Várias doenças, consideradas extintas, ou restritas a uma determinada área geográfica do planeta, retornaram com força avassaladora nos últimos anos. Surgiram novas linhagens de agentes infecciosos, e cepas há muito conhecidas da medicina se tornaram em pouco tempo resistentes ao tratamento com antibióticos.
Também doenças glandulares, com ou sem componentes hereditários, tornam-se mais graves com o decorrer do tempo. O diabetes, por exemplo, matava 700 pessoas para cada grupo de 100 mil no início do século no município de São Paulo. Em 1992, essa proporção era de 16.700 mortes para cada 100 mil pessoas…
Na 16ª Conferência Internacional de Diabetes, em Helsinque, Finlândia, os pesquisadores informaram que a doença estava se tornando uma epidemia global. Em julho de 1997, o número de portadores de diabetes no mundo era estimado em 135 milhões, e o número de mortes anuais em decorrência da doença em 2,8 milhões.
“Penso, na verdade, que podemos dizer que a epidemia está aqui e agora”, diz Paul Zimmet, diretor-executivo do International Diabetes Institute.
O maior crescimento da doença, principalmente a do tipo II, se verifica na primeira idade. De acordo com uma matéria publicada em maio de 1996 no The Journal of Pediatrics, apenas entre 2% e 3% dos pacientes pediátricos tinham diabetes do tipo II antes de 1992; num estudo recente realizado em Cincinnati, Ohio, constatou-se que 33% dos doentes entre 10 e 19 anos eram portadores do tipo II.
O Dr. Jack Jerwell, presidente da International Diabetes Federation, declarou o seguinte: “Eu prevejo que o diabetes será um dos maiores assassinos do mundo no ano 2000”. Para ajudar a cumprir esta previsão, em julho de 1997 pesquisadores suíços publicaram um estudo na revista americana “Cell” dando conta que haviam identificado um novo vírus, que poderia também estar causando diabetes.
O Dr. Jerwell certamente tem base para fazer esta previsão. Mas, por ora, não obstante a gravidade do diabetes e de outras doenças glandulares, são as infecções e as doenças parasitária as maiores assassinas da humanidade.
Segundo a OMS, vírus, bactérias e parasitas são, de longe, a principal causa da mortalidade humana. Nas palavras de um jornalista, “os números refletem uma tendência desanimadora, na qual antigos inimigos estão ressurgindo para desafiar a capacidade da medicina de controlar infecções.”
O percentual de óbitos das várias causas computadas pela OMS em 1995 foi o seguinte:
Em 1996, cerca de 17 milhões de pessoas morreram no mundo vítimas de doenças infecciosas ou parasitárias. Só a hepatite B foi responsável por 1,1 milhão de mortes.
Em março de 1998, o “Surgeon General” David Satcher (responsável pela saúde pública dos EUA) fez uma apresentação no Congresso americano informando que a taxa de mortalidade por doenças infecciosas no país havia crescido 22% entre 1980 e 1992, isso sem contar os óbitos decorrentes da AIDS. As principais causas eram a tuberculose, a influenza e o surgimento de bactérias multiresistentes.
Exatamente 50 anos antes desta declaração de Satcher, o secretário de Estado dos EUA dizia em uma das reuniões do IV Congresso Internacional de Medicina Tropical e Malária, em Washington, que “a vitória sobre todas as doenças infecciosas era iminente”. Em 1958, uma outra importante personalidade da área de saúde dos Estados Unidos afirmava enfaticamente que “a fase das doenças infecciosas terminara com a vitória sobre seus agentes, os inimigos da humanidade.”
Agora, na década de 90, as doenças infecciosas respondem por um terço de todas as mortes ocorridas no mundo… Por qualquer parâmetro analisado, em qualquer região do planeta, as doenças infecciosas e parasitárias crescem em todo o mundo. Na Comunidade de Estados Independentes (ex-União Soviética) foram registrados 839 casos de difteria em 1989, em 1993 foram 19.504, em 1994 o número foi de 47.628 e em 1995 foram 50.425 casos. Em 1996, cerca de 200 mil pessoas de 17 países da África subsaariana foram atingidos por uma epidemia de meningite meningocócica, que matou pelo menos 25 mil. No Brasil, os casos de leishmaniose dobraram em uma década, e a sífilis vertical – transmitida da mãe para o filho – cresceu quase sete vezes de 1991 a 1996.
