“Precisamos tomar cuidado para não fazer do raciocínio o nosso ‘deus’. Ele tem músculos poderosos, é verdade, mas nenhuma personalidade.”
Albert Einstein
Religião significa “re-ligação”. É aquilo que possibilita ao ser humano religar-se ao Criador, ou seja, que o reconduz para Ele. Assim, por definição, a religião admite que o ser humano tenha deliberadamente se afastado de seu Criador, competindo a ela, portanto, promover uma nova união com Ele.
Apesar de esta definição literal indicar claramente que a religião é uma instituição exclusivamente humana, que procura reconstruir a ponte rompida pelos próprios seres humanos, os fundadores e dirigentes das inúmeras agremiações religiões e seitas procuram aparentar o inverso disso.
A maior parte deles consideram-se pessoas especialmente agraciadas, que através de alguma experiência incomum (geralmente mística) foram incumbidas de trazer luz aos que se perderam. Sua missão, segundo eles próprios, é trazer salvação a todos os desencaminhados, ou seja, todos os que ainda não professam a mesma crença.
Essa concepção de religião é muito danosa, pois quer fazer crer que Deus, o Senhor de Todos os Mundos, necessita mendigar a atenção dos seres humanos, para que estes finalmente consintam serem salvos, sem naturalmente despender nenhum esforço próprio para tanto. Com esforço próprio entende-se aqui o empenho em melhorar interiormente, redirecionando o pensar, o falar e o agir no sentido do bem. Não significa, de maneira alguma, aquilo que os líderes religiosos entendem como esforço.
Recentemente, num programa religioso divulgado pela televisão, o orador exortava os ouvintes a se esforçarem caso desejassem obter uma graça. O esforço a que ele se referia, porém, era o de locomover-se até a local de culto para receber uma bênção e deixar lá a respectiva contribuição monetária. E muitas, muitíssimas pessoas, acreditam realmente que isto seja esforço próprio, e que estão assim cumprindo sua parte no “trato”. Sua indolência espiritual não as deixa reconhecer o triste, o ridículo papel que desempenham com isso.
A religião, tradicional ou recente, é sempre uma instituição exclusivamente humana. Nenhum dos mencionados Preparadores do Caminho, e tampouco Jesus, desejaram fundar uma religião. Os Preparadores do Caminho, e sobretudo Jesus, o Filho de Deus, trouxeram o saber de que a humanidade precisava para ela mesma poder salvar-se. A Palavra de Jesus foi uma corda de salvação. Por ela poderiam alçar-se todos os que desejassem sinceramente viver de acordo com as Leis da Criação. A Palavra foi e é uma corda. Não é uma escada rolante e muito menos um elevador. Sem esforço próprio, sem uma vontade ardente para o bem e, principalmente, sem agir no sentido do bem, ninguém consegue escalar um milímetro sequer em direção às alturas luminosas.
Toda religião, seita, movimento religioso ou filosófico que exclui o livre-arbítrio do ser humano, e não o guia para a consciência da responsabilidade pessoal em tudo quanto faz, fala e pensa, é prejudicial ao desenvolvimento do espírito. Não se coaduna com a Verdade.
Certa vez tomei conhecimento de um movimento religioso que pregava mais ou menos o seguinte: Jesus, com a morte na cruz, redimiu os seres humanos de seus pecados. Assim, seria uma grave culpa se nos esforçássemos em melhorar, pois Jesus já havia-se desincumbido de nos levar são e salvos para o verdadeiro caminho… Pessoas com um pouco de dignidade certamente não saberão se devem rir ou chorar ao ouvir isso.
Na verdade, não se deve dar muita atenção a conceituações desse tipo, pois os que acreditam ou professam essas coisas merecem realmente ficar presos nessas teias grosseiras de mentira. A mentira, aliás, lhes é muito bem vinda, pois vem ao encontro de sua completa indolência espiritual. Não se preocupam em serem enganados, querem até acreditar nessas coisas, pois assim seus espíritos podem continuar dormindo tranquilamente, sem precisar inquietar-se com a obrigação de se movimentar. Não, essas tendências religiosas não podem ser consideradas perigosas, pois basta um mínimo de vigilância espiritual para enxergar a realidade.
Perigosas são as tendências ou agremiações que encerram em sua doutrina uma ou mais partículas de Verdade, em meio a um amontoado de concepções falsas. Pessoas de boa índole são atraídas para essa ou aquela particularidade que reconhecem como justa e verdadeira, e não se apercebem de que também são obrigadas a acolher compulsoriamente muitos outros conceitos errados, que estão em completa dissonância com a Verdade. Por isso é necessário hoje em dia, mais do que nunca, a máxima vivacidade espiritual de que uma criatura pode dispor quando se defronta com uma nova tendência religiosa.
Já para se analisar com isenção as assim chamadas religiões tradicionais não é preciso muito: basta conhecer qual era o ensinamento original pregado pelo respectivo Precursor, e no que este se transformou quando foi “moldado” pelos seguidores e “elevado” à categoria de religião.
Cito aqui as palavras do padre Sérgio Zanella, extraídas do seu livro A Igreja Traída:
“Se hoje Cristo voltasse, novamente clamaria e exigiria a franqueza das pessoas, e então nós, membros eclesiásticos, seríamos os primeiros a persegui-Lo, chamá-Lo de endemoninhado, de Belzebu, príncipe dos demônios e O pregaríamos na cruz. Pois, na realidade, é isso que estamos fazendo: negando-O, embora usemos seu nome e preguemos sua mensagem, que, na verdade, não é sua, mas acomodada aos nossos interesses e oportunismos. (…)
Em nome de Cristo e de sua doutrina, a Igreja escraviza o povo com seu poder demagógico, sugando-o e impondo-lhe leis, que dificultam a espontaneidade Criador-criatura. Vejam-se as construções, as campanhas efetuadas pela Igreja, a obrigação da assistência à missa, da comunhão, etc. Fecha-se nos templos para rezar. Anda com os nobres. Veste-se com toda a pureza exterior de sua indumentária. Lava as mãos antes de comer, observa todo o ritualismo exterior. (…)
Foi contra esse exteriorismo falso e demagógico, em prejuízo da interiorização dos valores reais do homem e da adesão humilde e honesta da fé, que Cristo se opôs.”
As religiões poderiam e deveriam ser apoios valiosos para o ser humano que anseia por elucidação e desenvolvimento espiritual. Deveriam reeducar com amor e bondade os que se desencaminharam, mostrando como atuam as Leis inflexíveis da Criação, a que todas as criaturas estão sujeitas, e como o ser humano deve comportar-se em relação a elas, para poder colher apenas bênçãos e alegrias no seu caminho de ascensão, por onde ele próprio tem de seguir.
Seria então possível estabelecer uma diferenciação entre religiões “certas” e “erradas”, entre “boas” e “más”?
Uma pessoa só poderá tirar proveito de uma religião se, após minuciosa análise, tomar para si apenas aquilo que pode admitir como certo, isto é, aquilo que ela tem convicção íntima de corresponder à Verdade. Não deve imaginar que é grandeza aceitar coisas que não compreende, ou, pior, que ela no fundo sente como falsas mas que ainda assim assimila para si, apenas porque alguém já se ocupou daquilo antes. Muito pelo contrário! O questionamento de coisas que ela não considera certas em sua religião mostra que seu espírito está vivo, e que se insurge automaticamente contra todo o falso, através de sua voz, a intuição.
O ser humano que se dá ao trabalho de fazer essa análise torna viva a religião, ou melhor, ele vivifica uma religião dentro de si. A sua própria! E isso tem valor!
Naturalmente, nessa análise e busca ele ainda pode inicialmente aceitar muitas coisas como verdadeiras que não o sejam de fato. Isso é um fenômeno natural e faz parte do processo de evolução. O mais importante é que ele não deixe de se movimentar espiritualmente. Se continuar a se movimentar, reconhecerá com o tempo o que ainda pode conservar consigo e o que agora tem de lançar fora, por não se ajustar mais à sua convicção. Mais ainda: muito daquilo que ele considerava certo vê que pode ser mantido, porém, numa forma nova, diferente, mais ajustada com a sua visão. A visão do espírito humano muda à medida que ele evolui, e as formas de suas convicções acompanham essa mudança.
A convicção de um ser humano de espírito livre pode ser comparada a um grande diamante bruto. Nesse estado já é uma pedra maravilhosa, mas à medida que a respectiva pessoa vai amadurecendo, através de vivências, ela vai lapidando o diamante, aperfeiçoando-o, tornando-o cada vez mais belo e resplandecente.
