O Amor é inseparável da Justiça. Um não existe sem o outro, ou melhor, um não atua sem o outro. São na realidade uma só coisa.
Por isso também é falsa a crença num Amor divino dissociado da Justiça incorruptível. É uma ilusão desmedida imaginar, por exemplo, que o Criador tudo tolera dos seres humanos, porque Sua misericórdia é infinita…
O perdão de Deus reside unicamente nos efeitos automáticos das Leis que regem a Criação, instituídas por sua Vontade sagrada. Se uma criatura comete um pecado, isto é, se age contra as determinações do Criador, seja através de pensamentos, palavras ou atos, ela insere na Criação algo ruim, que de acordo com a Lei da Reciprocidade terá de retornar para ela mesma. Tempo e espaço aí não representam nenhum papel. Poderá ter agido mal numa vida anterior e mesmo num outro país. Aquilo que fez de errado em algum ponto de sua existência retorna a ela infalivelmente. Se, então, reconhece como justo o golpe que a atinge nesse retorno e procura agir de modo diferente, ela estará perdoada aos olhos do Criador, pois remiu o erro de outrora. Isto é Justiça e Amor! Pois recebe exatamente aquilo que desejou para os outros e, ao reconhecer e corrigir seu erro, encontra-se novamente livre, limpa, liberta do pecado, podendo então prosseguir em seu caminho de desenvolvimento espiritual.
O perdão divino não tem nenhuma semelhança com o perdão humano. Uma criatura perdoada através das Leis naturais da Criação encontra-se novamente tão pura e limpa quanto uma outra que nunca tenha errado. Não existe mais nenhuma diferença entre elas. Não é sequer possível distinguir qual delas errou.
Imagine-se por exemplo dois irmãos gêmeos, absolutamente idênticos, vestidos também de maneira igual. Um deles sempre cuidou de sua vestimenta, mantendo-a limpa, impecável, evitando principalmente passar por lugares onde pudesse se sujar. O outro, ao contrário, negligenciou isso. Não deu importância à sujeira que ia se acumulando em suas vestes e tampouco evitou passar por caminhos pouco limpos. Dessa forma sua vestimenta tornou-se imunda, não tendo mais nenhuma semelhança com a do seu irmão. Um dia, então, ele se deu conta de toda aquela sujeira e tomou a firme resolução de limpá-la a todo custo. Depois de muito trabalho, proporcional ao tempo de sua própria indolência e negligência, ele conseguiu limpar totalmente a sua roupa, de forma que ela ficou novamente igual a do seu irmão gêmeo, que jamais havia-se sujado. Pois bem, se esses dois irmãos se colocarem agora à nossa frente, ninguém poderá dizer qual deles havia deixado sujar a sua roupa. E mais: isso agora não tem mais a menor importância! Com o trabalho que teve para limpar sua roupa, o segundo irmão expiou o erro cometido e encontra-se tão limpo e puro como o primeiro irmão!
Assim também atua a Justiça divina, que perdoa realmente uma criatura que pecou, se esta reconhece o erro e se esforça diligentemente em repará-lo. Depois de perdoada, é impossível afirmar que tal criatura tenha pecado, pois seu erro foi de tal forma extinto na Criação que nenhuma marca permaneceu nela. Isto é realmente perdoar!
Bem ao contrário do que ocorre com o ser humano em relação ao seu próximo. Frequentemente, com ares de magnanimidade, ele faz saber que o perdoa por uma pequena falta cometida, mas jamais deixará de exclamar: “Aquele é fulano, que me fez isso e aquilo outro; eu, porém, já o perdoei!…” Hipocrisia. Somente hipocrisia reside no falso perdão humano.
Na sua indolência e vacuidade, o ser humano aceita como verdadeiras coisas que não existem. Assim é também com relação à sua tola esperança num perdão divino adaptado à sua inércia espiritual. Ninguém consegue obter o perdão de seus pecados através do número de orações, de penitências, de jejuns ou de contribuições monetárias. Sem esforço próprio, esforço interior em melhorar, não se avança um milímetro sequer no desenvolvimento espiritual e, consequentemente, não se pode remir culpa alguma.
De nada adianta se o ser humano “pensa” que as coisas sejam diferentes, só porque sua religião assim ensinou. Sua ignorância a tal respeito é apenas uma culpa a mais, pois, conforme já dito anteriormente, ele nunca ficou sem auxílio para poder compreender corretamente as Leis das Criação.
A crença num Amor divino que tudo perdoa arbitrariamente, sem levar em conta a Justiça, contribuiu ainda mais para a queda do ser humano. Ele pôde assim entregar-se a toda sorte de vícios e paixões, pôde maltratar o seu próximo tanto quanto quis, pôde, enfim, fazer tudo quanto julgasse necessário para satisfazer suas cobiças e ambições terrenas, pois no final bastava um leve aceno em direção ao alto para torná-lo novamente um beato exemplar.