Na década de 40, doenças como as provocadas por estafilococos tinham sido transferidas da categoria “extremamente perigosas” para a de “infecções secundárias facilmente controladas”. Em 1946, apenas 5% das bactérias estafilococos eram resistentes à penicilina; em 1948 esse número havia subido para 18%; em 1950 era de 40% e em 1982 de 90%. Atualmente há linhagens de estafilococos resistentes a vários tipos de antibióticos.
E assim é com vários outros germes. Em 1941, as infecções respiratórias causadas por estreptococos era curadas em quatro dias com uma dose diária de 10 mil unidades de penicilina. Em 1992 eram necessárias 24 milhões de unidades de penicilina por dia, e mesmo assim a infecção podia ser letal.
Na década de 70 ainda subsistia uma certa confiança na capacidade humana de derrotar definitivamente os micróbios. Essa esperança foi se extinguindo com o passar dos anos, como a chama de um toco de vela. No final da década, o tom das declarações já era muito mais cauteloso e realista. Ao encerrar um congresso internacional sobre um novo mal batizado de Doença dos Legionários, em 1978, o historiador médico Robert Hudson, disse:
“Ao admitirmos que nosso conhecimento sobre agentes patogênicos microscópicos existentes é deficiente, também forçosamente temos de admitir a possibilidade da volta das grandes epidemias do passado. Existe a possibilidade de que um organismo comum e mortífero possa emergir e facilmente se disseminar de pessoa a pessoa e ficar ao largo de qualquer método terapêutico e preventivo.”
Por volta de 1980, o Banco Mundial divulgou um relatório informando que a campanha mundial de erradicação da malária havia fracassado, e que a incidência da maioria de outras doenças transmitidas por vetores, que apenas uma década antes se considerava fácil de eliminar, tinha, também, aumentado de forma alarmante. Em seu livro A Próxima Peste, a Dra. Laurie Garrett informa que naquela época a doença do sono (tripanossomíase), a bilharziose (esquistossomose) e a cegueira fluvial (oncocercose) estavam ficando mais frequentes, geralmente nos mesmos países beneficiados, naquele período, com doações e empréstimos de bilhões de dólares. Foi também na década de 80 que uma doença até então considerada rara, a febre maculosa, que se não for diagnosticada a tempo mata em cinco dias, ressurgiu nos Estados Unidos e em vários países da Europa.
Recentemente, o Dr. David Bennett, da Organização Pan-Americana de Saúde, falou sobre o que estava acontecendo: “Ao contrário das expectativas de dez ou vinte anos atrás, quando se acreditava que as doenças infecciosas estavam em declínio, temos um problema real agora.” O especialista em doenças tropicais, Paul Epstein, foi ainda mais enfático: “Estamos vendo uma emergência, ressurgência e distribuição de doenças infecciosas em escala global, numa dimensão que não se manifestava desde meados de 1880!”
Os próprios hospitais transformaram-se em importantes focos de disseminação de infecções. Nos Estados Unidos estima-se que anualmente dois milhões de pacientes internados em hospitais para tratar de alguma doença infecciosa acabam adquirindo uma outra lá, e na metade dos casos por germes resistentes a antibióticos.
As doenças também estão mais difíceis de tratar. A penicilina, descoberta por Fleming em 1928, começou a ser produzida em escala comercial no ano de 1943. De lá para cá foram desenvolvidos antibióticos cada vez mais poderosos, que após algum período de uso apresentavam um grau maior ou menor de ineficácia, causada pelo surgimento de bactérias mutantes, resistentes a esses medicamentos. Já estamos na 3ª ou 4ª geração de antibióticos, um mais potente que o outro. Há alguns anos certos pesquisadores preconizaram o surgimento de bactérias resistentes a absolutamente todos os tipos de antibióticos disponíveis, receio que se confirmou em fins de 1997.
A resistência a antibióticos parece um mal por si só. Cepas de bactérias até a pouco fáceis de ser combatidas, tornam-se de repente extremamente virulentas e imunes à ação de medicamentos. E cada uma delas pode gerar em apenas um dia 17 milhões de descendentes super-resistentes a drogas.