Já a pessoa que aceita placidamente, indolentemente, opiniões alheias sobre assuntos espirituais, recebe de presente uma pedrinha colorida sem nenhum valor. Quando, na hora do Juízo, lhe for cobrado o resultado de sua existência, depois de tantas vidas na Terra e no além, terá de reconhecer, horrorizada, que não possui nada de valor, que foi incapaz de moldar, ela própria, algo de belo e útil. Por isso é tão necessário que o ser humano chegue por si mesmo às suas próprias convicções. Ele é o único responsável pelo seu destino espiritual.
O número de religiões existentes no mundo hoje é espantoso, e a cada mês surgem novas seitas, tendências e ramificações. Esse é também um sinal da nossa época, o tempo do Juízo. É um sinal claro de que a humanidade anda ao léu, completamente perdida, e que se agarra a qualquer isca que lhe seja oferecida dentro do caos atual. O papa João Paulo II atribuiu a origem desse fenômeno a um “panorama de ignorância religiosa e doutrinária, que deixa o povo à mercê de influências perigosas de uma sociedade em que reina a permissividade, responsável pelo eclipse moral que ameaça o homem.” São palavras corretas, que, todavia, devem ser dirigidas a todos os responsáveis por essa ignorância religiosa, que como falsos pastores conduzem os seus rebanhos para o abismo.
Há gotas de Verdade em muitas religiões e filosofias. A Oração de São Francisco, por exemplo, é por demais preciosa ao ensinar como deve ser o verdadeiro servir, além de fazer uma indicação expressa da Lei da Reciprocidade. O preceito budista de se “tomar o caminho do meio” é outra preciosidade, pois é a chave para a obtenção da harmonia em qualquer situação de vida. O ensinamento da fé Bahai de que “o progresso de cada alma depende de seus próprios esforços” é um antídoto contra a letal indolência espiritual. O versículo 15 da 17ª surata do Corão é claríssimo quanto à responsabilidade pessoal de cada um, ao afirmar que “quem se encaminha, o faz em seu benefício; quem se desvia, o faz em seu prejuízo, e nenhum pecador arcará com a culpa alheia.” Os antigos escritos religiosos do hinduísmo, por sua vez, ignorados pela maior pate das pessoas, chamados Vedas, contêm trechos sobre a atuação dos seres da natureza.
Exemplos ricos como estes certamente podem ser obtidos da análise de várias outras doutrinas e ensinamentos religiosos. Todavia, é necessário separar aquilo que permaneceu puro, proveniente dos ensinamentos originais, do que foi torcido posteriormente pelos seguidores. Por isso é tão premente a máxima vigilância espiritual na análise de assuntos religiosos.
Mas não se imagine que vigilância espiritual seja sinônimo de desprendimento terreno. Não. Quem é ativo espiritualmente também o será terrenamente. Jamais desperdiçará o precioso tempo de sua vida unicamente em meditações e contemplações. É uma ilusão desmedida imaginar que o ápice da evolução humana esteja encerrado em conventos e mosteiros. É na vivência do dia-a-dia que uma pessoa lapida a si mesma, progredindo espiritual e terrenamente. O ascetismo não tem nenhuma justificativa na vida terrena.
Nos tempos antigos, os mosteiros do Tibet eram fontes de elevado saber espiritual, sem nenhuma ascese, mas isso também já passou. Lá como cá imperam atualmente a indolência e o comodismo do espírito. Os monges tibetanos andam hoje com as suas “rodas de orações”: um dispositivo que faz um ruído ao se girar uma manivela. É o que eles chamam de “orações”…
Quem se esforçar realmente por elucidação, quem procurar pela Verdade de toda a sua alma, este terá de encontrá-la, obtendo assim respostas a todas as suas perguntas. A Verdade integral só pode ser encontrada pela manifestação de um anseio espiritual ardente, legítimo, e não através de uma simples vontade mental. Quem encontrar a Verdade integral terá nas mãos o maior tesouro que um ser humano pode almejar: o caminho para a obtenção da sua própria salvação.
Não se menciona, nesse processo de busca, os ateus e materialistas convictos, apesar de que também eles geralmente seguem uma religião, a que dão o nome de ciência. Estes estão vivenciando agora o desmoronamento de tudo quanto supunham como certo. Têm presentemente de reconhecer que, ao contrário do que acreditavam, a ciência não pode explicar o acúmulo de transformações da natureza que ora se processa, só servindo para constatar que as coisas estão diferentes. Já quase nada mais resta do orgulho e da presunção desafiadora de ícones ateus do século passado, como Feuerbach, Marx, Nietzche, Freud e outros tipos semelhantes.
A ciência também é incapaz de responder às questões básicas do ser humano: quem somos, de onde viemos e para onde vamos. Quando se tenta obter respostas a essas questões fundamentais com base na ciência, o resultado é sempre um desastre completo, pois o intelecto jamais poderá perscrutar o que está acima da matéria, já que ele próprio provém do ambiente terrenal.
O intelecto é um produto do cérebro, que faz parte do corpo terreno, o qual é formado de matéria. Assim, pela sua própria constituição, o intelecto, o raciocínio humano, não pode desvendar nem explicar nada que esteja acima da matéria. Apesar dessa lógica cristalina, e exatamente por causa da grande simplicidade, pouquíssimos filósofos puderam alcançar esse discernimento, como foi o caso de Pascal, que afirmou acertadamente que “a última marcha da razão consiste em reconhecer que há uma infinidade de coisas que a ultrapassam.”
A imensa massa de filósofos e cientistas passou ao largo e bem abaixo dessa constatação tão simples e lógica, e por isso continuam tentando responder às questões básicas transcendentais com o seu limitadíssimo raciocínio preso à matéria. Alguns cientistas, inclusive, estão convencidos de que a ciência já encontrou respostas conclusivas para todas elas. O Dr. Jacques Monod, prêmio Nobel de Biologia, afirmou: “Finalmente, o homem sabe que está sozinho na imensidão indiferente do Universo, no qual emergiu por acaso. (…) O acaso puro, só o acaso, liberdade absoluta, mas cega, na raiz mesma do prodigioso edifício da evolução.” O cosmólogo americano Alan Guth explica que “o Universo nasceu por acaso, como decorrência de um mau funcionamento do vácuo que o precedeu.” (sic) O biólogo francês François Jacob, ganhador do prêmio Nobel de Medicina, está convencido de que o surgimento da vida na Terra não passou de um lance de sorte. Depois de décadas de complexas pesquisas e impenetráveis estudos científicos ele anunciou ao mundo a sua descoberta: “Não existe Criador nenhum nessa história. A vida é fruto de uma grande coincidência. Num determinado momento, alguns elementos químicos se combinaram e passaram a fazer cópias de si mesmos. (…) O mesmo acaso que propiciou o surgimento da vida há três bilhões de anos faz com que ela se reproduza até hoje.”
Para o Dr. Jacob, os bilhões de seres humanos da Terra, as incontáveis espécies animais e vegetais, vírus e dinossauros, bactérias e baleias, todas as formas de vida que povoam o planeta ou que já passaram por ele são o resultado da fortuita combinação de alguns elementos químicos ocorrida há três bilhões de anos que, por um acaso, sem mais nem menos, resolveram fazer cópias de si mesmos e deu no que deu. Em alguns planetas, como Marte por exemplo, esses elementos químicos não quiseram reproduzir-se, e é por isso que não vemos hoje nenhum cientista marciano pesquisando de onde surgiu.
Uma explicação dessas para a origem da vida, tão pueril e inconsistente, capaz de arrancar uma justificada gargalhada de um camponês analfabeto, é o máximo que a ciência tem a oferecer como resultado do trabalho do raciocínio. Isso deveria constituir uma prova, para pessoas ainda despertas, de que o intelecto humano é completamente incapaz de fornecer respostas aos questionamentos anímicos e espirituais do ser humano. (1) A ciência é útil para explicar e catalogar fenômenos exclusivamente materiais, tendo de malograr fragorosamente quando se atreve a querer explicar coisas que estão acima dos conceitos terrenos de espaço e de tempo.