Não só nenhum de seus erros lhe foi perdoado dessa maneira, como também sobrecarregou-se com mais uma culpa enorme, ao acreditar nessa concepção pueril de benevolência arbitrária e injusta do Criador. Uma blasfêmia da mais baixa espécie. Julgar que o Criador possa deixar Sua Vontade tornar-se mercadoria barata de barganha…
Os poucos que vez ou outra se perguntam se isso estaria certo, afastam logo de si tais pensamentos exortadores, seja por temor de tocar em algo “sagrado”, seja por atribuir esse tipo de questionamento a uma incumbência específica dos teólogos de sua religião. Se existe gente incumbida de estudar essas coisas e fornecer as devidas respostas, por que se incomodar? E se também tantas pessoas aceitam uma tal concepção, por que questioná-la?… Mas se tal concepção for uma coluna mestra de sua crença, se for um “dogma”, então, como já dito, seria pecado até mesmo pensar que isso poderia não estar certo!
O raciocínio do ser humano hodierno encontra rapidamente todo tipo de argumentação para sufocar a já fraca e quase inexistente intuição do seu espírito, que ainda se manifesta às vezes, aqui e acolá, através de dúvidas exortadoras. O espírito vivo reconhece rapidamente o falso, e através da intuição procura fazer valer sua vontade. Todavia, como ele, o espírito, está muito enfraquecido pelo domínio do intelecto, numa situação insana que vem já de milênios, suas exortações não são páreo para as rebatidas do raciocínio, como vimos acima.
Assim o ser humano afunda mais e mais espiritualmente. E quanto mais afunda, mais erros comete e menos capaz se torna de reconhecer sua própria queda e seus erros, bem como os últimos auxílios que ainda chegam para ele na Criação. Essa situação prossegue até o ponto em que fica absolutamente excluído de qualquer auxílio espiritual. Terá se tornado então um inimigo consumado de Deus, sem possibilidade de voltar atrás, mesmo que julgue ser uma pessoa boa e um fiel legítimo, cumpridor dos deveres estabelecidos por sua religião.
A perplexidade ante os acontecimentos de nossa época faz surgir em algumas pessoas perguntas do tipo: Como Deus permite que aconteça tanta injustiça, tanta miséria, tanto sofrimento? Por que Ele não liberta a humanidade desses flagelos? Por que não torna todos os seres humanos felizes, sadios e sem pecados?
Perguntas desse tipo só podem surgir de uma concepção errada sobre a atuação da Justiça e do Amor divinos. Em primeiro lugar, qualquer sofrimento que atinge um indivíduo, uma coletividade ou um povo inteiro, é sempre fruto de uma atuação anterior contrária às Leis da Criação. Dor, angústia, tristeza, miséria, desesperança são produtos dos próprios seres humanos. Nunca o Criador teria colocado tais coisas em Sua obra maravilhosa. Muito pelo contrário. Apenas alegria e felicidade estavam previstos para os seres humanos em seus caminhos de desenvolvimento através dos planos da Criação. Essas coisas más nunca existiram na Criação até o grande falhar.
Eles, os orgulhosos e auto-suficientes seres humanos, desprezando advertências e exortações, quiseram seguir outros caminhos que não os prescritos pela Vontade de Deus; caminhos que eles mesmos criaram para si. Semearam desgraça, e por isso agora colhem desgraça. Tinham a liberdade de decisão, o livre-arbítrio, porque essa é uma característica própria do espírito. Não precisavam ter enveredado pelo caminho da perdição. Imensos foram os esforços despendidos pela Luz para que refletissem e voltassem ainda a tempo dessa marcha coletiva rumo ao abismo. Mas foi tudo em vão. Foram sempre apenas poucos, pouquíssimos, que aceitaram as advertências e os auxílios, procurando viver daí em diante conforme a Vontade de Deus. A maior parte continuou passeando despreocupadamente pela falsa estrada larga, pavimentada e sinalizada pelos dirigentes religiosos, cujo destino final é a destruição de todos que enveredam por ela, como elementos nocivos e perturbadores na Criação.
A separação entre os vivos e os mortos já está efetivada em nossa época. Agora, no período de consumação do Juízo Final, a humanidade já está separada em dois grupos: o dos espiritualmente mortos e o dos ainda espiritualmente vivos, pois outros não há. De um lado os condenados no Juízo, que constituem a imensa maioria; do outro, o grupo dos que poderão ser salvos. Estes últimos encontrarão a salvação se, ainda em tempo, abandonarem todo o falso e procurarem viver sinceramente, seriamente, de acordo com as Leis da Criação, instituídas pela Vontade de Deus. Para eles os golpes do destino são bênçãos, quando os forçam a movimentar-se espiritualmente e possibilitam sua salvação. É a Justiça em atuação conjunta com o Amor.
Após o Juízo todas as trevas terão sido destruídas e o mal estará definitivamente erradicado da Terra. Neste acontecimento também se reconhece a Justiça atuando em uníssono com o Amor divino, que obriga a limpeza na Criação, para alegria e paz dos que se esforçam em viver em conformidade com a Vontade de seu Criador.