A partir de 1975, uma variedade de Staphylococcus aureus até então tida como sem grande influência no ser humano, passou a secretar uma toxina extremamente venenosa e a se multiplicar 10 mil vezes mais rápido do que as colônias de estafilococos comuns. A doença ocasionada por esse germe foi chamada de “Síndrome de Choque Tóxico”, frequentemente fatal. Os sintomas são os seguintes: erupções avermelhadas pelo corpo, queda acentuada da pressão sanguínea, vômito, diarréia, dores musculares, disfunção renal, falência do fígado, elevada coagulação sanguínea, confusão mental, perda de consciência.
Em 1989, constatou-se o surgimento de uma cepa mutante da bactéria Streptococcus, que também começou a secretar uma toxina letal e igualmente provocava uma síndrome semelhante à do Choque Tóxico…
O Dr. Artur Timerman, infectologista do Hospital Albert Einstein, resumiu desta forma a situação que estava vivendo em fins de 1997:
“No caso da pneumonia causada por bactérias resistentes, a situação é cada vez mais semelhante à do início do século. Em muitos casos a solução é simplesmente fazer uma cirurgia para extrair o pulmão infectado. Estamos vivendo uma situação parecida à existente antes da descoberta dos antibióticos.”
Exemplos dramáticos do problema de resistência a drogas não faltam:
Em agosto de 1995, o Centro de Controle de Doenças nos Estados Unidos (CDC) anunciou que a bactéria Streptococus pneumoniae havia-se tornado a maior causa de doença e morte no mundo. Só nos Estados Unidos ela estava por trás de três mil casos de meningite, 500 mil de pneumonia e mais de 7 milhões de infecções de ouvido por ano.
A bactéria mostrou-se resistente a pelo menos quatro tipos de antibióticos. O índice de resistência dessa bactéria à penicilina atingiu 25%, “um número surpreendente” nas palavras do Dr. Alexandre Tomasz, da Universidade Rockefeller em Nova York. Segundo ele, “há menos de uma década, a frequência [desse tipo de bactéria] resistente à penicilina era de aproximadamente 0,02%.”
Vamos ver a situação no mundo de algumas doenças antigas, tidas até a pouco tempo como extintas ou controladas:
Até algumas décadas atrás o cólera era tido como uma doença medieval, conhecida apenas pela classe médica e pelos professores e estudantes de medicina e história geral. Os sintomas são diarréia, vômitos intensos e choque causado pela desidratação, decorrente da perda de até 20 litros de água por dia. Quando não tratada leva à morte em 50% dos casos.
Em 1961 teve início uma pandemia (epidemia mundial) de cólera, que se estendeu até 1975.
Em 1991, o Peru foi atingido por uma epidemia sem precedentes da doença, que provocou inúmeras mortes e se alastrou pelos países vizinhos, inclusive o Brasil, onde a doença estava erradicada desde o final do século passado. Em 1991 houve 2.103 casos de cólera no Brasil e 33 óbitos. Em 1992 foram registrados 37.572 casos e 462 mortes, ano em que a OMS informou que uma nova linhagem do vibrião colérico havia sido identificada, o Vibrio cholerae 0139, relacionado a outras epidemias da doença. Em 1993 houve 60.044 casos e 650 mortes no Brasil, e em maio de 1994, a OMS divulgou que o nosso país já era o mais afetado pela doença em todo o mundo, com maior número de casos do que El Salvador e Peru, respectivamente 2º e 3º colocados. Em 1995, os surtos de cólera no Brasil passaram a atingir uma parte da população indígena.
As últimas epidemias da doença impressionaram pela violência e rapidez. Em 14 de julho de 1994, os refugiados hutus que tentavam escapar da guerra étnica contra a tribo dos tutsis, na África, instalaram-se na localidade de Goma, no Zaire. No dia 20 daquele mês eclodiu um surto de cólera na região e oito dias depois a doença havia dizimado 19 mil refugiados. Ainda em 1994, o cólera assolou a Albânia, o país mais pobre da Europa, e também a Ucrânia, onde até outubro daquele ano mais de 700 pessoas haviam sido infectadas.
Em 1996 o cólera atingiu a capital do Zaire e o sul do Sudão, deixando neste último um saldo de 1.800 doentes e 700 mortos. Em 1997 o vibrião colérico estava ativo em 17 países americanos, e no Brasil o número de óbitos crescera 20% em relação ao ano anterior. Nas primeiras 4 semanas de 1998 o Peru contabilizava 2.863 casos e registrava-se surtos da doença em vários países africanos; em Hong Kong começaram a surgir alguns casos esporádicos. De acordo com um relatório da OMS da época, os casos de cólera no mundo haviam quadruplicado desde o início da década.