Aliás, é bastante emblemático que tenha sido justamente um biólogo, e ainda por cima prêmio Nobel, a apresentar essa “descoberta”, pois de acordo com uma pesquisa da revista Nature, 69,5% dos biólogos não acreditam em Deus… Esses cientistas ateus assemelham-se a bactérias patogênicas numa lâmina de microscópio, procurando convencer uma atenta audiência de germes que todo o Universo se restringe àquela lâmina de vidro.
Na sua ânsia de mostrar que detém as prerrogativas de esclarecer qualquer fenômeno natural, a ciência só consegue fornecer provas em contrário ao observador atento. Recentemente, um grupo de cientistas apresentou um trabalho sobre o surgimento da vida na Terra que supostamente aperfeiçoa a hipótese até então aceita da chamada “sopa primordial”: um caldo aquoso de elementos químicos primordiais que teria dado origem à vida após ter sido submetido à ação de radiações espaciais e descargas elétricas. Segundo eles, a vida não surgiu da “sopa primordial”, mas sim de uma “lama primordial”. O barro seria assim mais adequado à formação das complexas cadeias de moléculas da vida do que a água da tal sopa química…
Como essa gente só é capaz de dar valor àquilo que podem destrinchar com o seu raciocínio, deveriam pelo menos meditar nos resultados de um cálculo feito por alguns pesquisadores, sobre a probabilidade de enzimas de uma célula se associarem ao acaso de modo ordenado.
Uma célula viva possui cerca de vinte aminoácidos, cujas funções dependem de duas mil enzimas específicas. De acordo com o cálculo apresentado, a probabilidade de que metade dessas enzimas, portanto mil, se agrupem de modo ordenado, conforme apresenta uma célula, é de uma chance em 101.000. Este número não tem nome, pois é representado pelo algarismo 1 seguido de mil zeros. Para que o leitor possa ter uma pálida idéia do que representa esse valor, basta considerar que o tamanho do Universo observável hoje é da ordem de 1028 centímetros, ou seja, um número de centímetros representado pelo algarismo 1 seguido de vinte e oito zeros. Se um dia esse número passar para 1029 centímetros, significará que o Universo observável terá aumentado em dez vezes!
Os cientistas, aliás, não têm a menor idéia de como é possível que de uma única célula fecundada possa surgir um indivíduo complexo. O próprio raciocínio deles os põe contra a parede, quando têm de verificar que não existem informações suficientes nos genes para, a partir de algumas proteínas e outras substâncias, produzir um ser humano. Só o cérebro já é muito mais complexo do que a molécula de DNA, que transmite os caracteres hereditários. Uma matéria da revista Veja de 16.7.97 questionava: “Como pode o DNA produzir o cérebro? Os cientistas simplesmente não sabem. A embriologia é ainda um mistério insondável.”
Mistério insondável sempre será para quem só dá valor ao método científico na tentativa de desvendar a natureza. A ciência pode virar-se e revirar-se quanto quiser, pode estabelecer as mais incríveis, estapafúrdias e insólitas teorias para tentar explicar as questões humanas fundamentais; jamais, porém, o conseguirá, pois as respostas não estão em balanças de precisão, tubos de ensaio, microscópios eletrônicos ou telescópios orbitais. Sem o olhar humilde do espírito para cima, para a Fonte primordial de toda a vida, não pode haver verdadeiro progresso para os seres humanos, tampouco verdadeiro saber. Em lugar disso só poderá se formar algo insano, fragmentário, exclusivamente racional, com aparência de elevado mas sem nenhum valor real.
Alguns pensadores mais esclarecidos já perceberam isso, como Gilberto Kujawski, que em seu livro A Crise do Século XX diz textualmente:
“A ciência está em crise. Nem nos satisfaz ao conhecimento, nem às solicitações da vida, que clama por realidade, farta de símbolos que só servem ao manejo mental e prático das coisas, aos desígnios da eficácia. (…)
A razão é sacralizada como princípio de desvelamento da natureza e do próprio homem, como fonte da liberdade e da condição de pessoa do ser humano. A ciência é sacralizada como a estrada real para alcançar a realidade, além do engano dos sentidos e das opiniões. A técnica e o progresso são consagrados como princípio e processo de aperfeiçoamento infinito. (…)
A razão pura atingiu o desespero dos seus limites, afrontada pelo irracionalismo cultural, ético, político, existencial, desmoralizada e desacreditada. A ciência, desde a crise dos fundamentos, perdeu e não recuperou sua legitimidade. A técnica degenerou em tecnocracia, precipitando o fim da história. O progresso foi desencantado, fragmentado, e o 'progressismo' já não resiste à ironia e ao escárnio.”
Todavia, como a maioria dos cientistas não admite que exista algo além da matéria terrenal, eles têm a ilusão de que atingiram o ápice do saber humano com as capacitações do seu intelecto, que só pode compreender aquilo que existe dentro dos limites do espaço e do tempo terrenos, já que o próprio raciocínio é um produto do cérebro material. Eles, os inatingíveis cientistas, a mais idolatrada das castas humanas, imaginam estar nas alturas máximas e, no entanto, toda a sua atividade, todas as suas teorias e descobertas movem-se apenas nos limites mais estreitos do plano mais baixo de toda a Criação: o plano material. Triste e ridícula são adjetivos atenuados para descrever a figura que essas sumidades desempenham, não obstante serem admirados sobremaneira por seus contemporâneos.
Assim é, por exemplo, que muitos ouvem embasbacados e assombrados a afirmação de um famoso cosmólogo inglês, de que “talvez um dia a humanidade venha a conhecer a mente de Deus”, e ainda a sua asseveração categórica e conclusiva de que seus estudos demonstram que “Ele não foi o árbitro da Criação…”, ou também sua crença de que “os cientistas devem resolver em breve os principais mistérios do Universo e que a raça humana será rapidamente modificada pela engenharia genética.” Muitos se impressionam também com a revelação de um outro cientista desse tipo, que acredita que se o ser humano conseguir montar uma formiga inteira, molécula por molécula, ela vai sair andando sozinha. Outra colocação desse naipe foi apresentada, em tom sério, por um renomado cientista brasileiro, ex-reitor e ex-ministro, que depois de informar já ser possível montar computadores que imitam o cérebro humano, capazes de aprender, lançou a especulação, pretensamente interessante, sobre se eles teriam uma alma… Já um ganhador do prêmio Nobel (mais um) é de opinião que a alma humana nada mais é do que um amontoado de neurônios… Há também quem julgue importante a opinião de um neurologista brasileiro, de que “daqui a vinte anos ninguém mais vai morrer”, pois a ciência terá vencido a morte…
Aliás, tem muita gente que acredita nessa história de que a ciência vencerá a morte. Nos Estados Unidos existem quatro fundações especializadas em criogenia, uma técnica de resfriamento utilizada para manter corpos congelados a 196 graus negativos. Centenas de pessoas pagaram US$ 120 mil para terem seus corpos congelados após a morte, e 64 delas encontram-se já “criogenizadas”. Elas acreditam que no futuro a ciência será capaz de ressuscitá-las numa espécie de forno de microondas, podendo assim retomar tranquilamente suas vidas aqui na Terra…
Os mais otimistas desses adoradores da ciência conseguem até fazer uma economia considerável, ao disponibilizarem somente suas cabeças no freezer. O custo para congelar apenas a cabeça é uma pechincha: US$ 50 mil. Há no país algumas dezenas de “cabeças-frias” esperando que a ciência do futuro lhes devolva um corpo completo e sadio.
Ocorrem também alguns fatos inusitados relacionados à prática da criogenia. O custo do congelamento embute uma parcela de 8% correspondente a uma poupança, para que no futuro o paciente que retornar da morte possa ter um capital inicial para poder se reintegrar à sociedade de consumo. Alguns, um tanto descrentes em relação às condições econômicas do porvir, fazem uma poupança paralela, para assegurarem uma volta mais tranquila. O presidente de uma dessas fundações estava recentemente às voltas com problemas junto a algumas companhias de seguro, as quais alegavam que se o paciente ressuscitar, o dinheiro pago pelos planos teria de ser devolvido.
É difícil fazer um comentário sobre essas coisas. Só mesmo o mais crasso materialismo poderia dar ensejo a tais excrescências. Fico apenas imaginando a reação das almas das pessoas que mandaram congelar seus corpos físicos, logo após se desligarem deles, quando da ocorrência da morte terrena. Já naquele momento terão consciência da estupidez que cometeram, e não poderão fazer mais nada para remediar. O maior arrependimento, o mais amargo remorso de nada valerão. Terão de vivenciar as consequências desse ato que só poderia ter-se efetivado sob a mais tirânica imposição do intelecto, que agora são obrigadas a deixar para trás.
