácio deixou sua marca por toda a Germânia ocidental, desde a Baviera até o ponto de encontro das bacias hidrográficas do Lahn e do Weser.” Podemos presumir o alcance dessa marca pelas palavras do papa da época: “Bonifácio foi enviado para iluminar o povo germânico que ainda vive nas sombras da morte, mergulhado no erro.”
O “exemplo” evangelizador da atuação missionária de Bonifácio foi religiosamente seguido na colonização da América e da África. A única diferença é que à hipocrisia doutrinária se adicionou o roubo puro e simples da terra, espoliando seus legítimos donos. Sobre isso, quero citar só duas declarações, bem amargas, de líderes de povos colonizados:
Especificamente em relação à colonização dos Incas o crime foi tanto maior, visto esse povo ter sido o último na Terra ainda ligado à Luz. Roselis von Sass descreve magistralmente a história da vida desse povo extraordinário, e a criminosa conquista levada a efeito pelos espanhóis, em sua obra A Verdade Sobre os Incas. Gostaria apenas de acrescentar aqui três registros conservados da época da pilhagem espiritual e terrena do povo Inca. O primeiro é a interpelação feita aos Incas pelo pregador espanhol Avendaño: “Dizei-me agora, meu filhos, de todos esses homens que nasceram nesta terra antes que os espanhóis pregassem o santo Evangelho, quantos se salvaram? Quantos? Quantos foram para o céu? Nenhum! Quantos Incas foram para o inferno? Todos!” O segundo registro é a opinião do espanhol Cieza de Leon, que percorreu o Peru entre os anos de 1540 a 1550: “Deus quis que essas pessoas ouvissem o santo Evangelho e que seus templos fossem destruídos.” O terceiro registro é a resposta de um Inca sobre o conceito que eles tinham de Deus, mencionada pelo historiador Ivar Lissner: “Vós credes em um Deus que foi morto pelos homens por Ele criado, mas o meu Deus vive e está nos céus, contemplando as Suas criaturas.”
Os Incas eram muito mais desenvolvidos espiritualmente do que seus obliterados colonizadores, assim como também o eram muitos silvícolas nos tempos das grandes descobertas marítimas. Mas, justamente por causa do retrocesso anímico em curso no mundo, essa situação não pôde ser reconhecida por quem detinha na época o poder da força. Os eruditos do tempo de Colombo, por exemplo, não conseguiram encontrar nenhuma justificativa bíblica para a existência de seres humanos habitando o Novo Mundo. Como estes não podiam ser encaixados na lista de descendente dos três filhos de Noé: Sem, Cam e Jafé (cf. Gn10:1), e como não existia um quarto filho de Noé que servisse de fonte para uma quarta raça, concluíram que aquela gente não pertencia à raça humana... Essa sentença deu origem a um intenso debate na Europa entre os defensores e os detratores dos povos indígenas da América. Os últimos apresentaram argumentos convincentes para indicar que aquele povo de pele cor de cobre, que se expressava numa linguagem ininteligível, não possuía nenhuma alma, e por conseguinte não era merecedor da redenção de Cristo. Os ânimos só foram serenar em 1537, quando o papa Paulo III emitiu uma bula declarando que “os índios são verdadeiros seres humanos e capazes de compreender a fé católica”.
Voltemos aos milagres de Jesus. Se a descrição da tempestade acalmada é factível, devido à atuação dos enteais, o mesmo não se pode dizer da estória da água transformada em vinho. Isso é um absurdo completo, simplesmente porque contraria as leis naturais. Água não pode se transformar em vinho e nem vinho se transformar em água. Vinho pode, no máximo, se transformar em vinagre, como efeito natural do processo de fermentação. E por que razão – caso fosse possível – Jesus transformaria água em vinho? Para que uma festa não perdesse seu brilho? Para que os anfitriões não ficassem mal com os convidados? Seus milagres verdadeiros sempre traziam benefícios reais àqueles assim agraciados, quase que invariavelmente seguidos da grave advertência: “Não tornes a pecar!” (cf. por exemplo Jo8:11). Nunca foram praticados com o intuito de proporcionar prazeres a este ou aquele. Se fosse possível ou desejado de outro modo, Jesus também teria seguramente transformado pedras em ouro e distribuído aos pobres. Quem inseriu esse relato de vinho transmutado nos evangelhos quis mostrar Jesus detendo os mesmos poderes do profeta Elias, que quando hospedado na casa de uma viúva teria mantido as botijas da casa milagrosamente sempre cheias de azeite, durante muitos dias (cf. 1Rs17:14-16).
A única coisa de proveito nessa estória é a exortação de Maria aos assistentes, referindo-se a Jesus: “Fazei tudo o que ele vos disser!” (Jo2:5). E de proveito apenas se tomarmos isso não em relação a um milagre inventado, mas em sentido amplo, referente ao cerne da Palavra de Jesus. Nela sempre encontraremos exortações à movimentação espiritual da criatura humana, e nunca indicações de prodígios místicos ou, também, do estabelecimento de algum culto dirigido à sua mãe. Uma tal devoção se opõe frontalmente às indicações da própria Maria, pois ela exortou os seres humanos a fazerem “tudo o que ele vos disser”, e Jesus nunca disse nada nesse sentido, bem ao contrário aliás.