Ainda no início de 1998, logo após relatar novos surtos de cólera em Moçambique, Quênia e Uganda, uma Organização criada pela ONU especialmente para estudar o ressurgimento de antigas doenças e a eclosão de novas, manifestou-se desta forma em relação ao cólera: “Este final de século parece ter muito mais cólera no mundo do que em todo o século passado. As pandemias anteriores, pelo biotipo clássico, não deixaram focos endêmicos. A atual pandemia, pelo biotipo Eltor, veio pra ficar: América, África e Ásia com surtos e epidemias nestes últimos meses.” Em abril de 1998 já se registrava surtos da doença também na Bolívia, Honduras, Equador e Nicarágua.
Em outubro de 1994, a revista Veja noticiou desta forma o ressurgimento da peste pneumônica na Índia, conhecida na Idade Média como peste negra:
“Às portas do século XXI, uma epidemia esquecida pela medicina leva o pânico ao segundo país mais populoso do mundo. (…) A peste pneumônica é mais uma entre as várias doenças infecciosas que se julgavam erradicadas e que reaparecem com força total para assombrar o mundo às portas do século XXI.”
A peste pneumônica, variante mais perigosa da peste bubônica e como esta também transmitida por ratos, é extremamente contagiosa. Uma pessoa doente, ao tossir, pode infectar quem estiver próximo através de poucas gotículas de saliva. Se não for tratada, a doença mata em poucas horas.
Na Índia a situação é mais grave porque os ratos são venerados como divindades, companheiros do “deus-elefante Ganesh”, e acredita-se que sejam reencarnações dos membros da comunidade que veneram a “deusa Karni Mata”. Os fiéis oferecem doces e leite aos animais e chegam a beber com veneração, na palma das mãos, o leite e a água tocados pelos ratos… Os seguidores dessa idolatria pavorosa estão sendo, portanto, atingidos através do próprio objeto de seus cultos.
Após duas semanas do seu início a epidemia da peste pneumônica já atingia cerca de 4.800 pessoas na Índia e se alastrava para o Vietnã, Kuwait e Nepal.
Em setembro de 1997 constatou-se o aparecimento de um novo tipo de peste bubônica em Madagascar, imune a antibióticos.
A tuberculose é causada por um bacilo, transmitido pela inalação de secreções das pessoas infectadas. Pode atingir o pulmão (forma mais comum), gânglios, laringe, ossos, pele, articulações, intestino e rins.
Apesar de nunca ter sido considerada erradicada, o tratamento através de antibióticos sempre se mostrou eficaz, situação que perdurou até o início da década de 80. Naquela época, quem falasse em dificuldades para tratar a tuberculose pareceria ridículo em qualquer congresso médico…
Em 1993, a OMS declarou estado de urgência no mundo em razão da expansão da doença. Em 1996, a Organização informava que três milhões de pessoas haviam morrido de tuberculose em 1995, um recorde jamais visto desde o século XIX, quando ainda não havia antibióticos disponíveis. A doença foi a única (até então) a receber a classificação de “emergência global” pela OMS.
O diretor do Programa de Tuberculose, Arata Kochi, declarou o seguinte na época: “A epidemia de tuberculose é pior agora do que em qualquer outra fase da história da humanidade. Não existe lugar no mundo que se possa considerar a salvo da tuberculose.”
Um outro médico da OMS, Joel Almeida, complementou: “A tuberculose é agora a principal doença infecciosa mortal do mundo.” Em todo o mundo morreram cerca de 40 milhões de pessoas entre 1987 e 1997, vítimas de tuberculose.
Naquele ano de 1996 havia nada menos que 1,9 bilhão de pessoas infectadas em todo o mundo, das quais se previa que 20 milhões (1%) desenvolveriam a doença. No início de 1997, a OMS informava que, a cada segundo, em alguma parte do mundo uma pessoa contraía o mal. Os portadores do bacilo já eram 40% da população mundial…
A tuberculose também ressurgiu nos países da ex-União Soviética e do Leste Europeu. Cerca de 29 mil pessoas morreram em 1993 nesses países em razão da doença. Na Sibéria e em Moscou o número de casos dobrou de 1990 a 1993.