Estas são as perspectivas que a ciência tem a oferecer aos seus seguidores e admiradores. Contudo, para sermos honestos, é preciso dizer que nem todos os cientistas são tão obtusos como os mencionados anteriormente.
Isaac Newton, por exemplo, o pai da física clássica, certa vez afirmou: “Toda essa diversidade das coisas naturais que achamos adequada a diferentes tempos e lugares não poderia surgir do nada, senão das idéias e vontade de um Ser que existe necessariamente.” Einstein também não tinha a menor dúvida sobre a existência de um Criador; apenas ficou cismando se Ele poderia ter criado um Universo diferente do nosso. O filósofo Francesco Bellino, referindo-se a Einstein, diz: “O seu sentimento religioso assume a forma de um estupor extático diante da harmonia das leis da natureza, revelando-lhe uma inteligência tão superior que, comparado a ela, todo o pensamento e todo o agir dos homens parece um reflexo totalmente insignificante.” Um dos mais renomados físicos do século, o italiano Carlo Rubia, declarou o seguinte quando perguntado se acreditava em Deus: “Quanto mais você observa a natureza, mais percebe que há uma tremenda organização de todas as coisas. É uma inteligência tão grande, que só de observar os fenômenos naturais chego à conclusão de que existe um Criador.” O grande entomologista Edward Wilson considera a natureza um templo: “Tenho vontade de me ajoelhar e orar sempre que visito a floresta amazônica.”
Mas à exceção de alguns poucos representantes mais esclarecidos, a ciência inteira padece desse erro crasso, de imaginar que o raciocínio humano seja capaz de dar respostas às questões fundamentais da vida. E aí ela encontra seus limites.
Também as religiões propriamente ditas estão impregnadas de considerações intelectivas e, por essa razão, seus esclarecimentos estão muito distantes da Verdade singela. Certa vez um conhecido teólogo, tentando esclarecer, chegou a ponto de dizer que uma determinada oração ensinada em sua religião “não proclama a ressurreição da alma ou do espírito, e sim a ressurreição da carne”, e que, de acordo com a teoria da evolução do universo, “agora sabemos que não somos um corpo que abriga um espírito”. (2)
Ressurreição da carne é coisa impossível, pois os planos da Criação não podem misturar-se, devido à diferença de constituição específica. O que é feito de matéria permanecerá sempre no âmbito material, jamais podendo ingressar no reino espiritual. Nunca algo que se encontra em planos mais densos da Criação poderá subir para planos mais leves. Por isso, ninguém pode levar uma pedra ou o saldo bancário para o plano espiritual da Criação, assim como o corpo humano terreno também não pode chegar até lá. Em relação ao próprio Jesus não podia ser diferente, ele que veio para cumprir as leis. Assim, a hipótese lançada por Elisabeth Clare em seu livro Reencarnação – O Elo perdido do Cristianismo, de que “se Jesus não ressuscitou fisicamente, deve ter aparecido aos seus discípulos em seu corpo espiritual depois da crucificação”, é correta em si, com a ressalva de que ele portava externamente não o seu corpo espiritual, mas um invólucro de matéria mais fina, que é a própria alma. O fato de não ter sido reconhecido de imediato pelos que o viram neste corpo, atesta o fato de que ele não portava seu corpo de matéria grosseira, mas sim um invólucro mais fino.
A mesma Lei da Gravidade que conhecemos na Terra atua em toda a Criação, separando automaticamente os vários planos de acordo com a sua densidade e peso. A matéria grosseira, a nós visível, é o plano mais denso e pesado, e por isso ele é o que se encontra mais distante do reino espiritual, denominado Paraíso. Por outro lado, algo espiritual só pode atuar na Terra se estiver coberto com um manto da mesma espécie desta, ou seja, de matéria. Assim, ao contrário do que afirma aquele teólogo, todos nós somos efetivamente seres espirituais, envoltos por um corpo material, o qual nos possibilita viver e atuar aqui neste planeta.
E é por isso também que não tem nenhum sentido a celeuma desencadeada com a possibilidade de se fazer clones (cópias) de seres humanos através da engenharia genética. Toda essa polêmica filosófico-religioso-científica só pôde surgir pelo desconhecimento do que é na verdade um ser humano. É evidente que todas essas maquinações genéticas são erradas. Nenhum proveito verdadeiro pode ser obtido de semelhantes práticas, tão contrárias ao mais elementar senso de ética. De qualquer forma, jamais um ser humano poderá ser reproduzido por clonagem, pela simples razão de que o corpo terreno não é o ser humano propriamente, mas apenas um invólucro material, que o ser humano real, ou seja, o ente espiritual, utiliza em sua passagem transitória aqui na Terra. Uma pessoa até poderá ser geneticamente igual à outra, isto é, ter um corpo idêntico ao de uma outra pessoa; jamais, porém, um espírito será copiado de outro.
Os jornais e revistas que analisaram o assunto em extensos artigos, manifestando suposições inquietantes sobre clonagem de ditadores e expectativas esperançosas em relação a possíveis cópias de um Mozart ou de um Einstein, bem como de cantores de rock e astros do esporte, poderiam ter economizado tinta e papel e evitado promover a busca de soluções para um problema que não existe. A maior estultice dita até agora a esse respeito cabe sem dúvida ao jornal “Chicago Tribune”, ao lembrar que ainda devem existir vestígios do sangue de Jesus na cruz, sugerindo que poderia ser uma boa idéia fazer uma cópia do Salvador. E a ameaça mais aterradora vai para o cientista Valeri Bykov, diretor do Instituto de Estudos Biológicos da Rússia, que afirmou ser possível fazer uma clonagem de Lênin…
Mas voltemos às religiões. Um tratado poderia ser escrito apenas sobre os erros transmitidos por todas as religiões instituídas e doutrinas correlatas, que há muito colocaram o intelecto no lugar do espírito. Porém, não será preciso escrever nada semelhante para elucidar quem quer que seja, pois já se assiste hoje, nitidamente, ao desmoronar de todos os falsos conceitos religiosos.
Em toda a parte, sob a irresistível irradiação do Juízo Final, o mal cresce continuamente até se auto-exaurir, aniquilando a si mesmo, de forma que são as próprias trevas que se eliminam, servindo assim como instrumentos da Luz. Isso acontece em todos os campos da atuação humana e, logicamente, também no campo religioso. As inúmeras cisões e desentendimentos surgidos dentro das agremiações religiosas e os ataques entre elas fazem parte disso. Vamos tomar apenas um exemplo elucidativo.
Há algum tempo houve no Brasil um embate entre a Igreja Católica e a Igreja Universal.
Essa Igreja Universal foi a agremiação religiosa que mais cresceu no país em todos os tempos. Na época da sua fundação, em 1977, tinha 4 membros; em 1990 eram 900 mil adeptos; em 1995 já abrigava 3,5 milhões de fiéis, com 225 templos espalhados por 34 países nos quatro continentes, sem contar os 2.100 templos no Brasil; em 1997, vinte anos após sua fundação, ela já atuava em 70 países. Seu faturamento anual é da ordem de 800 milhões de dólares e, assim como o Vaticano, também possui seu próprio banco. O crescimento da Igreja explica-se pela promessa de livrar os fiéis de entidades nefastas que os impedem de ser felizes com a família, resolver problemas de saúde, conseguir dinheiro e progredir na vida. Para obter tudo isso é exigido do seguidor que dê algo em troca, ou seja, que faça uma oferta a Jesus na forma de contribuições monetárias.
No dia 12 de outubro de 1995, dia da padroeira do Brasil, um bispo da Igreja Universal apareceu num programa de televisão dando socos e chutes numa imagem de Nossa Senhora Aparecida, para provar que aquilo era só uma figura inerte de madeira e que, portanto, a veneração daquela imagem não passava de idolatria.
O caso provocou uma comoção nacional. Enquanto grupos de católicos apedrejavam templos da Igreja Universal e alguns mais exaltados os invadiam de armas em punho para tomar satisfações, ou promoviam um quebra-quebra geral, o alto comando da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) estimulava novas manifestações de desagravo à santa. Jornais de circulação nacional estampavam manchetes de primeira página sobre o assunto e publicavam extensos e indignados editoriais alertando contra a possível eclosão de uma “guerra santa”. As redações ficaram abarrotadas de cartas de leitores, reprovando ou defendendo o ato. O prefeito da cidade de Aparecida entrou com um pedido de abertura de inquérito policial.