A História registra “milagres” com vinho (com muito mais propriedade aliás) nos templos de Dionísio, deidade grega do vinho e da embriaguez. Esse Dionísio grego, que transformava rotineiramente água em vinho, com óbvias intenções, era o mesmo Baco dos Romanos – o deus da alegria, da vida e da embriaguez dos sentidos… A prova de que os judeus da Palestina receberam influências desse culto foi a descoberta recente de um mosaico de Dionísio na cidade de Séforis, próxima de Nazaré. Na antiga Grécia havia, inclusive, cerimônias comemorando a agonia, morte e ressurreição do deus Dionísio… Esse Dionísio era mesmo um fenômeno. Afora seus milagres corriqueiros, não teve a menor dificuldade de libertar sua mãe do inferno levá-la consigo em triunfo para o céu.
Outras lendas de povos antigos também influenciaram, direta ou indiretamente, alguns autores bíblicos, ou mais precisamente seus “revisores”, dando embasamento à concepção de uma ressurreição corpórea para Jesus. O Osíris egípcio – deus da fertilidade, o Hadad sírio-fenício – deus da tempestade, e o Tamuz babilônico (o Adônis grego) – deus da vegetação, igualmente “ressuscitavam” algum tempo depois da morte… Em seu livro bíblico, o profeta Ezequiel diz ter observado “mulheres sentadas, que choravam pelo deus Tamuz” (Ez8:14). Para os cananeus, Baal era morto numa luta com o deus Mot e depois também voltava à vida.
Em relação às narrativas da multiplicação milagrosa de alguns poucos pães e peixes, que teriam saciado a fome de cinco mil (cf. Mt14:15-21; Mc6:35-44; Lc9:12-17; Jo6:5-13) e posteriormente de mais quatro mil pessoas (cf. Mt15:32-38; Mc8:1-9), são exemplos típicos de interpretação exclusivamente terrena de um acontecimento de alcance espiritual. Os que ouviram falar desse acontecimento condensaram-no no estreito âmbito de sua compreensão intelectiva, adstrita à matéria. E alguém novamente quis mostrar aqui Jesus como muito superior aos taumaturgos do Antigo Testamento, neste caso o profeta Eliseu, que no seu tempo teria sido capaz de saciar “cem pessoas com vinte pães de cevada” (2Rs 4:42-44). Tanto o azeite e a farinha infindáveis de Elias (cf. 1Rs17:16), como os pães de cevada de Eliseu, seu sucessor, serviram de inspiração para esse milagre inventado do Mestre.
Há dois aspectos que chamam a atenção nos relatos evangélicos dessa pretensa multiplicação pani-piscosa. Em primeiro lugar, observa-se que o milagre ocorrido com a multidão dos quatro mil é uma repetição, quase idêntica, do ocorrido pouco antes com os cinco mil peregrinos que acompanhavam Jesus. No entanto, na segunda multiplicação, os discípulos demonstram desconhecer o processo para se alimentar a multidão: “Donde poderá alguém fartá-los de pão neste deserto?…” (Mt15:33; Mc8:4). Mas eles não tinham acabado de ver o que Jesus fizera em relação aos outros cinco mil? Por que uma pergunta coletiva assim tão tola? Quem percebe essa incoerência tem naturalmente de chegar à conclusão que deve ter havido apenas um único acontecimento desse tipo, e que o relato dos quatro mil não passa de uma inserção posterior feita no Evangelho de Marcos (transcrito posteriormente também no de Mateus), sendo, portanto, um relato de segunda mão sobre o mesmo evento. Os copistas “revisores” dos Evangelhos de Mateus e Marcos ficaram tão estupefatos com o milagre que repetiram a dose. O Evangelho de Lucas, o mais criterioso dos três sinóticos e também o mais tardio, conseguiu escapar dessa “revisão” e só menciona a primeira multiplicação de cinco mil pães.
Em segundo lugar, causa estranheza não haver registro nos Evangelhos sinóticos de um único comentário, entre os cinco mil presentes, a respeito de um milagre tão prodigioso. As narrativas dos milagres sempre findam com uma nota sobre o estupor dos presentes, o que não acontece no caso dessa incrível multiplicação de pães. Será que todas aquelas milhares de pessoas receberam de modo assim tão apático seus pães e peixes reproduzidos, sem nenhuma manifestação de pasmo ou júbilo, sequer de interesse? Ou será que os evangelistas não julgaram dignos de nota os eventuais comentários? Parece que o milagre mais espetacular de Jesus não causou maior comoção entre os circunstantes… Foi então um milagre que se contrapôs à própria etimologia do termo, pois a palavra “milagre” é oriunda do latim miraculum, de mirare, que significa “admirar-se”, “espantar-se”.