Na Inglaterra o número de doentes cresceu 12% em cinco anos. Em Londres, um em cada 50 desabrigados tinha a doença em 1995.
No Brasil, na cidade do Rio de Janeiro, as estatísticas demonstram que os casos da doença duplicaram em termos reais nos últimos anos. Entre 1988 e 1996, o número de doentes passou de 90 para 180 para cada grupo de 100 mil habitantes. O gráfico abaixo mostra essa variação:
Em 1995, o Ministério da Saúde anunciou que o combate à tuberculose seria a maior prioridade do ministério naquele exercício. Em outubro daquele ano, o aumento da incidência da doença no Estado de São Paulo colocou em alarme o Centro de Vigilância Epidemiológica. Apenas numa única unidade médica, considerada como de referência para o diagnóstico e tratamento ambulatorial, as consultas aumentaram 42% entre 1992 e 1995. No primeiro trimestre de 1996, dez brasileiros adoeciam a cada hora e 14 morriam todos os dias, vítimas de tuberculose; em 1997 eram 16 mortes por dia.
Há algum tempo surgiu um super-bacilo no Vietnã, resistente a antibióticos e que já apareceu nos Estados Unidos. O número de pacientes com tuberculose no Vietnã já vinha aumentando cerca de
20% ao ano ao longo dos últimos 7 anos, segundo fontes oficiais do país. Em fins de 1997, o novo tipo da doença, denominada MBR-TB (tuberculose resistente a múltiplas drogas) já representava 2% dos casos mundiais. Arata Kochi declarou o seguinte na época: “O bacilo sofreu uma mutação e transformou-se num inimigo mortal, criando um tipo de tuberculose resistente às drogas conhecidas.” No início de 1998, o CDC alertou os médicos para ficarem atentos a fim de impedir uma epidemia de uma variante altamente contagiosa da doença, que se multiplicava mil vezes mais rápido que o bacilo convencional e era capaz de espalhar-se apenas duas horas após a exposição…
Ao fazer referência ao ressurgimento de doenças antigas, em particular a tuberculose, que desafiam agora a medicina com sua resistência aos tratamentos com antibióticos, assim se expressou a revista Veja, numa matéria de setembro de 1994:
“Doenças que se julgavam extintas ou controladas, como o cólera, a própria tuberculose ou a meningite, ressurgem a cada dia, em formas mais virulentas. Hoje, segundo a OMS, morrem a cada ano três milhões de vítimas da tuberculose. Diarréias dizimam outros 3,2 milhões de vidas. A malária ainda abate um milhão. A pneumonia, 4,3 milhões. (…)
O sonho de Fleming, de erradicar as doenças contagiosas, nunca pareceu tão longe de se realizar. Ao menos os infectologistas e os roteiristas de filmes de terror terão emprego por um bom tempo. As forças da natureza parecem dispostas a ajudar.”
A febre amarela é transmitida por um vírus, sendo letal entre 50% a 60% dos casos. Causa febre, cefaléia, icterícia, lesões graves do fígado e rins, hemorragia e choque.
A febre amarela silvestre estava erradicada desde o início do século, mas ressurgiu nos últimos anos através do mosquito Aedes aegypti, e hoje infecta milhares de pessoas na América do Sul. Esse mosquito, inicialmente transmissor da febre amarela urbana, era considerado erradicado no Brasil desde 1942. Mas no início de 1998 o país já estava infestado deste inseto de norte a sul, que, inclusive, estava se tornando resistente aos inseticidas usados para destruí-lo.
A partir de 1986 começaram a ocorrer grandes surtos de febre amarela na Nigéria, com dezenas de milhares de casos. Em 1990 surtos epidêmicos da doença se espalharam pelo Gabão, Gana, Quênia, Serra Leoa e Libéria. Atualmente (1997) 33 países africanos reportam cerca de 200 mil novos casos de febre amarela a cada ano. A doença é hoje encontrada também no Peru, Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador e Panamá.
A malária é causada pelo parasita “Plasmodium”, um protozoário que pode ser de quatro tipos diferentes e é transmitido pela picada de qualquer uma das 60 espécies de mosquito do gênero Anopheles.O parasita se aloja nas células do fígado e nos glóbulos vermelhos do sangue, onde se reproduz. A doença causa febre intermitente, anemia, crescimento do baço e calafrios, podendo levar à morte.