O palco para o confronto estava armado. De um lado, a recém-nascida Igreja Universal, uma instituição voltada para o lucro como qualquer outra empresa terrena, que julga ser seu dever combater a idolatria de imagens. Do outro lado, a milenar Igreja Católica, que não aceitava ser taxada de idólatra e se considerava injustamente atacada pelos seus fanáticos adversários neo-pentecostais.
Quem estaria com a razão?
Nenhuma das partes. Ambas as instituições pertencem, na realidade, a uma mesma igual espécie. Essa igual espécie é formada pelos erros imiscuídos nas doutrinas e pelos falsos conceitos que propalam.
É difícil encontrar palavras para qualificar corretamente (e imparcialmente) uma instituição como a Igreja Universal e tantas outras assemelhadas, que se consideram depositárias das graças de Jesus para o bem viver terrenal, graças que têm o poder de intermediar de acordo com a respectiva contribuição monetária: mais dinheiro, maiores graças; menos dinheiro, menores graças. Toma lá, dá cá. O tal bispo do chute, nos cultos que dirigia, ameaçava: “Se você tem mais [dinheiro] na bolsa e não quer dar, é o diabo!” O fundador da Igreja resumiu assim numa entrevista a sua Teologia da Prosperidade: “Os negócios aqui na Terra são administrados pelo homem. Se for inteligente, astuto, e souber aproveitar as oportunidades, esses dons, aliados à bênção divina, farão dele uma pessoa tremendamente próspera.”
Da mesmo forma, também é difícil entender como milhões de pessoas no mundo aceitam placidamente a explicação eclesiástica de que ajoelhar-se diante de uma imagem, tocá-la, beijá-la e orar voltado para ela, esperando sua intercessão, não seja idolatria, e sim uma “veneração respeitosa”…
E mesmo que fosse apenas uma veneração, desde quando um objeto, seja ele de cerâmica, madeira ou de ouro, faz jus a uma veneração humana? Os objetos sacros de todas as religiões devem servir tão-somente para elevar o pensamento e o íntimo de quem os contempla em direção ao Criador Todo-Poderoso. Única e exclusivamente. Jamais podem os próprios objetos serem adorados ou venerados.
Adoração de imagens é idolatria crassa. Porém, o combate a isso foi desencadeado por uma instituição de mesma espécie. O ato grosseiro do chute mostrado na TV tem a mesma baixeza da adoração de imagens. A Igreja Universal, aliás, considera idolatria a adoração de imagens, mas se cala ante a adoração do dinheiro, do poder e da influência terrena. Tudo isso é idolatria no mais profundo sentido. Qualquer um desses ídolos, e ainda vários outros que o ser humano nem se dá conta, o faz pecar contra o Primeiro Mandamento (3) e o arrasta à perdição.
Mas não é meu propósito discutir em detalhes os erros e os falsos conceitos das religiões atuais, pois tudo isso já está com os dias contados. Vamos apenas examinar mais à frente, com alguns exemplos, os chamados “dogmas”, e seus efeitos sobre o espírito humano.
Também não é verdadeira a afirmativa de que todas as religiões levam a Deus. É o próprio ser humano que tem de se movimentar se quiser aproximar-se Dele. Não lhe basta absolutamente filiar-se à qualquer doutrina, achando que com isso reservou seu lugar no céu.
Da mesma maneira é errado dizer que apenas uma religião é verdadeira, sendo falsas todas as demais. O que é único e determinante para uma alma humana é o princípio correto de vida, isto é, o viver em conformidade com as Leis da Criação. A esse princípio de vida correto pode-se, sim, dar o nome de religião verdadeira, pois engloba tudo o que o próprio ser humano tem de fazer para aproximar-se novamente do seu Criador.
Há hoje no mundo, em todos os povos, uma busca frenética por outros valores que não os meramente terrenais. Também isso é uma característica da época do Juízo Final, que ao provocar o fortalecimento de tudo quanto se acha escondido na alma humana, sejam coisas boas ou más, reforça também em muitas pessoas o anseio por algo mais elevado, caso esse anseio não tenha sido já completamente soterrado pelas quinquilharias do raciocínio e futilidades cotidianas. A busca pelo religioso, pelo lado espiritual da vida, pelo místico e oculto fazem parte deste processo.
O extraordinário incremento dessas coisas em nossos dias decorre dessa fermentação desencadeada pelo Juízo Final. Cabe, porém, à própria pessoa que procura, manter vivo esse seu anseio e dirigi-lo sempre para cima. Agindo assim, à medida que ascende espiritualmente ela vai reconhecendo paulatinamente os erros das muitas doutrinas e ensinamentos religiosos, que vão ficando para trás, enquanto ela cada vez mais se aproxima da Verdade luminosa.
Já quem quer apaziguar o seu anseio com alguma brincadeira mística, ou simplesmente ingressando despreocupadamente numa igreja ou seita, apenas porque achou bonito um ou outro ensinamento da doutrina, este soterra dessa maneira o seu precioso anseio, e passa a fazer parte também, automaticamente, daqueles que nunca sentiram esse anseio dentro de si. Ambos os grupos de seres humanos são constituídos de espíritos acomodados, indolentes, pouco importando se um permaneceu sempre parado e o outro deu alguns poucos passos vacilantes para a frente. Se o ser humano não se esforçar em ascender espiritualmente, ele não se salvará, independentemente se é católico, protestante, judeu, muçulmano, budista ou hinduísta.
Essa procura incessante por valores não materiais, e o consequente crescimento de produtos e serviços religiosos para atender a demanda, já foi detectada por vários estudiosos do comportamento humano e é alvo de acalorados debates. A antropóloga Eliane Gouveia da PUC de São Paulo constata: “O mercado dos bens de salvação se fortaleceu e se diversificou de uma forma intensa nos últimos tempos.” O sociólogo Dennis Crossen da New York University comenta: “Os anos 80 foram marcados por valores individualistas e agora estamos enfrentando uma ressaca dessa era. As pessoas estão se voltando para valores mais espirituais, uma espécie de remédio à desilusão.”
Algumas poucas notícias já são suficientes para se constatar isso.
Nos Estados Unidos as atividades religiosas cresceram 80,6% entre 1987 a 1993, enquanto que nesse mesmo período a população cresceu 5,9%; em março de 1991 foi inaugurada em Nova York uma mesquita de 150 milhões de dólares. No Japão existem mais de 180 mil cultos registrados junto ao governo; só na década de 80 surgiram mais de 200 mil seitas no país. Na França estima-se haver cerca de 18 mil grupos esotéricos. Na África há atualmente 30 mil igrejas independentes.
Por toda a parte livros esotéricos vendem como água. Nos Estados Unidos, as vendas desse tipo de literatura cresceu 40% entre 1990 e 1996, e o movimento anual hoje é da ordem de 1,1 bilhão de dólares. No Brasil, apenas sobre o assunto “anjos” havia, em 1993, um total de 13 títulos disponíveis, em 1994 já eram 21 títulos e em 1995, 52 títulos; somente no ano de 1994 foram vendidos no país cerca de 34 milhões de livros sobre religião e esoterismo.
Toda essa busca faz surgir novas agremiações religiosas para atender ao anseio das pessoas, ou, melhor dizendo, para angariar o maior número possível de adeptos e sedimentar uma influência terrena. Foi de olho nesse novo filão que no Brasil três irmãos – dois executivos e um empresário – abandonaram suas atividades para fundar uma nova Igreja, direcionada especificamente às classes sociais mais abastadas. Em dois anos eles ergueram 24 templos no país, boa parte deles com ar condicionado. Uma entidade concorrente deles, já há mais tempo estabelecida no mercado, oferece locais para culto com mesas de luz e sistema de áudio e vídeo com telão…
Faz também parte das tentativas de revitalização da fé, o incrível aumento dos relatos de pseudo-milagres em todo o mundo. Um deles já está até se tornando comum: imagens de santos que choram lágrimas ou gotas de sangue.