O que aconteceu na verdade? Jesus havia aludido naquela ocasião ao fluxo de Luz que perpassa a Criação, do qual os seres humanos recolhem somente uma parte, permitindo que muito caia descuidadamente no chão. E aquilo que eles deixavam cair como migalhas, era o bastante para saciar milhares, até milhões de criaturas humanas! (6) Do sentido correto de desperdício existente no ensinamento original, sobrou apenas essa exortação atribuída a Jesus: “Recolhei os pedaços que sobraram, para que nada se perca” (Jo6:12).
Contudo, na divulgação dessa parábola, as pessoas deram forma real ao que haviam ouvido. Acreditaram no fato impossível de que Jesus havia saciado cinco mil criaturas no deserto, servindo se de migalhas que haviam caído no chão. Com o tempo (e a imaginação), essas migalhas por ele mencionadas acabaram se moldando na imagem de pães sendo multiplicados, saídos de uma fabulosa cornucópia divina. Por fim, até peixes acabaram entrando nesse imenso convescote imaginário. É bom que se diga que o peixe era o símbolo dos primeiros cristãos, e são presença constante nas reelaborações de muitos textos do Novo Testamento.
Quem inseriu essa estória nos Evangelhos ainda se esforçou bastante para dar a ela um toque eucarístico, o que deveria confirmar sua veracidade. Compare-se especialmente o texto da ceia no Evangelho de Marcos (Mc14:22) com o da segunda multiplicação de pães (Mc8:6):
“Ele tomou o pão e, após ter dado graças, partiu-o e deu-o a eles.”
(Mc14:22)
“Depois, tomou os sete pães e, após ter dado graças, partiu-os e os deu a seus discípulos.”
(Mc8:6)
Pães e peixes não podem ser “multiplicados”, porque isso não tem nenhum respaldo nas leis naturais que regem a Criação de Deus. É algo absolutamente impraticável, impossível. Tão impossível como transformar pedra em pão (cf. Lc4:3). Serviria bem para um número de mágica de palco, mas não como um verdadeiro milagre praticado pelo Filho de Deus.
As multidões que ouviram Jesus falar se fartaram, sim, de alimento para o espírito, do pão espiritual que ele lhes dava a mancheias, pois as palavras dele eram verdadeiramente “espírito e vida” (Jo6:63). Jesus repartiu o pão da vida com seus ouvintes, sua Palavra. Jesus Cristo, a Palavra encarnada, era o próprio “pão de Deus que desce do céu e dá vida ao mundo” (Jo6:33). Essa Palavra da Vida é a nutrição de que o espírito humano necessita para se manter vigoroso e sadio em seus caminhos de desenvolvimento, que lhe permite, por fim, suplantar todas as adversidades até poder conquistar a “coroa da vida” (Tg1:12), a vida eterna. A condição para essa conquista é estarmos “apegados firmemente à Palavra da Vida” (Fp2:16). Os espíritos humanos que o ouviram naquela oportunidade se saciaram, pois, com esse pão espiritual, que era a sua Palavra da Vida Eterna. O apóstolo João diz que ele e os outros discípulos ouviram, viram e tocaram a “Palavra da Vida” (cf. 1Jo1:1), que era o próprio Cristo Jesus encarnado na Terra.
Os erros propagados na transmissão deste e de outros acontecimentos relacionados à vida de Jesus se devem, pois, à interpretação restrita, ao pé da letra, de fenômenos de alcance espiritual. Contudo, é preciso tomar cuidado para também não se cair no extremo oposto, supondo que tudo quanto se relaciona a Cristo esteja carregado de simbolismos e verdades ocultas. Quem pende para esse outro lado começa igualmente a acreditar em coisas impossíveis, fantasiosas, descortinando aspectos fantásticos em meras cenas da passagem de Jesus pela Terra. Assim, o estábulo em que Jesus nasceu representaria “o corpo físico que abriga em seu interior os membros da família divina”; a singela manjedoura que lhe serviu de berço passa a ser “o corpo etéreo que distribui a força vital pelo corpo físico”; os carneiros e as vacas são “as emoções”; os pastores representam “os guias da humanidade”; os três reis magos simbolizam “os três aspectos da divindade”, e por aí vai… Até o pobre do jumento que levou Jesus para dentro de Jerusalém é portador de insuspeitados simbolismos muares. Visto tratar-se de um quadrúpede domesticado, representa então “os quatro corpos inferiores do homem devidamente disciplinados”… Vê-se aí que quem se deixa engodar pelo misticismo, encobre a vista com os mesmíssimos antolhos impenetráveis de quem faz uso exclusivo do raciocínio nas interpretações das palavras de Jesus e dos acontecimentos relacionados à sua vida. É um pendor que já vem de longe, como o provam alguns textos gnósticos do início da nossa era.