A incidência mundial de malária em 1975 era duas vezes e meia maior do que em 1961, quando se achava em pleno andamento uma campanha financiada pelos Estados Unidos para a erradicação da doença no planeta. Durante esse período o número de casos na Índia passou de um milhão para seis milhões, e na China de um milhão para nove milhões.
A malária é considerada atualmente como uma das principais doenças infecciosas do mundo, estimando-se em um bilhão e 800 milhões o número de pessoas expostas à ela, na zona intertropical do globo. Na década de 70 as notificações anuais da doença em todo o mundo não passavam de 60 mil; na década de 90 estavam em torno de 600 a 700 mil casos.
Em agosto de 1997, numa conferência sobre a malária realizada na Índia, os especialistas informaram que o número de casos da doença havia quadruplicado nos últimos cinco anos, estimando-se em 500 milhões o número de portadores da doença e em 3 milhões o total de mortes anuais. As drogas disponíveis estavam se mostrando ineficazes. Em abril daquele ano, cientistas do Instituto Pasteur (França), do Instituto Nacional de Saúde (EUA) e do Conselho Britânico de Pesquisas Médicas, já haviam feito um alerta contundente sobre a expansão da doença. Num artigo publicado na revista Nature, eles afirmaram que “a malária ameaçava a África e poderia se espalhar de forma incontrolável pelo mundo.”
A malária é uma doença essencialmente tropical. No Brasil, em agosto de 1994 cerca de 800 índios estavam contaminados, de um total de 1.200 de algumas tribos do Vale da Javari, no Amazonas. Naquele ano foram computados em todo o país 562 mil casos de infecção com dois mil óbitos. (1) Um número que chama ainda mais a atenção se levarmos em conta que em 1983 houve 297 mil casos, e que em 1960 a doença era praticamente inexistente. Em junho de 1997 começaram a surgir casos de malária no estado do Rio de Janeiro, depois de 29 anos da última ocorrência registrada. Nos primeiros dois meses de 1998 verificava-se o maior surto de malária entre os agrupamentos de índios Ianomâmi, com mais de 400 casos. O pesquisador Carlos Marcondes estima que atualmente (1998) o número de casos anuais no país gire em torno de um milhão.
Apesar de tropical, a malária tem aparecido ultimamente também em países europeus, inquietando os patologistas daquele continente, em especial na Inglaterra. A doença já irrompeu também na Bélgica, França e Holanda; até a Suíça já registrou uma morte por malária.
Entre 1988 e 1990 surgiu uma variedade nova e letal da doença : a malária cerebral. A Dra. Laurie Garret narra esse acontecimento: “Atingiu adultos no leste e centro da África. Os indivíduos com algum grau de imunidade adquirida na infância, ao se tornarem jovens adultos, repentinamente eram tomados por febre e crises de demência produzidas pela infecção causada pelo parasita no cérebro. A rapidez da instalação da doença e da morte era impressionante.” Em 1993, a Associação Americana para o Progresso da Ciência divulgava a situação no continente: “A malária cerebral agora é considerada responsável por uma taxa de mortalidade de mais de 20% dos casos de malária, até nas áreas urbanas.”
O fato mais preocupante, porém, é que o parasita mais perigoso dos quatro tipos que causam a doença, o Plasmodium falciparum vem apresentando uma grande resistência à medicação tradicional, a tal ponto que foi considerado por um grupo de clínicos como “um dos dez microrganismos que mais tem resistido aos medicamentos disponíveis.” Recentemente pesquisadores britânicos e americanos descobriram que essa espécie do protozoário possui genes que lhe permitem modificar a superfície das células infectadas, impedindo a sua destruição pelo organismo. Logo após, pesquisadores da Universidade de Oxford descobriram que diferentes cepas do parasita trabalhavam juntas para enfrentar o sistema imunológico da pessoa infectada, num processo chamado de antagonismo cruzado. Segundo eles, esta é a causa de a doença ser tão difícil de tratar.