Há relatos de imagens que exsudam líquidos na Europa (Bélgica, Irlanda, Holanda, Itália), na Ásia (Coréia, Japão, Vietnã) e na África (Ruanda e Zaire). Na Itália, é uma verdadeira febre: pelo menos onze casos em várias cidades do país registrados na mesma época. Num desses casos, o sangue chorado de uma imagem de Nossa Senhora foi levado para análise, a qual demonstrou tratar-se de sangue de um ser humano do sexo masculino… Em Los Ângeles, verificou-se que as lágrimas coaguladas de uma imagem da Virgem, exposta na Igreja Ortodoxa Russa da Sagrada Transfiguração, compunha-se de uma solução de açúcar solidificado. De acordo com uma matéria jornalística, em várias “estátuas milagrosas” de outros tempos foram descobertos mecanismos lacrimosos internos.
No Brasil, na cidade de Louveira, uma estátua de Nossa Senhora da Rosa Mística chorou 68 vezes desde 1990. Em 1996, porém, contrariou a expectativa de três mil fiéis e não verteu uma só gota no dia especificado para o fenômeno; em compensação, os comerciantes da região venderam fotos da imagem chorando, camisetas comemorativas e galões de água benta de cinco litros… As lágrimas da Virgem de Louveira foram posteriormente analisadas por peritos da Unicamp, tendo sido constatado que, curiosamente, tinham a mesma composição da água do poço que abastece a igreja… O padre responsável pela paróquia rebateu enfaticamente o laudo dos especialistas, pois segundo ele as lágrimas tinham gosto de lágrima mesmo. E quando o bispo da região decidiu, sensatamente, remover a imagem da igreja, foi alvo de protestos irados dos “fiéis”.
Além do padrão normal de lágrimas e de sangue, há registros de estátuas que choram óleo, perfume e até mel. Na cidade paulista de Mirassol o rosto da imagem da Virgem ficou certa vez coberto de sal no dia da padroeira do Brasil. Na Igreja da Natividade, em Belém, fiéis afirmam que o rosto de Jesus retratado numa pintura começou a chorar, enquanto outros asseguram tê-lo visto abrir e fechar os olhos… Há também o estranho caso de um busto de Elvis Presley, que começou a chorar na Holanda em agosto de 1997…
A massa dos que crêem nesses “milagres” e os propagam, querem realmente acreditar nisso. Preferem aceitar as mais inverossímeis e absurdas histórias e recitar mecanicamente suas orações centenas de vezes, a gastar um único minuto num esforço espiritual de aprofundamento interior e de melhoria como seres humanos. Eles querem acreditar nessas coisas, pois isto não lhes custa nenhum esforço próprio. Preferem viver recostados preguiçosamente na ilusão, ao invés de se movimentarem corajosamente em busca da Verdade. São escravos espirituais, que negociaram suas almas em troca de comodidade.
Por isso, é até compreensível a posição do padre católico Robert Smith, que publicou um livro intitulado “Comparative Miracles”. Nele, o padre Smith sustenta que todas as evidências tidas como milagres devem ser rejeitadas, já que a crença nesses eventos não faz parte da doutrina católica. Segundo ele, “os adeptos são livres para aceitar ou rejeitar os testemunhos desses acontecimentos.” (Citado de “Milagres – Uma exploração científica dos fenômenos paranormais” de D. Scott Rogo).
Há, todavia, alguns fatos que precisam ser ditos a respeito de milagres e outros acontecimentos tidos como inexplicáveis:
Milagres verdadeiros nunca podem estar em oposição às Leis da Criação. Trata-se sempre de acontecimentos naturais, cuja efetivação, condicionadas por circunstâncias bem específicas, se dá com uma velocidade fora do comum. Por ocorrerem assim tão rápido, parecem aos olhos do ser humano terreno como inexplicáveis, ou seja, milagrosos.
São os casos, por exemplo, das curas instantâneas de moléstias. Uma fé verdadeira, aliada a uma vontade humilde e sincera, formam uma base que permite a ancoragem de um verdadeiro auxílio do Alto, que se efetiva então como um milagre. Decisivo para isso, no entanto, é o estado íntimo da pessoa, de como ela se abre para este tipo de auxílio. Por essa razão, as melhorias de saúde verificadas em decorrência unicamente de êxtases religiosos são, invariavelmente, de curta duração, já que êxtases não podem constituir nenhuma base firme para uma cura verdadeira.
A conceituação de milagre é, portanto, exatamente o oposto da idéia que se acostumou a ter do fenômeno, como esta declaração do filósofo escocês do século XVIII, David Hume, colhida de sua obra “Investigação acerca do Entendimento Humano”: “O milagre é uma violação das leis da natureza, e como uma firme e inalterável experiência estabeleceu essas leis, a prova contra o milagre, pela própria natureza do fato, é tão cabal quanto se poderia imaginar qualquer argumento tirado da experiência.”
O milagre não é uma violação das leis da natureza, jamais poderia sê-lo, mas é tão-somente um evento que ocorre de maneira acelerada. O fato de se achar acima da capacidade de compreensão humana, não significa que seja algo arbitrário. Muitíssimo pelo contrário. Digno de nota é um dos critérios para codificação de milagres descritos por Lambertini em seu “De Canonizatione”: “Um dos indícios de cura milagrosa é a instantaneidade, isto é, o processo se revela rápido demais para ser resultado de uma atividade biológica qualquer do corpo.” Correto. É precisamente isto. Correta também é a constatação da escritora católica Renée Haynes: “Nos episódios de cura milagrosa, aquilo que levaria semanas para ocorrer exige apenas algumas horas ou mesmo minutos.”
Já os inúmeros casos relatados de casas apedrejadas misteriosamente, objetos que se movem, incêndios espontâneos, etc., não são milagres e nem tampouco obras do demônio. Em todos esses casos os acontecimentos acompanham uma bem determinada pessoa, geralmente jovem. Essa pessoa dá ensejo para que almas do além consigam se fazer notar de forma materialmente visível. Isso se dá pela irradiação do sangue da pessoa, mas nada tem a ver com possessão. (4) Alguns dos acontecimentos inusitados relacionados a imagens podem eventualmente ter a mesma causa, mas sempre haverá uma determinada pessoa que propicia involuntariamente o desencadeamento da ação terrenalmente visível por alguma alma presa à Terra.
Todos os fatos tidos hoje como inexplicados só o são em razão do desconhecimento da engrenagem universal. Esclarecimentos do tipo “desígnios insondáveis de mistérios impenetráveis” devem ser traduzidos por ignorância pura e simples. Para quem conhece as Leis da Criação, tudo se apresenta claro e inequívoco. Não há lugar para o oculto, o místico, o misterioso e o fantasioso.
Contudo, as pessoas que têm um pendor por essas coisas não ficam desamparadas. Alguns exemplos:
De acordo com o relato de Scott Rogo, missionários da África do Sul trouxeram a história de que os nativos costumam rezar para aliviar a dor de dente… e em resposta encontram obturações de ouro e prata em suas bocas.
O nascimento de uma vaca de pelos vermelhos em Israel foi interpretado recentemente por alguns judeus ortodoxos como um sinal da proximidade da vinda do Messias. A alegria inicial acabou dando lugar a um grande temor, pois havia a ameaça de eclosão de uma guerra religiosa, caso os judeus ortodoxos achassem que havia chegado a hora de destruir as mesquitas para reconstruir o Templo de Salomão, do qual veneram a única ruína, chamada de Muro das Lamentações. Contudo, passados alguns meses o rabo da vaca começou a ficar branco e o alívio foi geral, pois segundo a tradição bastam dois pelos de outra cor para uma vaca vermelha deixar de ser vermelha.
Uma corrente espírita acaba de relançar um livro que segundo o Editor é “a obra do século”. Trata-se nada mais nada menos do que a vida de Jesus contada por ele próprio. O Editor explica que o livro foi psicografado em 1885 por uma médium de instrução rudimentar, e que a primeira edição “desapareceu misteriosamente”. As edições subsequentes foram todas vendidas rapidamente, em razão do “profundo interesse dos estudiosos da doutrina cristã”.
Somente quem desconhece por completo os fenômenos na Criação pode imaginar que seria possível ao Filho de Deus descer até uma sessão mediúnica para transmitir informações sobre a sua passagem pela Terra. Jesus encontra-se numa altura completamente inconcebível para a imaginação humana, e trata-se apenas de vaidade e presunção imaginar que ele possa descer de lá assim, sem mais nem menos, para poder atender às expectativas de um centro espírita.