O mero fato de os Evangelhos não fazerem nenhuma referência ao período da adolescência e juventude de Jesus, constituiu um fermento poderoso na massa de fantasias produzidas por cérebros místicos. Os evangelistas não têm nenhuma culpa disso, pois simplesmente seguiram a seqüência típica de descrição dos grandes profetas do Antigo Testamento, narrando o nascimento, a fase adulta e o cumprimento propriamente da missão do protagonista e nada mais. Mas sempre de novo surgem as mais extravagantes concepções para explicar essa “lacuna” na história de Jesus, desde um casamento secreto com Maria Madalena até uma viagem iniciática à Índia… E, no entanto, não há nada, absolutamente nada de misterioso nessa fase da vida do Mestre, cujo silêncio bíblico parece tão exasperante para alguns. Anos antes de iniciar seu ministério Jesus manteve-se apartado dos seres humanos, preparando-se para sua missão. Só isso. Nunca freqüentou um curso secreto para avatares numa escola hindu nem viajou até a Grã-Bretanha para tomar aulas com druidas celtas. O livro Jesus – o Amor de Deus (publicado pela editora Ordem do Graal na Terra) traz passagens desse período da vida de Jesus, o qual não apresenta nenhuma conotação mística ou segredos ocultos. Aliás, o próprio Jesus afirmou claramente: “Falei abertamente ao mundo, (…) nada disse em segredo” (Jo18:20). Não há nada de misterioso nessa época de sua vida, quando “Jesus crescia em sabedoria, em estatura e em graça, diante de Deus e dos homens” (Lc2:52).
Mas, infelizmente, as pessoas gostam do que é misterioso, secreto. Apreciam o que é enigmático e depreciam o que é nítido, amam o confuso e rejeitam o claro. É um sinal tristemente significativo que a verdade singela sobre qualquer coisa praticamente não encontre mais eco nas almas humanas da época atual, as quais só se interessam ainda por textos obscuros, por algarismos cabalísticos e “anagogias de mistagogos”, na linguagem cifrada que tanto apreciam...
Se fizermos uma análise um pouco mais aprofundada, verificaremos que são bem variadas as razões que levam alguém a descolar da realidade e mergulhar de cabeça no lodaçal negro do ocultismo e do misticismo: curiosidade ante o desconhecido, insatisfação com alguma religião, prazer em aprender e experimentar coisas estranhas ou proibidas… Mas o que, na verdade, tal pessoa angaria para si com isso? Além da suposição de se ter tornado mais valiosa e elevada que as demais, e do risco de afundar de vez nas trevas… nada! Apenas sua vaidade terá saído incensada dessas práticas, de modo que faria muito melhor em “aplicar-se àquilo que lhe é acessível e não se ocupar com coisas misteriosas” (Eclo3:22). A palavra que em hebraico expressa vaidade é hebel, a qual possui um núcleo com o sentido de “neblina”, “cerração”, “névoa espessa”. Uma pessoa envolta por vaidade parece mesmo estar dentro de uma neblina particular, que só lhe permite reconhecer e apreciar a si própria.
O ocultismo e o misticismo são invenções exclusivamente humanas. Não existe nada “oculto” na Criação. Tudo é claro e simples para a criatura que conhece as leis nela inseridas e que procura ajustar-se sabiamente a elas. É justamente isso que proclama o livro dos Provérbios, na voz da própria Sabedoria: “Sim, minha boca proclama a Verdade (...). São justas todas as palavras da minha boca (...). Todas são claras para quem sabe entender, e simples para quem encontrou o conhecimento” (Pv8:7-9). Jamais o Criador teria colocado algo em Sua obra límpida que necessitasse de contorcionismos anímicos para ser compreendido. É um sinal de falsa humildade quando o carimbo “imperscrutáveis caminhos de Deus” servem de explicação para qualquer assunto não compreendido. De nada adianta à criatura humana permanecer estagnada em sua ignorância e gritar com fervor ao Senhor: “Como são insondáveis os Seus juízos e impenetráveis os Seus caminhos!” (Rm11:33). Com isso, ela confessa que prefere permanecer estacionada em sua incompreensão ao invés de se movimentar interiormente para assimilar a Vontade do Senhor. É uma confissão de pura indolência espiritual! Quem age desse modo abafa sua intuição com qualquer “divino mistério” inventado, que só se torna um mistério real para quem não se movimenta espiritualmente.
O oculto e o místico foram criados pelo próprio ser humano, quando perdeu a capacidade de ver tudo com clareza, por ter deixado atrofiar suas asas espirituais. Ao fechar para si a visão clara que tinha dos acontecimentos fora da matéria, passou a considerar como oculto aquilo que não podia perceber com os órgãos sensoriais de seu corpo material. Seguramente não é nenhuma coincidência que as palavras misticismo e mistério derivem do verbo grego musteion, que significa fechar os olhos… E para desvendar o que para ele se tornara misteriosamente oculto, o auto-cego espiritual lançou mão justamente do raciocínio, extremamente hábil em ornar com as mais delirantes fantasias místicas aquilo que a ele, o raciocínio, permanecerá sempre vedado, por estar fora do espaço e do tempo da matéria mais grosseira.