Em 1994, a malária já estava também completamente fora de controle na Ásia, e na África as notícias não eram melhores. Em agosto de 1995, o teste com uma vacina experimental em Gâmbia, que era a grande esperança da OMS, apresentou um índice de proteção de apenas 3%. Em dezembro de 1997, o Quênia foi atingido por uma variedade da doença que matou 143 pessoas em três meses; a violência do surto e dos sintomas foi tão intensa que no início imaginou-se tratar de uma nova epidemia do vírus Ébola. Em fevereiro de 1998 registrou-se 35 mil novos casos de malária no Quênia, enquanto que um outro tipo de malária, resistente a medicamentos, matava 1.500 pessoas em 15 dias; no início de abril, pelo menos 300 pessoas morreram no espaço de duas semanas em três distritos do país usualmente não endêmicos para a doença…
Atualmente há uma preocupação de que o efeito estufa, provocando um aquecimento planetário contínuo, leve a doença para regiões em que ela ainda é completamente desconhecida, onde as populações não possuam imunização natural. O descongelamento dos picos montanhosos em todo o mundo (mencionado no tópico Clima) significa também a destruição de uma barreira natural à passagem de microorganismos, o que favorece o surgimento de epidemias. Em 1988 houve uma epidemia de malária numa região de Madagascar que até então nunca havia sido atingida pela doença. Foram registrados 100 mil casos com 20 mil mortes, um índice muito superior à média normal de letalidade da doença.
O câncer é uma doença que se caracteriza por uma proliferação anormal das células, não controlada pelo organismo, que acaba por difundir-se para outras regiões do corpo (metástase). Existem cerca de 200 tipos de câncer.
Mais de 4 milhões de pessoas são atingidas em todo o mundo anualmente pelo câncer. Uma matéria publicada na revista Veja de abril de 1996 dizia haver uma diferença fundamental entre o câncer e a AIDS, as duas moléstias que mais horror e pânico difundem à humanidade: “A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida é um mal que se pode prevenir totalmente. O câncer, não. Descontados alguns fatores de risco, ter ou não ter a doença é uma loteria (…).”
Esta suposição, no entanto, é falsa. Nada do que atinge o ser humano é obra do acaso. Tudo, mas tudo o que alcança uma pessoa teve origem nela mesma. Foi ela própria quem colocou a semente para isso, seja na atual vida terrena ou em outras passadas.
Isso naturalmente não significa que uma pessoa atingida por uma doença tão grave como o câncer ou também outras seja uma alma perdida. Não. Uma doença como essa é um retorno cármico, que dependendo de como a pessoa encara pode se constituir numa remição de uma culpa anterior. Para outros, porém, pode significar realmente um agravamento do estado anímico nesta vida. Em ambos os casos, porém, não deixa de ser um retorno de um modo errado de vida praticado. O principal é que a pessoa mude a sua sintonização anterior, para o que a doença se constitui por vezes num auxílio indispensável, uma grave exortação a que a pessoa atingida é forçada a dar atenção.
Em maio de 1997, a OMS divulgou um relatório onde previa que o câncer se tornaria uma epidemia mundial, depois que se verificara que 6,3 milhões de pessoas haviam morrido em todo o mundo em 1996, vítimas da doença.
O número de casos de câncer e as mortes a ele relacionadas têm aumentado continuamente em todo o mundo nos últimos anos. Uma boa amostragem disso pode ser obtida analisando-se a situação dos Estados Unidos, país que detém dados estatísticos confiáveis a respeito: A população americana cresceu 38% de 1960 a 1990. Em 1960 o número de mortes por câncer foi de 267.582, e em 1990 morreram 505.322 pessoas da doença, um aumento de 88,8% em relação a 1960. Atualmente, estima-se que surjam por ano mais de um milhão e 200 mil novos casos de câncer nos Estados Unidos.
O gráfico abaixo (elaborado segundo dados da Enciclopédia Nosso Século) mostra a variação nas últimas décadas do número de mortes por câncer para cada grupo de 100 mil pessoas na Alemanha, Estados Unidos, França, Grã-Bretanha e Japão. Observa-se um crescimento contínuo em termos reais:
No Brasil, O Instituto Nacional do Câncer previa para o ano de 1998 o surgimento de mais de 269 mil casos, que seriam responsáveis por cerca de 108 mil óbitos. O número de casos tem aumentado numa média de 3% ao ano. Só o câncer de mama mata 10 mil mulheres por ano no país e atinge uma brasileira a cada 24 minutos. A taxa de mortalidade para o tumor da próstata subiu 54% entre 1970 e 1992 no Estado de São Paulo. O crescimento do número de mortes ocasionadas por esse tipo de câncer no país pode ser avaliado pelo gráfico abaixo:
A comunidade médica está hoje também apreensiva com um tipo de câncer feminino causado por um vírus, chamado HPV, conhecido há mais de um século mas cuja ação se tornou mais virulenta nos últimos anos. Esse vírus vem sendo apontado como deflagrador de uma corrente de reações que levam em alguns casos ao câncer no colo do útero, o tipo de câncer que mais vítimas faz entre as mulheres.