O caso do chamado “Santo Sudário” ou “Sudário de Turim”, que teria impressa a imagem de Jesus crucificado e que durante séculos foi objeto de veneração, é outro assunto que vem causando polêmica a décadas. Amostras do tecido foram enviadas aos laboratórios da Universidade do Arizona, da Escola Politécnica de Zurique e da Universidade de Oxford. Os resultados foram inteiramente consistentes, indicando que a peça remonta a um período entre os anos de 1260 e 1390 da nossa era, aproximadamente na época em que ele apareceu pela primeira vez na Europa, em 1355. A história retrospectiva do Sudário só pode ser retratada com segurança até o século XIV, quando era seu proprietário o cavaleiro Gofredo de Charnay, falecido em 1356. Durante os séculos XIV e XV havia cerca de 40 Sudários semelhantes sendo exibidos na Europa…
Quatro anos antes do teste triplo de datação, o Sr. Joe Nickel já havia publicado um livro de 178 páginas (Inquest on the Shroud of Turin) repleto de provas forenses contra a autenticidade do Sudário. De acordo com o físico Allan Mills, da Universidade de Leicester, a imagem impressa é provavelmente de um membro das cruzadas, crucificado pelos mouros.
Mas essas constatações não são suficientes para demover as pessoas de prestarem honrarias divinas a um objeto. O Sr. Ian Wilson, especialista britânico na iconografia de Cristo, é de opinião que o Sudário seria uma espécie de “teste divino para os fiéis”… A datação feita pelos laboratórios seria espúria, visto que a suposta ressurreição de Jesus teria mudado em caráter definitivo as propriedades do material…
Se surgirem mais cem provas contra a autenticidade do Sudário, aparecerão outras cem refutações desse tipo, plenamente suficientes para dirimir possíveis dúvidas dos adeptos. E se algum desses adeptos insistir em ter sua própria opinião, corre o risco de ser anatemizado. É o que fora previsto no decreto dogmático do cânone IV3 do Concílio Vaticano I: “Se alguém asseverar ser possível que algumas vezes, conforme o progresso da ciência, seja dado às doutrinas propostas pela Igreja um sentido diferente daquele que ela tem entendido ou entende, que seja anátema.”
Ainda na mesma linha de imagens gravadas em tecidos, há a história do véu de Verônica. Verônica era uma mulher de Jerusalém, que ao ver Jesus a caminho do Calvário teria corrido até a frente do cortejo e, com o véu, enxugado o sangue e o suor do rosto dele. Uma imagem perfeita do rosto teria ficado impressa no tecido. Uma história que até pode ser chamada de bela, se ficar restrita ao campo das lendas, pois segundo Scott Rogo já no século XII havia inúmeros “véus de Verônica” publicamente exibidos nas igrejas da Europa, cada uma delas pretendendo, naturalmente, que o seu fosse o verdadeiro! No seu livro “Santa Verônica e o Sudário”, Ewa Kuryluk conta que um pano com a “impressão verdadeira” da imagem de Jesus foi autenticado em 1216 pelo papa Inocêncio III, que a partir daí instituiu um “ofício da Santa Face”, com invocações próprias. Acontece que inúmeros outros panos com a imagem de Jesus continuaram a aparecer, pois a demanda era enorme. Os copistas chegaram a fundar uma corporação para atender às igrejas e conventos de toda a Europa, que adquiriam as peças e organizavam seus próprios “cultos da Santa Face”.
Todos esses ícones cumpriram e continuam cumprindo a sua função até hoje: desviar a atenção das pessoas do único tesouro verdadeiro: a Palavra de Jesus Cristo, o Filho unigênito de Deus.
As instituições religiosas também se vêem obrigadas a alterar continuamente suas práticas e prédicas, a fim de permanecerem à tona, oferecendo sempre novos produtos aos adeptos. Isso não precisaria acontecer, se o objetivo dessas doutrinas fosse exclusivamente auxiliar com amor as pessoas, e se seus ensinamentos e práticas fossem realmente certos. Se fossem realmente certos e abrangentes não precisariam sofrer seguidas modificações, poderiam permanecer sempre os mesmos. Tal não se dá porém, pois estando apoiados em bases precárias esses ensinamentos necessitam ser continuamente reformulados e reinterpretados; um tipo de movimentação ainda capaz de inflar alguma vida às formas exteriores.
Enquanto as profundas reformulações de doutrinas são decididas em cerimônias específicas, e depois apresentadas aos seguidores como atos de inspiração divina, a fim de legitimá-las, as pequenas modificações ocorrem rotineiramente nos cultos e nas várias concepções doutrinárias. Todas essas alterações, porém, grandes e pequenas, têm forçosamente de ocorrer, a fim de manter vivas as acepções ensinadas por essas agremiações.
A maior parte dessas mudanças não desperta nem mesmo a curiosidade da compacta massa de adeptos, que continua a aceitar apaticamente, devido à sua inércia espiritual, tudo quanto lhes é impingido. Algumas alterações, porém, são tão grotescas que deveriam chamar a atenção de pelo menos alguns poucos desses algemados espíritos humanos. Alguns exemplos:
Em setembro de 1995 foi lançada nos Estados Unidos uma versão “politicamente correta” do Novo Testamento e dos Salmos da Bíblia, com a colaboração do Seminário Teológico de Chicago.
Nessa nova versão, o nome Deus-Pai é substituído por “Deus Pai e Mãe”, tendo sido eliminados também todos os pronomes “Ele” relacionados ao Criador. A oração Pai Nosso passou a ser “Pai e Mãe Nossos”. Foi retirada a palavra “escuridão” como sinônimo do mal, sob a alegação de ter uma conotação racista. Para não constranger os canhotos e as feministas o trecho “a mão direita de Deus” passou a ser escrito “a mão poderosa d'Ele d'Ela”. A expressão “Filho do Homem” passou a ser grafada “O Humano”.
O bispo e chefe da Igreja Anglicana na Escócia, Richard Hollonay, disse simplesmente o seguinte a respeito do adultério: “O adultério não é um grande pecado, pois Deus dotou os homens com os genes da promiscuidade. Para a espécie humana sobreviver, nós devemos sair e espalhar nossas sementes.”
Seu colega, o pastor John Papworth, esclareceu que furtos de grandes supermercados nada mais são do que “necessária realocação de recursos econômicos”; segundo ele, este ato tem o mesmo peso moral de “apanhar conchas na praia”.
Em novembro de 1996, a Igreja Anglicana celebrou um culto exclusivo para sodomitas e lésbicas na catedral de Soutwark. Vários clérigos dessa igreja argumentam que a homossexualidade não é uma perversão, e que criticar o homossexualismo é pecado. As igrejas inglesas, aliás, se transformaram em galerias de arte, teatros, armazéns e restaurantes, possivelmente para atrair parte dos 70% da população do país que diz não acreditar em Deus.
Todas as pequenas modificações e alterações de práticas religiosas atestam evidentemente a mutabilidade dos conceitos. Todavia, nada disso é tão danoso como a imposição das chamadas “verdades inquestionáveis” das religiões, os pesados e rígidos dogmas, que só puderam surgir através da imposição de considerações intelectivas sobre os ensinamentos originais, outrora puros, das doutrinas. Contrariamente aos casos pitorescos mencionados acima, os dogmas não chamam a atenção, não despertam a reflexão, antes a proíbem, tendo de ser aceitos incondicionalmente pelos adeptos.
Temos aí, por exemplo, a questão do dogma da infalibilidade papal. A partir do Concílio Vaticano I (1869-1870) os papas passaram a ser infalíveis. Os papas anteriores ao citado Concílio, talvez por ainda não serem infalíveis, cometeram alguns atos, digamos, não muito apostólicos:
Em 1410, o papa João XXIII (não confundir com o papa de mesmo nome do século XX) cobrava impostos dos prostíbulos e os contabilizava normalmente. O filho do papa Sérgio III com sua amante acabou se tornando o papa João X, por influência direta da própria amante, de nome Teodora. João XII, neto de um tal Marózia (que foi o assassino do papa João X), vivia com a amante de seu pai, o papa João XI, que era filho ilegítimo do mesmo Marózia. João XII violou moças virgens e viúvas e fez do palácio papal um bordel; acabou assassinado durante um ato de adultério pelo próprio marido enfurecido da mulher. O papa Bonifácio VII assumiu a cadeira de Pedro depois de estrangular seu antecessor, Bento VII.