Uma armadilha sem-par das trevas. Isso é que são o ocultismo e o misticismo. Pessoas que já trazem em si uma certa inclinação para essas coisas são atraídas por algo aparentemente luminoso e belo, que todavia não encerra nenhum valor. Quando depois chegam ao estágio de formar para si um mundo próprio, produto de sua fantasia e também da de outros, aí dificilmente conseguirão libertar-se a tempo de se salvarem espiritualmente. Não poderão mais emergir do cipoal de matéria fina que se formou em torno delas, gerado por configurações oriundas da fantasia continuamente alimentada, as quais prendem-nas firmemente naquele lugar de ilusão. Sucumbirão nesse seu mundo de sombras, capaz de mostrar ilusoriamente todo o possível e o impossível. Um mundo só de faz-de-conta, em tudo semelhante a uma cidade cenográfica, que só aparenta ser verdadeira com suas belas construções de fachada única, e onde o ator principal é o próprio idealizador e construtor do cenário. Não é sem razão que se fala de “fantasia mórbida” dos adultos, pois outro tipo nem existe. São esses fantasistas “os que andam na vaidade dos seus próprios pensamentos” (Ef4:17), “falseados pela sua imaginação perversa” (Eclo3:24).
No entanto, sem se dar a menor conta disso, milhões de pessoas são continuamente atraídas para essas duas arapucas esotéricas, qual mariposas volteando em torno de luminárias cintilantes. Essa massa mística apenas “consulta o seu pedaço de pau, e a sua vara lhe dá a resposta, porque o espírito de prostituição os engana, e eles prostituindo-se abandonam o seu Deus” (Os4:12).
Cabe ressaltar aqui que nenhuma dessas práticas místico-ocultistas se confunde com a verdadeira arte da astrologia. O que acontece é que neste campo não há uma única pessoa capacitada a exercê-la em plenitude, pois isso demandaria um conhecimento impossível de ser alcançado, pelo menos no atual estágio de desenvolvimento humano. No entanto, reminiscências do saber perdido da arte régia da astrologia podem ser encontradas em textos antigos, sem cunho místico, onde o assunto é tratado de forma natural. Por exemplo: no livro de Ester está dito que o rei Xerxes fala aos “astrólogos” (cf. Est1:15 – Tradução Ecumênica da Bíblia). O termo “astrólogos” é uma tradução concisa, porém muito acertada, da expressão literal no original hebraico: “sábios que conhecem os momentos favoráveis”. Realmente, um verdadeiro astrólogo seria um sábio capaz de conhecer os momentos favoráveis na atuação do carma de uma pessoa, isto é, as épocas em que as irradiações dos astros lhe são favoráveis. (7) Um processo que se efetiva não apenas individualmente, mas também em sentido amplo. O leitor já deve ter notado, por exemplo, como certos tipos de acidentes e tragédias parecem ocorrer em ondas, praticamente ao mesmo tempo no mundo inteiro. Trata-se das irradiações dos astros que liberam um tipo específico de efetivação cármica durante aquele período. Sobre a verdadeira arte da astrologia, o grande Paracelso dizia com propriedade: “Os astros inclinam, mas não obrigam.”
Um novo astro, o Grande Cometa, que em breve se tornará visível, vai trazer por intermédio de suas irradiações os derradeiros efeitos do Juízo Final sobre a Terra, desencadeando profundas transformações em sua geologia e levando nosso planeta para uma outra órbita. Os primeiros efeitos mais fortes da influência desse cometa já se fizeram sentir nos últimos tempos. Dentro em breve toda a Terra estará envolvida por suas irradiações. Então a humanidade saberá que o amor divino é algo muito diferente do apregoado pelas religiões, que nele não existe nenhuma moleza e nenhuma fraqueza. O fato de todos os povos serem atingidos por esses efeitos, independentemente de suas crenças, também mostrará ao mundo que não é a fé aprendida que pode conceder alguma proteção à criatura humana, mas tão-somente o viver em consonância com a Vontade do Todo-Poderoso Criador. Feliz o ser humano que aprender essa lição ainda em tempo de se salvar.