A matéria da revista Veja de agosto de 1994 que aborda o assunto diz textualmente:
“O que preocupa os médicos é a extraordinária velocidade com que o vírus vem se espalhando. Atribui-se a ele o fato de que a faixa etária de risco para o câncer de colo de útero tenha diminuído em dez anos. Tradicionalmente ele atacava apenas mulheres acima de 35 anos – hoje, atinge também as mais jovens. No Brasil, calcula-se que 30% das mulheres adultas sejam portadoras do vírus, porcentagem idêntica à verificada nos Estados Unidos. Além disso, tem-se constatado a presença do HPV em 99% das mulheres com câncer no colo uterino.”
No Brasil, segundo dados do Departamento de Dermatologia do Hospital das Clínicas, de julho de 1995, a infecção pelo HPV tornou-se a primeira causa de atendimento de doenças sexualmente transmissíveis, respondendo por 60% do total.
Um estudo publicado na Revista Nature Medicine, de maio de 1995, informa que algumas mulheres são mais suscetíveis que outras ao câncer do útero porque seus organismos não identificam uma forma mutante do vírus HPV, que causa a doença. Em julho de 1995, uma reportagem jornalística dava conta que 50% da população mundial era portadora do vírus… Em abril de 1997, o Dr. Charles Rabkin, do Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos, apresentou evidências de que o HPV também poderia levar ao câncer de próstata no homem.
Segundo a OMS, 200 milhões de pessoas em 76 países sofrem de esquistossomose. Cerca de 200 mil pessoas morrem da doença todos os anos.
A esquistossomose é uma das doenças mais antigas de que se tem notícia, tendo sido constatada até em múmias do Egito. Pode ser provocada por quatro tipos de vermes, sendo o mais comum denominado Schistosoma mansoni. Provoca febre, cefaléia, sudorese, tosse, diarréia, cirrose, aumento do baço e do fígado, dificuldade de digestão, náuseas e, nos casos mais graves, hipertensão pulmonar, insuficiência hepática, tumores e morte.
Em novembro de 1994, alguns biólogos do Reino Unido afirmaram dispor de evidências que o Schistosoma mansoni podia adquirir resistência à principal droga utilizada no tratamento da doença, o “praziquantel”. Apesar de a OMS contestar a afirmação, uma epidemia de esquistossomose no Senegal mostrou-se difícil de tratar. Os cientistas supuseram que a droga estava tendo menos efeito no país, pois até então o praziquantel costumava funcionar após uma única dose contra todas as espécies de esquistossomose.
Através de testes em laboratório, os biólogos chegaram à conclusão que a linhagem do Schistosoma mansoni encontrado no Senegal era menos sensível ao praziquantel que as linhagens de Porto Rico e do Quênia. Um outro cientista opinou que a resistência à droga teria se originado no Egito, onde é largamente utilizada. O fato é que, já em 1992, dos 350 habitantes do Senegal tratados com o praziquantel, só 20% ficaram livres dos ovos do parasita. A epidemia no Senegal começou no final da década de 80 e atualmente atinge até 90% da população em algumas localidades.
O sarampo, uma das doenças mais contagiosas que se conhece, atinge 40 milhões de pessoas no mundo atualmente.
No Brasil, o sarampo era considerado sob controle desde 1986, mas em 1997 o país foi atingido por uma epidemia. Em setembro daquele ano havia oficialmente 4.169 pessoas contaminadas, quase o triplo dos casos registrados em todo o continente americano em 1996; um mês depois, a agência Folha informava que o número de casos era de 9.781. Considerada uma doença essencialmente pediátrica, a epidemia brasileira surpreendeu, pois a maior parte das pessoas atingidas eram adultos na faixa de 20 a 29 anos.
Pouco tempo depois a epidemia chegava a outros países da América do Sul. Em relação ao Chile, o consultor da Organização Pan-americana da Saúde, Dr. Bernardus Ganter, comentou: “É surpreendente saber que o vírus de São Paulo chegou ao Chile, um país que realizou duas grandes campanhas de vacinação em massa nos últimos anos.”