O papa Inocêncio VIII (1484-1492) teve 16 filhos com mulheres casadas. Seu sucessor, Alexandre VI, costumava promover orgias no Vaticano na presença dos filhos César e Lucrécia. Em 1513, o papa Leão X achou uma outra utilidade para o Purgatório inventado por Sixto VI; para convencer os fiéis a doar dinheiro para a restauração da Basílica de S. Pedro, ele anunciou a boa nova: “Ao som de cada moeda que cai neste cofre, uma alma se desprende do Purgatório e voa até o Paraíso!” O sucessor de Leão X foi o papa Adriano VI, que achou melhor continuar apenas comercializando indulgências para conseguir os recursos necessários à restauração da Basílica; uma dessas indulgências, vendida na época pelo dominicano Johannes Tetzel, dava ao comprador o direito antecipado de pecar… Em 1537, o papa Paulo III emitiu uma bula informando ao mundo que os índios possuíam uma alma, e que portanto podiam ser iniciados na crença de Cristo… Em 1555, o papa Paulo IV emitiu a bula Cum nimis absurdum, que é um primor de intolerância e prepotência. Jean Delumeau a reproduziu em sua obra História do Medo no Ocidente. Vamos a ela:
“É por demais absurdo e inconveniente que os judeus, condenados por Deus a uma eterna escravidão por causa de seu pecado, possam, sob o pretexto de que são tratados com amor pelos cristãos e autorizados a viver no meio deles, ser ingratos a ponto de insultá-los ao invés de agradecê-los, e bastante audaciosos para se erigir em senhores ali onde devem ser súditos. Informaram-nos que em Roma e em outras partes eles levam a insolência a tal ponto de habitar entre os cristãos, na vizinhança das igrejas e sem um sinal distintivo, de que alugam casas nas ruas mais elegantes e ao redor das praças nas cidades, aldeias e localidades onde vivem, adquirem e possuem bens imóveis, mantêm criados e amas-de-leite cristãs, assim como outros criados assalariados, e cometem diversas outras más ações para sua vergonha e em desprezo do nome cristão.”
Em 1864, o papa Pio IX emitiu um documento para orientação dos católicos denominado “Súmula de Erros”. Seguem abaixo alguns dos ensinamentos ministrados por esse papa no citado documento:
E a idéia então de que não existe salvação fora da Igreja Católica? Os papas, tanto os falíveis como os infalíveis, sempre tiveram uma especial predileção por este disparate. (5) Alguns exemplos:
A partir de 1870 os papas passaram a ser infalíveis. De acordo com o dogma da infalibilidade papal, decretado durante o Concílio Vaticano I, “Deus preserva o sumo pontífice de errar em matéria de fé e moral quando este se pronuncia 'ex cathedra' como vigário de Cristo.” A locução latina “ex cathedra” quer dizer “da cadeira”; falar “ex cathedra” significa “falar a partir do trono de Pedro”, como chefe da Igreja. Vejamos então o que dizem os papas infalíveis:
Cerca de um bilhão de pessoas no mundo permitem que se lhes digam essas coisas. Não lhes opõem nenhuma resistência, não fazem a menor indagação. Uma grande parcela até contribui para que sejam gerados outros dogmas. No ano de 1997, o então papa João Paulo II recebeu um documento com 4.340.429 assinaturas, coletadas em 157 países, solicitando que ele exercesse o poder da sua infalibilidade para proclamar o dogma de que “a Virgem Maria é co-redentora, mediadora de todas as graças e advogada do povo de Deus.” O trecho de uma matéria veiculada pelo jornal O Estado de S. Paulo sobre o assunto, em 24 de agosto de 1997, dizia: “Aparentemente, em lugar da Santíssima Trindade haveria uma espécie de 'Santíssimo Quarteto', com Maria desempenhando os papéis de filha do Pai, mãe do Filho e esposa do Espírito Santo.”
Assim, os dogmas vão se superpondo uns aos outros. E quem dentro da Igreja se atrever a questionar essa produção em série de imaginações, está perdido. O papa Pio X, por exemplo, não titubeou em lançar um enorme expurgo na Igreja entre 1907 e 1914, quando foi confrontado com as opiniões de um grupo de católicos denominados “modernistas”. Citando novas descobertas científicas e históricas, os modernistas – dentre os quais havia vários teólogos respeitados – desafiaram abertamente os dogmas eclesiásticos. O papa esbravejou: “Essas pessoas esperam ser tratadas com abraços. Mas o que precisam, e receberão, é um bom soco!”
O murro papal veio na forma da remoção dos dissidentes de universidades e seminários, a nomeação de um censor para publicações católicas e a instalação de um comitê de vigilância em cada diocese. Os bispos receberam ordens de vigiar seus subordinados e “arrancar das mãos dos fiéis livros e materiais impressos que considerassem ruins.” Os padres foram obrigados a assinar um juramento anti-modernista, enquanto espiões observavam o clero em discussões suspeitas e fotografavam às escondidas a correspondência dos teólogos; uma única denúncia anônima podia levar um escritor à excomunhão ou um padre à expulsão.
Quem ainda esperava que no futuro a Igreja reconhecesse estes excessos, foi surpreendido com a canonização do papa Pio X, que hoje pode ter a sua imagem adorada (ou venerada) em qualquer altar católico.
Se as pessoas observassem mais atentamente os acontecimentos à sua volta, com imparcialidade, muitos aparentes enigmas seriam esclarecidos. Não é nenhum acaso, por exemplo, o fato de os papas terem geralmente uma vida repleta de padecimentos físicos e anímicos. Qual seria a explicação para isso, se eles são os Vigários de Cristo na Terra? Seriam “provações”? Apenas para despertar a reflexão, segue abaixo o estado de saúde física (já que a anímica pode ser camuflada) dos últimos papas:
Será que o Criador precisa submeter seus servos aqui na Terra a padecimentos físicos? Em mais de uma ocasião o papa João Paulo II afirmou que as dores causadas pelas doenças são uma oportunidade de provação… Mas o papa está enganado. Seus padecimentos e os de seus antecessores não são provações, e sim retornos cármicos. Apenas isto.
Cada conceito falso imposto por uma religião é um elo a mais na grossa corrente de erros que prende o espírito do adepto, impedindo sua ascensão. Se, dependendo da religião, ele está envolto com uma ou cem voltas dessa corrente, pouco importa, pois ele está irremediavelmente preso! Tem de libertar-se dela, integralmente, se quiser subsistir no Juízo. Mais uma vez é ele, somente ele, que pode arrebentar as algemas, já que foi elemesmo que se prendeu, ao aceitar apaticamente as invencionices que lhe foram apresentadas.
A pessoa que aceita irrestritamente os dogmas de uma religião acaba com o tempo por perder a própria capacidade de análise. Repito que nesse caso ela sequer ousa ainda pensar em analisar logicamente, com imparcialidade, aquilo que a sua religião afirma como verdadeiro, já que isso poderia ser pecado! Nem se atreve a imaginar que talvez exista algo lá que não seja real, algo que ela acreditou durante anos, assim como fizeram seus pais e avós. “Não, é melhor deixar tudo como está, é melhor não mexer nessas coisas!…”
Tal pessoa não é livre, mas prisioneira de uma instituição terrena. Tão firmemente presa que nem sequer é capaz de querer se libertar! É uma prisão muito eficiente, sem dúvida! A mais eficiente que existe: aquela que não permite ao prisioneiro nem mesmo pensar em libertar-se, que o faz acreditar já estar livre enquanto continua algemando-se voluntariamente.
Assim são as religiões da época atual. Prisões, a que acorrem multidões pressurosas de seres humanos indolentes espiritualmente, contribuindo para lhes aumentar o prestígio, a glória e a influência terrenas. Elas se afastaram da Verdade trazida pelos Precursores e pelo próprio Filho de Deus. Mantêm a humanidade sob um jugo invisível e não pressentido, a serviço das trevas em sua luta final contra a Luz, durante o tempo do Juízo.
Quero terminar este tópico transcrevendo o trecho de uma carta publicada no jornal O Estado de S. Paulo de 17 de outubro de 1995, na seção Fórum de Debates, cujo tema naquele dia era “igrejas”:
“A evolução fatalmente vai levar-nos ao entendimento correto de igreja, que hoje representa um imenso comércio que nada faz para esclarecer e espiritualizar seus frequentadores. Não se trata dessa ou daquela religião, parece-nos que todas perderam o rumo e que muitas deixam a desejar em relação aos ensinamentos de Cristo. Numa época tão atribulada, às vésperas do terceiro milênio, em que a humanidade busca freneticamente uma luz, os dirigentes das instituições religiosas não se dão conta da responsabilidade que têm nas mãos.”