Para grande surpresa dos pesquisadores céticos, entre os conceituados Manuscritos do Mar Morto, descobertos em 1947 em Qumran, foram encontrados dois horóscopos completos. Anos antes, em 1928, a surpresa já fora bem grande por ocasião da descoberta de uma sinagoga do século VI, denominada Bet-Alfa, que ostentava um mosaico com os signos do zodíaco. E para quem achava que a astrologia há muito fora banida do mundo judeu, o já mencionado livro hebraico Zohar afirma que as configurações formadas pelas estrelas e planetas “revelam profundos mistérios”… É muito bom saber que nesses textos sobreviveu um razoável conceito sobre a importância da arte da astrologia. Por outro lado, não deixa de ser divertido constatar que os mais acérrimos críticos da astrologia – os empinados físicos teóricos da ciência – afirmam sem peias que o futuro pode ser previsto através de “branas de 12 dimensões” (seja lá o que for isso) que se desprendem de buracos negros intergalácticos…
Vejamos agora mais um milagre de Jesus: o relato do Mestre andando sobre as águas. Se isso for considerado como ele tendo andado sobre o mar em seu corpo terreno, então também é mera fantasia, porque um tal fenômeno não pode ocorrer aqui na Terra de matéria grosseira. Quando Pedro ingenuamente tentou fazê-lo, simplesmente afundou no mar (cf. Mt14:30). O que pode ter acontecido é os discípulos terem-no visto em seu corpo de matéria fina, por cima das águas do mar. Como esse corpo de matéria fina (alma) é de constituição diferente da matéria grosseira da Terra, ele não afunda na água grosso-material. É o mesmo processo que ocorre durante o sono, quando a alma se afasta do corpo físico para colher suas vivências no assim chamado “plano astral”. (8)
Essa possibilidade é reforçada pela reação dos discípulos ao verem-no chegando em sua direção. Os relatos dos Evangelhos de Mateus e Marcos dizem que eles pensaram tratar-se de “um fantasma, e gritaram” (Mt14:26; Mc6:49), sem o que Jesus “teria passado por eles” (Mc6:48). No Evangelho de João está registrado que ao avistarem-no eles ficaram “possuídos de temor” (Jo6:19), e em todos os relatos Jesus os tranqüiliza, dizendo ser ele mesmo: “Sou eu. Não temais!” (Mt14:27; Mc6:50; Jo6:20). Os discípulos, portanto, não reconheceram de imediato o Mestre porque este não apareceu diante deles com seu corpo terreno, que lhes era bem familiar e que naquele momento repousava, mas sim com seu corpo de matéria fina. O corpo grosso-material terreno dele estava de fato adormecido naquela hora, pois Jesus “subira sozinho no monte quando a noite chegou” (cf. Mt14:23), e o relato afirma que ele caminhou sobre o mar em direção aos discípulos na “quarta vigília da noite” (Mt14:25), o que corresponde ao período das três às seis horas da manhã.
Essa explicação esclarece também o enigma de Jesus não ter sido reconhecido de imediato pelos que o conheciam tão bem, quando lhes apareceu alguns dias depois de seu corpo ter sido sepultado. Maria Madalena, por exemplo, “viu Jesus em pé, mas não reconheceu que era Jesus” (Jo20:14), e até supôs que ele era “o jardineiro” (Jo20:15). Os próprios discípulos do Mestre também não o reconheceram (cf. Jo21:4), e Mateus ainda sustenta que, quando o avistaram, os onze se prosternaram, porém alguns “tiveram dúvidas” (Mt28:17). Os dois discípulos a caminho da aldeia de Emaús, que conheceram muito bem Jesus em vida, tomaram-no por um estrangeiro, um simples peregrino na festa de Páscoa, apesar de caminharem ao lado dele e conversarem longamente (cf. Lc24:13-24). O Evangelho de Marcos acrescenta que “Jesus apareceu com um aspecto diferente a dois deles que iam a caminho do campo” (Mc16:12). Lucas, por sua vez, informa que Jesus “apareceu no meio dos apóstolos” (cf. Lc24:36), contudo “eles, surpresos e atemorizados, acreditavam estarem vendo um espírito” (Lc24:37).
Também chama a atenção o fato de Maria Madalena só ter reconhecido Jesus quando ele a chamou pelo nome (cf. Jo20:16). Sobre o relato dessa aparição de Jesus a Maria Madalena, o estudioso Bruno Maggioni observa com muita propriedade: “Todo o relato parece querer acentuar que Maria, apesar do sepulcro vazio e da presença dos anjos, pensa em tudo, menos na ressurreição. Reclusa na sua tristeza, continua a pensar em furto do cadáver.” Realmente, Maria parece pensar assim desde o momento em que vê o sepulcro aberto e sai correndo para avisar Simão Pedro e um outro discípulo: “Retiraram o Senhor do sepulcro e não sabemos onde o colocaram” (Jo20:2), exclama ela.
O motivo de todas essas dificuldades é que Jesus apareceu diante de seus conhecidos em seu corpo de matéria fina, e não em seu corpo terreno, que havia sido destruído na cruz. Daí decorre também a explicação de Lucas, de que os olhos dos dois discípulos no caminho de Emaús estavam “como que impedidos de o reconhecer” (Lc24:16), e que quando finalmente “se lhes abriram os olhos e o reconheceram, ele desapareceu da presença deles” (Lc24:31). Foi por essa razão também que, depois de morto, Jesus pôde surgir de repente, por duas vezes, no local onde os discípulos estavam reunidos, apesar de em ambos os casos “as portas estarem trancadas” (Jo20:19,26).
O Jesus ressuscitado sempre “surge”, “aparece” e “desaparece” instantaneamente, e nunca simplesmente chega, abre a porta, senta-se, levanta-se, sai e fecha a porta como todo mundo. Para quem reflete um pouco, suas múltiplas aparições em vários locais, e em curto espaço de tempo, já descartam qualquer suposição de uma ressurreição corpórea. Os relatos de visões sucessivas e consecutivas do Jesus ressuscitado em diversos lugares bem distantes entre si, da Galiléia a Jerusalém, indicam que ele apareceu àquelas pessoas em seu corpo fino-material (alma), não sujeito às limitações grosso-materiais de espaço e tempo: “Durante muitos dias, ele foi visto por aqueles que o acompanharam desde a Galiléia até Jerusalém” (At13:31).
Em obediência às leis instituídas por seu Pai na Criação, Jesus não pôde subir aos céus imediatamente após sua morte terrena, mas teve de aguardar ainda “quarenta dias” (cf. At1:3) até que os céus estivessem abertos para ele, isto é, até que se encontrasse sob uma bem determinada irradiação provinda do Alto. Suas aparições se deram justamente nesse período de espera de quarenta dias. Quando Maria Madalena, finalmente, reconheceu Jesus em seu corpo de matéria fina e o saudou alegremente, este lhe disse: “Não me detenhas, porque ainda não subi para meu Pai” (Jo20:17). Jesus também não ascendeu para junto de seu Pai em corpo físico, pois, conforme o nome já diz, esse corpo físico é um invólucro que pertence à matéria da Terra, e nesse âmbito terá de permanecer para sempre. Se ele tivesse subido ao céu em carne e osso, então naturalmente também lhe teria sido possível vir de lá já portando um corpo terreno. Poderia ter obtido esse corpo no próprio céu e descido de lá em carne e osso, já como adulto, sem precisar antes “nascer de uma mulher” como todo mundo. Poderia ter simplesmente aparecido aqui na Terra num determinado instante, sem necessitar passar por todas as fases de um nascimento terreno. Que assim não tenha ocorrido indica que Jesus teve de integrar-se às leis perfeitas de seu Pai, pois qualquer um que desça à Terra fica sujeito a essas leis imutáveis, com atuação precisa para a materialidade, o que demonstra justamente a perfeição delas. Por isso, “como os filhos [seres humanos] têm em comum a carne e o sangue, também Jesus participou da mesma condição” (Hb2:14).
Muitos autores já chegaram à conclusão de que a ressurreição de Jesus, da maneira como é entendida, não foi um evento histórico, mas sim uma interpretação de um acontecimento não inteiramente compreendido naquela época. Em sua obra Auferstehung (Ressurreição), o estudioso W. Marxen explica: “Em termos históricos, pode-se apenas asseverar que, depois da morte de Jesus, as pessoas afirmaram que lhes acontecera algo que elas descreveram como visão de Jesus, e a reflexão sobre essa experiência levou-as à interpretação de que Jesus ressuscitara.” O teólogo R. Bultmann reforça essa conclusão: “O discurso da ressurreição de Jesus não se refere a um evento histórico, mas emprega, antes, uma concepção mítica.” A pesquisadora Odete Mainville afirma que “na catequese mais primitiva, anunciava-se de um lado a ressurreição de Jesus e de outro o desaparecimento do corpo, sem necessariamente estabelecer vínculos de dependência entre os dois acontecimentos”. (9)
O que é certo em tudo isso é que Jesus apareceu a muitos depois de sua morte, mas não que ressuscitou carnalmente: “Deus concedeu-lhe que se tornasse visível, não a todo o povo, mas às testemunhas anteriormente designadas por Deus” (At10:40, 41). Se Jesus tivesse mesmo ressuscitado em carne e osso, seu Pai não precisaria “ter-lhe concedido que se tornasse visível”, pois qualquer um poderia tê-lo visto e reconhecido com a maior facilidade. Seria como na ressurreição de Lázaro, quando este retornou à vida no mesmo corpo e todo mundo logo viu que era ele mesmo. Lucas diz também que “depois da sua paixão, Jesus mostrou-se vivo aos apóstolos com numerosas provas” (At1:3). Claro que ele estava vivo, só que não mais com seu invólucro terreno, o corpo físico. Pedro diz que Cristo fora “morto na carne, mas vivificado no espírito” (1Pe3:18). Quando se diz que Cristo “ressuscitou” da morte, significa apenas que ele ressurgiu depois de morto, isto é, que reapareceu, que se mostrou visivelmente a muitos dos que o tinham conhecido. Só isso. Ele mesmo quis se mostrar a eles, para que acreditassem que estava vivo.
Sobre a passagem referente ao toque de Tomé no corpo de Jesus (cf. Jo20:27), deixo ao leitor a tarefa de ler o esclarecimento dado por Abdruschin no livro Respostas a Perguntas, publicado pela Editora Ordem do Graal na Terra.
Apenas como adendo, um Evangelho apócrifo diz o seguinte sobre o assunto: “Meu irmão, queria contar-lhe uma coisa maravilhosa: algumas vezes quando quero tocá-lo posso sentir um corpo material sólido, mas em outras ocasiões seu corpo torna-se imaterial, como se não existisse.”
As evidências de aparições de Jesus após a morte, em corpo não terrenal, são tão gritantes, tão nítidas, e sobretudo tão perigosas para a antiga concepção de uma ressurreição física, que logo se deu um jeito de inserir no Evangelho uma fala sua segundo a qual ele estaria ali em “carne e osso” (cf. Lc24:39). Agora alguém me diga que razão teria ele para estabelecer uma refeição em sua memória (cf. 1Co11:24,25), se dali a poucos dias estaria novamente junto de seus discípulos em carne e osso... Isso nenhum crente vê nem quer ver, mas se apega de corpo e alma a esse acréscimo espúrio de “carne e osso”. O mesmíssimo tipo de inserção posterior, portanto uma falsificação, reconhecida unanimemente como tal pelos pesquisadores, aparece em alguns manuscritos que trazem a Epístola aos Efésios, onde a menção ao “corpo de Cristo” – interpretada como sendo a Igreja – foi complementada com “da sua carne e dos seus ossos”: “Porque somos membros do seu corpo, da sua carne e dos seus ossos” (Ef5:30).
Mas os partidários da ressurreição física não querem pensar nessas adulterações. O que eles querem enxergar a todo custo são as “provas” em contrário, fabricadas desde o início da era cristã. Por isso, alguém até colocou o Jesus ressuscitado na praia, assando tranqüilamente um peixe na brasa, bem à vista de todos (cf. Jo21:4,7,9), e em duas ocasiões ainda o fez perguntar aos apóstolos se eles “não teriam ali alguma coisa para comer” (cf. Jo21:5; Lc24:41). Em João, os discípulos lhe dizem que não, e Jesus se mostra preocupado com o fato, mandando-os lançar a rede à direita do barco para encontrar peixes (cf. Jo21:6). Em Lucas, Jesus recebe como resposta à sua demanda por comida mais uma vez um peixe assado, o qual “ele comeu na presença deles” (cf. Lc24:42,43). Por fim, Pedro diz que depois da sua ressurreição dos mortos, “nós comemos e bebemos com ele” (At10:41).
É singular que todos esses detalhes gastronômicos só apareçam depois de Jesus ter ressuscitado, como se uma de suas principais preocupações após a morte fosse encontrar alguma coisa para comer, e sempre na presença de testemunhas. Essa insistência em mostrar Jesus comendo peixe a toda hora é apenas a comprovação de inserções posteriores, feitas nesses textos muito tempo depois de sua redação, com o objetivo de combater algumas idéias emergentes já no início da Igreja cristã, segundo as quais Jesus não teria ressuscitado em carne e osso. Os primeiros cristãos, de fato, tinham como símbolo o peixe (não a cruz do Calvário), razão pela qual a imagem de Jesus assando e comendo peixes deveria comprovar a veracidade da estória. Essas alterações perpetradas nos Evangelhos assemelham-se à ação de um criminoso que deixa várias pistas falsas com o intuito de enganar os investigadores; contudo, quando essas pistas são muitas e sempre do mesmo tipo, acabam testemunhando contra o próprio criminoso.
A relação do Cristianismo primitivo com o simbolismo do peixe é fácil de entender. Os apóstolos Pedro e José eram pescadores, e quando Jesus os encontrou pela primeira vez convocou-os a se tornarem “pescadores de homens” (Mc1:17). Segundo Lucas, isso aconteceu logo após uma pesca prodigiosa, por interferência de Jesus (cf. Lc5:1-10). Além disso, a palavra peixe em grego se escreve “ICTHUS”, cujas letras formavam um acróstico para o reconhecimento de Jesus como Salvador e Filho de Deus: Iesous Christos Theous Uios Soter – “Jesus Cristo, de Deus Filho, Salvador”. Daí a utilização do peixe como emblema pelos primeiros cristãos, que o desenhavam nas catacumbas onde se reuniam em segredo. A imagem de Jesus dizendo aos discípulos para lançar uma rede, a qual volta abarrotada de peixes – “não conseguiam puxá-la para fora, por causa da quantidade de peixes” (Jo21:6) – foi interpretada pelos posteriores cristãos como um sinal do rápido crescimento da Igreja...
Para encerrar, o vocativo usado pelo Jesus ressuscitado na praia ao se dirigir aos discípulos – “Filhinhos”, quando lhes pede algo para comer (cf. Jo21:4), não faz parte do vocabulário usual do Mestre, mas é peça recorrente na Primeira Epístola de João (cf. 1Jo2:1,12,18,28;3:7,18;4:4;5:21), um dos escritos mais tardios do Novo Testamento. Supõe-se que essa epístola tenha sido produzida por volta de 110 d.C., visto trazer muitas semelhanças com as cartas de Inácio e Policarpo, da mesma época.
Todas essas inserções caricatas nos Evangelhos canônicos tiveram como único objetivo legitimar a concepção teológica antinatural de uma ressurreição física do Filho de Deus, seguida de uma ascensão corpórea ao reino dos céus. Essas falas falaciosas não passam de invenções, simplesmente porque Jesus jamais disse nem fez semelhantes absurdos, que contradizem todas as leis naturais inseridas na Criação por seu Pai, e que também estariam em franca oposição com os ensinamentos ministrados posteriormente pelo seu apóstolo Paulo: